Pressão de consumidores faz indústria substituir corantes
Nos EUA, fabricantes de bebidas e alimentos já trocaram aditivos artificiais. Substâncias já foram ligadas a riscos à saúde, como hiperatividade e câncer,mas faltam estudos conclusivos.
A pressão das mídias sociais e de grupos de defesa do consumidor nos EUA tem forçado a indústria de alimentos a trocar alguns corantes artificiais, associados a alergias, hiperatividade e câncer, por outros naturais à base de plantas e especiarias.
A estratégia tem sido mais eficaz e rápida do que o envio de questionamentos às agências reguladoras de alimentos, segundo analistas.
Não há estudos que comprovem riscos à saúde atribuídos a corantes artificiais, mas países,especialmente na Europa, têm trocado os aditivos por corantes naturais.
Nos EUA, um caso recente de pressão bem-sucedida foi o da blogueira Vani Hari, que em 2011 publicava textos sobre os perigos de corantes e conservantes usados pela rede de fast food Chick-fil-A.
Vani recolheu 200 mil assinaturas. Em dezembro, a empresa informou que vai substituir o corante amarelo (derivado do petróleo) por outro de açafrão e páprica.
Outra blogueira, Renee Shutters,de Jamestown(NY), conseguiu 142 mil assinaturas pedindo a retirada de um corante também derivado do petróleo do chocolate M&M.
A fabricante Mars diz que estuda substitui-lo por outro extraído de alga marinha. Na Europa, o mesmo doce já leva corantes naturais.
Os corantes artificiais não possuem valor nutritivo. Os problemas de saúde mais frequentemente associados a eles são as alergias, que afetam pessoas suscetíveis como o menino Willian, 7, de Belo Horizonte, que não pode beber refrigerante.
“É só beber que ele em pelota, enche de bolinhas e a gente tem que correr para o médico para tomar injeção [anti-histamínico]”, afirma a mãe, Carla Beloto, secretária.
No Brasil,atualmente a polêmica é em relação aos corantes tartrazina e caramelo 4, presentes em vários produtos, como energéticos, cerveja, sucos e refrigerantes.
Grupos de defesa do consumidor pediram à Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) a substituição do corante após uma de suas substâncias ter sido classificada como possivelmente cancerígena.
A agência, baseada em estudos toxicológicos e em pareceres internacionais, concluiu que o corante não é tóxico ou carcinogênico e não oferece perigo na quantidade em que está aprovado.
Mas o estado da Califórnia, nos EUA, determinou a redução de corante caramelo 4 em bebidas tipo cola.
“A pergunta é: se pode diminuir a quantidade sem alterar a qualidade do produto, por que a indústria não adota esse novo padrão em todo o mundo em vez de expor a população a riscos?”, questiona o químico Paulo Garcia de Almeida, membro da câmara técnica de alimentos do Conselho Regional de Química de SP.
OUTRO LADO
A indústria nega os riscos. Segundo a Abia (Associação Brasileira das Indústrias de Alimentação),não há evidência que justifique alterações no uso dos corantes tartrazina e caramelo 4.
Em 2012, análise de um instituto americano apontou que a Coca-Cola à venda no Brasil era a que tinha maior quantidade da substância potencialmente cancerígena (4-MI), do corante caramelo 4.
“A quantidade de corante caramelo 4 utilizada em nossos produtos é absolutamente segura e está de acordo comos valores definidos pelo Codex Alimentarius [órgão ligado à OMS] e pela Anvisa”, informa nota da Coca-Cola.
Para o nutrólogo Edson Credidio, pesquisador da Unicamp,nem sempre os corantes naturais são mais saudáveis. O vermelho do corante carmim, por exemplo, vem do inseto cochonilha. Casos de choque anafilático já foram relacionados ao seu uso.
“O rótulo de natural não quer dizer inofensivo, nem o artificial quer dizer perigoso. É preciso bom senso.”
Troca por corantes naturais é desafio para fabricantes
A substituição de corantes artificiais pelos naturais não é uma solução simples nem barata para as indústrias.
“Os produtos não ficam tão brilhantes ou coloridos nem tão estáveis quanto à industrializada”, diz o nutrólogo Edson Credidio, pesquisador da Unicamp.
Mas, quando produzidos corretamente,os corantes naturais têm tingimento similar ao dos sintéticos, diz ele.
Em nota, a Abia (Associação das Indústrias da Alimentação) diz que toda substituição de aditivo alimentar tem impacto direto nas propriedades dos produtos.
“O desafio da indústria da alimentação é desenvolver tecnologias e processos que aliem as exigências regulatórias e o seu compromisso com a saúde da população à expectativa do consumidor em relação ao produto (cor, odor, textura e sabor)”, diz.
Segundo a associação, é necessário um período de ajustamento técnico, tecnológico e produtivo, que varia muito de acordo com os produtos em questão.
Para o consultor norte-americano Matthew Egol, as empresas alimentícias têm se beneficiado das mídias sociais para descobrir tendências e preferências do consumidor, mas, ao mesmo tempo, são cada vez mais alvo de reclamações que se ampliam no ambiente on-line.
As novas ferramentas digitais, explica ele, ajudam as empresas a avaliar os riscos decorrentes de críticas dos consumidores, a velocidade coma qual elas se espalham e o grau de influência das pessoas que estão “gritando”.
Embora as empresas relutem em admitir uma conexão direta entre as cruzadas dos consumidores e as mudanças em seus produtos, a ligação parece clara,na avaliação de Egol e de outros analistas norte-americanos.
Casos como a da blogueira Vani Hari e de outros ativistas no campo da alimentação saudável são exemplos sempre citados.
Texto de Cláudia Collucci publicado na "Folha de S. Paulo" de 12 de janeiro de 2014. Adaptado e ilustrado para ser postado por Leopoldo Costa.

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