2.21.2011

OVINOS : ORIGEM, HISTÓRIA E MITOLOGIA

Texto de Leopoldo Costa


OS OVINOS EM GERAL

Os Ovinos são classificados em dois subgêneros (Ovis e Pachyceros).
O subgênero Ovis é o mais importante e compreende cinco espécies:

* O. vignei (Urial)
* O. ammon (Argali)
* O. orientalis (Muflão asiático)
* O. musimon (Muflão europeu)
* O. aries (Carneiro comum)

No subgênero Pachyceros temos três espécies:

* O. canadensis (Carneiro do chifre longo)
* O. dalli (Carneiro do Alasca)
* O. nivicola (Carneiro das neves)

O ovino comum é descendente do muflão (‘mouflon’ ) que foi domesticado entre 12.000 e 13.000 a.C. na região oriental do mar Mediterrâneo (Sardenha e Córsega). Os Ovinos foram os primeiros animais a serem domesticados pelo homem.

Existem dois tipos de ‘mouflon’ (Ovis musimon), o europeu que no período Pleistoceno vivia em toda a Europa e nos tempos históricos restringiu-se apenas ao Chipre, Córsega e Sardenha, e o asiático (Ovis orientalis), que vive nas montanhas da Ásia Menor.

Foi encontrada, num sítio arqueológico no Irã datado de 8.000 a.C., uma estatueta de um carneiro com lã, o que sugere que a seleção de ovinos para a produção de lã já era aplicado naquela época.

Registros de animais bem semelhantes ao carneiro que conhecemos hoje, foram encontrados em obras de arte e escritos da Mesopotâmia datados de 3.000 a.C.

São conhecidas mais de 800 raças de ovinos, sendo cerca de 200 raças domesticadas. A constante seleção de animais próprios para a produção de carne e para a produção de lã, produziram essa diversidade de raças.

HISTÓRIA


Na Suméria, as famílias mais abastados consumiam carne de carneiro, servida sempre cozida. O carneiro era tão importante para eles que na língua dos sumérios, existem cerca de 200 palavras que designam os diversos tipos de carneiro e as carnes destes animais.

Em chinês a palavra para designar caprinos e ovinos é a mesma e o povo costuma não saber diferenciar bem as duas espécies. O ‘bharal’ (Pseudois schaeferi e P. nayar), que os chineses chamam de ‘shi-yang’, o que significa ‘carneiro pedra’ é um animal encontrado no Himalaia e na Mongólia, intermediário entre ovino e caprino. É descrito como um animal lanoso azul, sendo cinza azulado na camada inferior. Vive em altitudes acima de 4500 metros e é a presa favorita do leopardo-da-neve.

Na China existe a crendice que possuir animais lanígeros pode trazer prosperidade.

Os ovinos selvagens viviam nos planaltos, eram gregários, formando manadas com até 100 indivíduos. Em algumas espécies os machos viviam separados das fêmeas e dos filhotes na maior parte do ano, só se juntando na época do acasalamento.

No Canadá, foi observado que a fêmea jovem permanecia na companhia da mãe e os machos quando atingiam a idade entre dois e quatro anos abandonavam o grupo para se juntar a manada dos machos adultos. Neste grupo era obedecida uma rígida hierarquia, baseada na idade e no tamanho dos chifres, o macho de maior chifre era o líder da manada.

A estação de monta ocorre durante o outono e começo do inverno e a parição na primavera. A gestação dura entre 150 e 180 dias e pode nascer até 4 filhotes. O cabrito recém- nascido pesa entre 3 a 5 kg e já com poucas semanas formavam o seu grupo e só procuravam as mães para ser amamentados, sendo depois de 4 ou 6 meses desmamados.

As fêmeas estão prontas para o acasalamento após um ano de idade e os machos aptos para procriar após os sete anos de idade, podendo ocorrer antes, se porventura morrer o macho alfa do grupo. Vivem de 10 a 20 anos, sendo que as fêmeas podem atingir a idade de 25 anos.

Durante a época do acasalamento ocorre embates entre os machos que não obedeciam a domínio territorial e qualquer fêmea no cio era disputada. Estes machos quando se aproximavam, eram enfrentados à marradas.

No norte da Europa e em alguns países islâmicos a cabeça de carneiro assada é uma iguaria fina, servida nas festividades mais solenes.

NAS RELIGIÕES E MITOLOGIA


Em algumas seitas antigas o carneiro representava a imortalidade ( também a serpente representava), pois seus chifres caem e renascem todos os anos. Também simbolizava o poder da obstinação e da fertilidade.

No Tibet a figura de um carneiro é colocada nas ponteiras das vigas das residências e nas manivelas das rústicas batedeiras de manteiga como uma proteção contra os espíritos maliciosos. Também na cerimônia de purificação um carneiro é sacrificado. Em Lhasa, a capital, durante as cerimônias de passagem do ano novo, um carneiro é solto depois de ouvir uma lista de pecados da sociedade. Também é usado para incorporar demônios que são expulsos pelo sacerdote das pessoas possuídas. Uma versão do ‘bode expiatório’ dos judeus.

Também no Tibet, para pagar uma promessa, um carneiro é conduzido pelo penitente para caminhar em torno dos muros do mosteiro. Depois ele deve ser solto e não pode ser incomodado.

Na Astrologia, o signo de Áries (carneiro) é o primeiro do zodíaco, sendo no hemisfério norte a primeira constelação que aparece no horizonte na primavera equinocial.

O carneiro é o primeiro animal doméstico citado na Bíblia e em todos os livros bíblicos existem 483 referências a ovinos. Abel, filho de Adão era pastor.

No livro de Gênesis, está relatado que Jacó por exigência de Labão, pai de Raquel, trabalhou como pastor de ovelhas durante sete anos sem salário para ter o direito de casar com ela. Depois de cumprido o prazo, Labão quebrou a promessa e exigiu o trabalho de mais sete anos o que Jacó aceitou, mas exigindo em troca de ficar com todos os animais que nascessem manchados, malhados que naquele tempo não tinham valor de mercado. Cumpriu o acordo, casou com Raquel e com os animais que acumulou tornou um criador respeitável.

Procurou melhorar o rebanho para produzir lã de cores variadas e teve sucesso. Os descendentes de Jacó por seleção e cruzamentos controlados desenvolveram uma variedade de ovinos que produzia lã de cor branca, animais estes que foram mais tarde mencionados pelos reis Davi e Salomão.

Também no livro de Gênesis , um carneiro que estava com os chifres presos no espinheiro serviu para substituir Isaac, no que poderia ter sido o primeiro e único registro de um sacrifício humano para Jeová, quando Abrão foi compelido a fazer a oferenda de seu filho.

Na inauguração do templo de Salomão, houve várias festividades que duraram muitos dias. Entre as várias cerimônias ocorreu o sacrifício de 120.000 ovinos.

Nos tempos bíblicos, os israelitas roubaram dos madianitas cerca de 700.000 ovinos e as tribos de Gad e de Rubens aprisionaram durante uma guerra contra os hagaritas mais de 200.000 bovinos.

Nos Evangelhos, Jesus é chamado de Cordeiro de Deus, invocando o episódio do sacrifício de Abrão.
Na parábola da ovelha desgarrada é relatado que o pastor deixa 99 ovelhas esperando para que possa procurar apenas uma que desgarrou e rejubila-se quando a encontra.

O cordeiro é o símbolo da inocência e da pureza.

Na história de São Jorge, santo protetor da Inglaterra e também de Portugal, é mencionado o fato que em Silena, na atual Líbia, havia um dragão que soltando fogo pelas ventas ameaçava a população da cidade. Para aplacá-lo o governante da cidade tinha que alimentá-lo com dois carneiros gordos todo dia. Mais tarde o dragão não ficava satisfeito comendo apenas os carneiros e passou a exigir seres humanos que ele escolhia entre os habitantes da cidade. Um dia, a princesa, filha do rei foi escolhida para servir-lhe de alimento. Quando ela estava sendo levada para o dragão apareceu Jorge, montado no seu cavalo de armadura e lança na mão. Ele faz o sinal da cruz e com a lança atacou e matou o dragão. Agradecido o rei ofereceu a Jorge como recompensa metade de seu reino, que ele não aceitou. Montado no seu cavalo ele partiu apenas pedindo ao rei que cuidasse das pessoas necessitadas e que construisse mais igrejas. Segundo a lenda, por milagre, a cena de São Jorge matando o dragão ficou retratada na face da lua cheia.

Na tumba real de Ur, datado de 2.600 a.C, foi encontrado por Sir Charles Leonard Wooley (1880-1960) nos primeiros anos da década de 1920, as representações de dois carneiros (ou bodes) de ouro e lápis lazuli, pastando as flores e ramos de um arbusto.

No Egito, Amon-ra, também escrito Amun, Ammon e Amen (que é a origem da palavra que encerra as preces do Judaísmo, Cristianismo e Islamismo) era representado por uma cabeça de carneiro ou alguma coisa semelhante a um disco solar com chifres de carneiro. O culto é originário da Núbia, onde os comerciantes indianos iam buscar ouro.

Os Romanos importaram a crença e adaptaram uma representação de Júpiter, que denominaram Júpiter-Ammon, cujo símbolo era um carneiro.

Os carneiros de chifres espiralados eram considerados como a encarnação do deus. Como animais sagrados a sua carne jamais poderia ser consumida. Também não poderia usar a sua lã e assim os animais não podiam ser tosquiados.

Na mitologia grega o deus Apolo era representado algumas vezes, carregando um cordeiro sobre os ombros, coincidentemente com a figura de Cristo no Catolicismo representando o Bom Pastor.

O deus do fogo védico, chamado Agni, era representado montando Mesha, o seu carneiro.

Na Índia existe um mantra que descreve Manipura, cujo símbolo é o fogo e um carneiro.
Kubera ou Kuvera, a divindade hindu da prosperidade é muitas vezes representada como um carneiro. Naropa, ancestral de muitas famílias, dentre as quais a de Karma Kagyu, é representada frequentemente segurando ou soprando uma trombeta com o formato de chifre espiralado de carneiro.

Os chifres do carneiro é frequentemente associado com o poder divino, por isso, a cabeça de Astarte (também escrito Ishtar ou Ashtaroth), grande deusa da Mesopotâmia, é adornada com eles. Entendem alguns, que na cabeça da divindade os chifres representaria o poder masculino, denotando a androginia da deusa.

Consumia-se muita carne de ovinos entre os judeus. O patriarca Moisés exortava o povo para sacrificar um cordeiro na Páscoa. Todo judeu deveria visitar Jerusalém durante o período da Páscoa e comer a carne assada de um cordeiro, acompanhada de quatro taças de vinho. Relatam os cronistas que Jerusalém tornava-se naquela época, um local com forte cheiro de carne assada e com muitos peregrinos  dançando e festejando inebriados sob o efeito do álcool.

Grande parte dos visitantes assava os seus cordeiros na própria rua. Dos cordeiros abatidos não podia ser consumido o sebo e o tendão da coxa. Não existe uma explicação convincente sobre a proibição.
O próprio Jesus, era cognominado o ‘cordeiro de Deus’ e é relatado na Bíblia, que nas vésperas de sua morte, participou com os apóstolos do ritual da Páscoa judaica como qualquer judeu.

Entre os judeus, o ‘shofar’ feito de chifre de carneiro , era uma trombeta de guerra tocada para anunciar principalmente a presença da Arca da Aliança. Era também tocado para anunciar o Ano Jubileu, período de celebrações especiais comemorado de 49 em 49 anos, durante o qual alguns contratos e débitos eram prescritos. Hoje é tocada nas sinagogas, na introdução do tempo de preparação espiritual antes do Ano Novo (Rosh Hashana).

Para os muçulmanos o carneiro tem muito simbolismo: foi em ossos da omoplata de carneiro que Maomé escreveu as suras do Alcorão.


Como curiosidade listamos alguns termos usados em Portugal relativos aos ovinos:

Marouco              Carneiro semental (bom reprodutor)
Malato  ou Borro Carneiro de doze meses.
Malata ou Jaca      Ovelha de doze meses.
Borrego                Ovino de até um ano de idade.
Borrego Veraniço  Ovino nascido em junho e julho.
Anho Ovino em amamentação.
Guia ou Cabresto    Ovino castrado que ajuda conduzir o rebanho.
Badana                    Ovelha refugada por ser velha ou doente.
Machorra                Ovelha infecunda.
Redolha                  Ovelha que pariu tardiamente.
Serodia                   Ovelha que pariu depois de novembro.
Temporã                 Ovelha que pariu antes de novembro.

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