11.26.2017

A MARQUESA DE SANTOS



O retrato mais conhecido da marquesa de Santos é de autoria do pintor Francisco Pedro do Amaral, discípulo do francês Jean-Baptiste Debret na Academia Imperial de Belas Artes. O quadro mostra uma mulher de rosto redondo, olhos grandes e negros, sobrancelhas espessas e bem-delineadas, lábios finos e o nariz levemente pontiagudo. Os contornos da boca fechada lhe dão um ar sério e enigmático. O pescoço é longo e delgado. O corpo de curvas generosas indica peso acima do que recomendaria o padrão de beleza atual. O conjunto não chega a ser belo nem sensual, mas revela uma pessoa altiva, insinuante e determinada.

Testemunhas da época confirmam essa impressão. Felisberto Caldeira Brant Pontes, visconde e depois marquês de Barbacena, definiu-a como “mediocremente bonita”. Condy Raguet, representante dos Estados Unidos no Rio de Janeiro, anotou que ela conseguiu encantar D. Pedro “sem possuir grande beleza que a recomendasse”. Outro diplomata, o conde de Gestas, cônsul-geral da França no Brasil, afirmou que possuía “um exterior agradável para um país onde não havia beleza”. Para o aventureiro alemão Carl Seidler “a marquesa absolutamente não era bonita, e tinha uma corpulência fora do comum”.

O também alemão Carl Schlichthorst acrescentou que “não lhe falta bastante gordura, o que corresponde ao gosto geral”.1

Os poucos textos de autoria da marquesa que sobreviveram à passagem do tempo indicam que, apesar de poderosa, era semianalfabeta, como de resto quase a totalidade dos brasileiros daquele tempo. Um exemplo é a carta sem pontuação e repleta de erros de ortografia que enviou a D. Pedro em 1828, já na fase final do romance: “Sinhor. Perdoe-me que le diga isto eu não perciso de conçelhos não sou como Vossa Majestade as minhas respostas ção nascidas do meu coração.”2

O romance de D. Pedro I e a paulista Domitila de Castro Canto e Melo — nome completo da marquesa — se entrelaça e se confunde com o Grito do Ipiranga. É a grande história de amor que serve de moldura à Proclamação da Independência do Brasil. Suas marcas estão nos personagens, no calendário, na paisagem e em todos os acontecimentos decisivos da mais importante semana da história brasileira, como se pode observar na lista a seguir:

1 — Uma das testemunhas do Grito do Ipiranga, o alferes Francisco de Castro Canto e Melo, era irmão de Domitila. Tinha saído do Rio de Janeiro no reduzido grupo que acompanhava o príncipe regente a São Paulo e deixou um registro precioso dos acontecimentos nas margens do Ipiranga;

 2 — Santos, a cidade que o então príncipe regente visitou na véspera da Proclamação da Independência, emprestaria seu nome ao título nobiliárquico com o qual D. Pedro premiaria alguns anos mais tarde a amante — marquesa de Santos. Isso por si só é um mistério, pois Domitila morava em São Paulo e não consta que tivesse qualquer ligação especial com a cidade do litoral paulista;

3 — No exato local da proclamação, a colina do Ipiranga, estava situada a casa de campo do coronel reformado João de Castro Canto e Melo, pai de Domitila. O historiador Alberto Rangel assegura que D. Pedro já visitara essa casa. Teria sido seu primeiro compromisso ao chegar a São Paulo duas semanas antes;

 4 — Rumores nunca confirmados dizem que D. Pedro e Domitila se encontraram na casa do coronel Canto e Melo nos  momentos que antecederam o Grito, razão pela qual o príncipe teria ordenado que a guarda de honra se adiantasse e o aguardasse na venda próxima ao riacho do Ipiranga;

5 — Em outra versão, D. Pedro teria descido a serra do Mar no dia 5 de setembro com o propósito de encontrar-se às escondidas com a amante, longe dos olhos curiosos dos moradores da pequena cidade de São Paulo. A visita às fortalezas e à família de José Bonifácio, motivo alegado para a viagem, seria mera desculpa para o encontro amoroso;

6 — Segundo esses boatos, Domitila teria viajado a Santos no mesmo dia 5 de setembro em caravana separada, tomando o cuidado de não participar de nenhuma cerimônia ou homenagem prestada ao príncipe no litoral paulista.

Nenhum desses rumores jamais foi comprovado, mas há fortes evidências de que no dia 7 de setembro de 1822 D. Pedro tinha uma agenda paralela à dos negócios de Estado na cama da mulher que seria a maior de todas as suas muitas paixões, avassaladora a ponto de comprometer a sua imagem e o próprio desfecho do Primeiro Reinado.

Um ano mais velha que o príncipe, Domitila nasceu em São Paulo no dia 27 de dezembro de 1797. Seu pai, açoriano da ilha Terceira e coronel reformado de cavalaria, dizia-se amigo de D. João VI e era conhecido como “quebra vinténs”. À primeira vista, o apelido se deveria à grande força física do coronel, capaz de quebrar uma moeda de cobre entre os dedos. Carlos Oberacker Jr., biógrafo da imperatriz Leopoldina, afirma, porém, que na linguagem popular da época “vintém” era sinônimo de virgindade. A alcunha do coronel seria, portanto, uma referência à sua vida sexual.3

Em janeiro de 1813, ainda uma adolescente de 15 anos, Domitila se casou com o alferes mineiro Felício Pinto Coelho de Mendonça. Começava ali uma impressionante história reprodutiva, que a levaria a engravidar pelo menos 16 vezes, das quais vingaram 14 filhos de três homens diferentes. Em 1819, já mãe de três filhos com Felício, ficou grávida em um aparente caso extraconjugal. O marido acusou-a de adultério com o coronel Francisco de Assis Lorena, filho do governador que havia construído a famosa “Calçada do Lorena”, a estrada percorrida na serra do Mar por D. Pedro no dia da Independência. No Brasil daquela época, traições geralmente resultavam em crimes de honra — desde que o rival não fosse o imperador do Brasil, como se verá nos parágrafos mais adiante. Em um país profundamente católico e conservador, a vigilância sobre a moralidade das famílias era severa e às vezes cruel.

Por um costume herdado de Portugal ainda no século 16, no Brasil colônia tinha-se o hábito perverso de colocar às escondidas, durante a noite, uma guirlanda de pequenos chifres pendurada na porta dos maridos e mulheres traídos. O homem vítima da traição era chamado de “corno” ou “corno manso”, expressão usada ainda hoje entre brasileiros e portugueses. Era uma forma de expor em público, de forma traiçoeira e acobertada pela noite, o que todo mundo sabia por mexericos nas ruas e esquinas.4 No caso de Domitila, não há notícias de que o casal tenha sido alvo da famosa guirlanda de cornos, mas o desfecho foi o previsível: além de processá-la por adultério, o marido traído tentou matá-la a facadas.

Apesar de gravemente ferida, Domitila sobreviveu e se refugiou na casa do pai, onde o príncipe regente a encontrou duas semanas antes do Grito do Ipiranga.5

Segundo o historiador Alberto Rangel, Domitila foi apresentada a D. Pedro pelo irmão dela, que o acompanhava desde o Rio de Janeiro. Na véspera de entrar em São Paulo, em 24 de agosto de 1822, o príncipe teria ido visitar a família Canto e Melo, na casa vizinha à colina do Ipiranga. Domitila vivia um momento de grande angústia e tensão. Além de ter tentado matá-la, o ex-marido reivindicava a guarda dos filhos do casal. Por isso, com a ajuda do irmão, recorreu a D. Pedro para que interferisse em seu favor no processo. Depois desse primeiro encontro, cujos detalhes são desconhecidos, teria havido outro, casual, numa das ruas da cidade.

O príncipe passava a cavalo quando cruzou com Domitila sendo transportada por dois escravos numa cadeirinha de arruar. O galanteador D. Pedro apeou do cavalo e a saudou, enaltecendo sua beleza. Em seguida, dispensou os escravos e, ajudado pela guarda de honra, suspendeu ele próprio uma das alças da cadeira de arruar. Domitila não perdeu a oportunidade: “Como Vossa Alteza é forte!”, teria reagido. Ao que D. Pedro respondeu: “Nunca mais Vossa Excelência terá negrinhos como esses.” Em seguida, transportou-a nos ombros até em casa. Menos de uma semana depois, na noite chuvosa e cortada por relâmpagos de 29 de agosto de 1822, os dois dormiram juntos pela primeira vez nos aposentos de Domitila situados na rua do Ouvidor, atual José Bonifácio, no centro de São Paulo.6

D. Pedro e Domitila nunca mais seriam os mesmos. Ambos pagariam um alto preço pela paixão avassaladora que os consumiu desde então. Ela reforçaria nele a imagem de um homem promíscuo e inconsequente, capaz de traficar na cama os altos interesses do Estado em troca de favores sexuais. Ao saber do novo romance, o imperador Francisco I, pai da imperatriz Leopoldina, anotou na margem da comunicação que recebera do barão Wenzel de Mareschal, representante da corte de Viena no Rio de Janeiro: “Que homem miserável é o meu genro.”7 Domitila passaria igualmente para a posteridade de forma pejorativa, como a amante interesseira que teria seduzido o príncipe e futuro imperador em busca de cargos, dinheiro, promoções e privilégios de toda a natureza. “D. Pedro iniciou em São Paulo com D.

Domitila de Castro a aventura romanesca de maior repercussão em sua vida, o seu grande amor, a extravasar da alcova para refletir-se nas relações de família, na política, no comportamento do futuro monarca, no seu conceito dentro e fora do Brasil”, afirmou Octávio Tarquínio de Sousa.8

Na verdade, D. Pedro iniciou em São Paulo não apenas um, mas dois romances. Além de Domitila, começou a namorar também a irmã dela, Maria Benedita, oito anos mais velha do que ele e casada com o português Boaventura Delfim Pereira. Ela engravidou do imperador no começo de 1823, mas, neste caso, não houve crime de honra. Ao contrário, o marido traído fingiu não tomar conhecimento da história. Além de suportar tudo em silêncio, batizou em seu nome o filho bastardo de D. Pedro com Maria Benedita.

Rodrigo Delfim Pereira nasceu no Rio de Janeiro em 4 de novembro de 1823 e morreu em 1891, aos 68 anos, em Lisboa. Como recompensa, Boaventura foi promovido ao cargo de superintendente da Real Fazenda de Santa Cruz, depois administrador das Imperiais Quintas e Fazendas, veador (ou camarista) da imperatriz Leopoldina e, por fim, barão de Sorocaba, título que ostentou pelo resto da vida com a mulher, de quem nunca se separou.9 Comportamento bem diferente teve a própria Domitila. O romance paralelo teria sido o motivo de um misterioso atentado que Maria Benedita sofreria na noite de 23 de agosto de 1827, quando sua carruagem foi atingida por dois tiros de pistola na ladeira da Glória, no Rio de Janeiro. Um inquérito rapidamente engavetado por ordem de D. Pedro apontou a já então marquesa de Santos como suspeita de mandante da tentativa de homicídio contra a irmã.

A ascensão de Domitila na corte de D. Pedro foi meteórica. O primeiro fruto do seu novo relacionamento com o imperador veio dos tribunais. A ação movida pelo ex-marido Felício, que até as vésperas da Independência se arrastava na justiça de São Paulo, resolveu-se rapidamente com a providencial boa vontade da Igreja Católica. Por interferência do monarca, um processo canônico de anulação do casamento ficou pronto em apenas 48 horas e, sem nenhum pudor, inverteu o conteúdo das acusações. A sentença, assinada em 5 de março de 1824 pelo cônego José Caetano Ferreira de Aguiar, culpou o exmarido de adultério e maus-tratos enquanto Domitila era apontada como esposa de “boa conduta” — decisão surpreendente, uma vez que, àquela altura, o Brasil inteiro já sabia que ela era amante de D. Pedro.

Embora tenha passado de acusador a réu, o ex-marido deixou de defender-se no processo de modo a facilitar o desfecho. Em troca da boa conduta e da promessa de jamais voltar a importunar a ex-mulher, foi nomeado administrador da feitoria imperial de Periperi. A segunda parte do trato foi quebrada uma única vez, quando Felício inadvertidamente escreveu carta a um amigo na qual criticava o relacionamento de Domitila com o imperador. Para sua infelicidade, o conteúdo da correspondência chegou ao conhecimento de D. Pedro, que, enfurecido, cavalgou cerca de sessenta quilômetros para aplicar-lhe uma surra com as próprias mãos. Em seguida, obrigou o alferes a assinar um papel no qual se comprometia novamente a nunca mais incomodar Domitila. Desta vez, Felício não só cumpriu o combinado como, algum tempo depois, sujeitou-se à humilhação de pedir à ex-mulher que intercedesse junto ao imperador para que fosse promovido a sargento-mor da localidade de Pilar da Serra.10

Em 16 de janeiro de 1827, o ex-sogro Felício Moniz Pinto Coelho da Cunha (pai do alferes) também julgou-se no direito de escrever a Domitila em busca de favores. Pediu ajuda para vender aos ingleses suas lavras de minérios na província de Minas Gerais. O preço estimado era de um milhão de cruzados, mas o ex-sogro prometia pagar à marquesa uma comissão “como se fossem vendidas por dois milhões”.

Não se sabe se a venda se realizou, mas a carta comprova que Domitila era “acessível a negociatas”, na opinião de Octávio Tarquínio de Sousa.11

Alguns meses depois de iniciado o namoro, Domitila mudou-se de São Paulo para o Rio de Janeiro a convite de D. Pedro, que, numa carta, anunciava a decisão de ir buscá-la com a família: “Não há de cá morrer de fome, muito especialmente o meu amor, por quem estou pronto a fazer sacrifícios.”12 O imperador abrigou-a de início em uma casa amarela situada no relativamente modesto bairro de Mata-Porcos, atual Estácio, mas logo a transferiu para um luxuoso palacete encostado ao muro do Palácio da Quinta da Boa Vista, onde hoje funciona o Museu do Primeiro Reinado. O historiador Alberto Rangel afirma que nos aposentos do imperador existiria uma saída secreta pela qual ele escapava durante a noite para se encontrar às escondidas com a amante.13

Discreta no início, a presença da “favorita” (designação dada a Domitila pelo diplomata austríaco Wenzel de Mareschal) logo virou motivo de escândalo no Rio de Janeiro. Em setembro de 1824, ela foi barrada na entrada do Teatrinho Constitucional de São Pedro, onde se apresentavam os atores da “Companhia Apolo e suas Bombinhas”. Ao saber da notícia, D. Pedro deu ordens para que o intendente-geral de polícia, Francisco Alberto Teixeira de Aragão, nomeado já por influência de Domitila, suspendesse as representações da peça teatral, despejasse os atores do edifício e mandasse queimar seus pertences numa fogueira em frente à igreja de Santana.14

Outro incidente aconteceu na Semana Santa de 1825. Quando Domitila subiu à tribuna reservada às damas do Paço para assistir às cerimônias religiosas, as senhoras da nobreza retiraram-se em protesto.

Para reparar a ofensa, dias mais tarde D. Pedro elevou-a ao posto de dama de honra da imperatriz Leopoldina. Dessa forma, conferia à amante o direito de ocupar lugar privilegiado em todas as reuniões, passeios, viagens e outros eventos da corte. Em 12 de outubro, aniversário de D. Pedro, deu-lhe o título de viscondessa de Santos, “pelos serviços que prestara à imperatriz”, segundo o decreto. Na mesma data no ano seguinte promoveu-a, finalmente, a marquesa de Santos, título com o qual passaria para a História.

As regalias e os privilégios se estenderam à família da amante. Seus irmãos e parentes receberam empregos, títulos e benesses de D. Pedro. O pai morreu em 2 de novembro de 1826 e foi sepultado com honras de Estado no convento de Santo Antônio. O pomposo funeral, ao qual foi convidado todo o corpo diplomático e as mais altas autoridades do Império, custou 628.280 réis, preço de seis escravos ou seis cavalos de raça, pagos por D. Pedro I, que também anunciou que honraria todas as eventuais dívidas que o morto tivesse deixado na praça.

A comunidade estrangeira do Rio de Janeiro ficou impressionada com o poder da amante de D. Pedro. O diplomata americano Condy Raguet dizia, com certo exagero, que nenhum despacho imperial se obtinha sem o patrocínio de Domitila. “A paixão do imperador por essa mulher vai ao ponto de fazê-lo esquecer a moral e os bons costumes”, acrescentou Lourenço Westin, cônsul-geral da Suécia. “Ela tira partido disso para enriquecer.” Charles Stuart, negociador britânico do tratado de reconhecimento da Independência do Brasil por Portugal em 1825, afirmou que devia “à influência da senhora Domitila de Castro a remoção de um obstáculo que teria feito malograr todas as negociações”.15 Mareschal, o representante da Áustria, dizia que “quem pretende favores ou graças faz-lhe a corte; é o canal das promoções”.16

Nos sete anos de duração do romance, Domitila engravidou pelo menos cinco vezes de D. Pedro. Na primeira, algumas semanas após o Grito do Ipiranga, abortou ou deu à luz um menino prematuro. Da segunda nasceu Isabel Maria, a 24 de maio de 1824 — dois dias após o anúncio da sentença de divórcio em que a mãe era apontada como uma “esposa de boa conduta”. D. Pedro não a reconheceu imediatamente como filha, mas dois anos mais tarde, quando o poder de Domitila chegava ao auge, brindou-a com todas as honrarias possíveis. Isabel ganhou o título de duquesa de Goiás e o direito de ser chamada de “Alteza”, tratamento normalmente reservado às princesas, foi condecorada com a Ordem do Cruzeiro e de Santa Isabel e virou nome de três dos navios da nova Marinha de Guerra brasileira. Quando D. Pedro abdicou o trono, Isabel Maria estudava no Sacre Coeur de Paris, um dos colégios mais caros e exclusivos da época, cujo prédio abriga hoje o Museu Rodin. Outros dois filhos morreram precocemente.

A última filha, Maria Isabel de Bourbon Bragança, futura condessa do Iguaçu, nasceu em 28 de fevereiro de 1830, quando o imperador já havia expulsado Domitila do Rio de Janeiro para se casar com a segunda imperatriz, Amélia.

O romance de D. Pedro e a marquesa de Santos rendeu um dos conjuntos de documentos mais pitorescos da história brasileira. São as mais de 170 cartas que o imperador escreveu à amante entre 1822 e 1829. No começo, o tratamento é carinhoso, como “Meu amor do meu coração”, “Meu amor, minha Titila” e “Meu amor e meu tudo”. As assinaturas variam de “O Demonão”, “Fogo Foguinho”, “Pedro” a “O

Imperador” — este usado nas cartas de ciúmes ou quando o romance esfriava. Com muita frequência, ele se refere a Domitila de forma paternal, como “filha” ou a si mesmo como “seu filho”. Pelas cartas, sabe-se que D. Pedro cumulava a amante de presentes. A lista inclui carne de caça, um quarto de vaca, metade de um peru, perdizes e outros pássaros, um cestinho de morango, queijos e figos, botões de rosa, peça de fita, ramos de flores, papel, rosas e lírios brancos; e também joias caríssimas, como um medalhão com a efígie do imperador (quatro contos de réis) e uma pulseira de contas de ouro com fechos de brilhantes.17

O estilo das mensagens também varia de acordo com a temperatura do romance. Algumas eram fúteis e até infantis. Outras, repletas de paixão, erotismo e ciúmes. “Remeto-te o par de meias pretas, e não as calce sem outras por baixo”, admoestou D. Pedro em 2 de dezembro de 1827. “Muito curto está o teu vestido de chita. (...) Queiras-me tu bem e a mais ninguém...”18 Há também as cartas sinceras, que deixam entrever o lado humano do monarca: “Eu sou imperador, mas não me ensoberbeço com isso, pois sei que sou um homem como os mais, sujeito a vícios e a virtudes como todos o são.”19

Há por fim as cartas chulas, com descrições e vocabulário mais adequados a uma borracharia de beira de estrada do que a um palácio imperial. O historiador Alberto Rangel observou que os leitores de hoje deveriam ser gratos a D. Pedro I por “não saber ele ocultar nem manter ou disfarçar os seus sentimentos em (...) boas palavras”.20 Algumas dessas correspondências trazem detalhes curiosos a respeito da anatomia do imperador em linguagem crua. “Tua coisa está sem novidade, está boa, e as áreas têm diminuído, e agora já as não deito tão finas, e por isso a urina vem clara”, anuncia D. Pedro em missiva sem data.21 A “tua coisa” era, obviamente, a genitália do imperador e o texto dá a entender que, enquanto se relacionava com a marquesa, aparentemente contraíra uma doença venérea, moléstia comum na época. Em outra carta, D. Pedro voltaria a se referir à própria genitália de forma ainda mais divertida —

“máquina triforme”. Também insinua haver traído a amante e se diz arrependido: Desgraçado daquele homem que uma vez desconcerta a máquina triforme, porque depois, para tornar a atinar, custa os diabos, e muito mais desgraçado sou eu por ter feito (.. ) este desconcerto com ofensa de ti, minha filha. (.. ) Não falo em coisas passadas, pois o remédio é a emenda, só faço chorar por tê-las feito. (.. ) É um apuro de falar a verdade e de te não querer encobrir nada que me obriga a fazer-te esta participação. 22

Em tom mais carinhoso, D. Pedro comunica o envio de um presente em 12 de outubro de 1827 (data do aniversário dele): “Minha filha, já que não posso arrancar meu coração para te mandar, recebe esses dois cabelos do meu bigode, que arranquei agora mesmo.” Alberto Rangel conta que junto da correspondência de D. Pedro conservada na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro existe “um pacote de papel, encerrando cabelos de suspeita origem”, que seriam “mais recônditos” do que os do bigode citados nesta carta.23

Enquanto Domitila crescia em prestígio, a imperatriz Leopoldina mergulhava cada vez mais fundo no abismo depressivo que a levaria à morte em dezembro de 1826. A primeira humilhação imposta por D. Pedro à mulher fora a elevação da amante ao cargo de dama de honra da corte. Significava “infligir à imperatriz o mais odioso dos incô- modos, isto é, a sua presença, desde que saía de seus apartamentos privados”, segundo observou a inglesa Maria Graham, preceptora da princesa Maria da Glória.

Desesperada com as demonstrações públicas de infidelidade do marido, Leopoldina chegou a pedir ao pai, Francisco I, que a aceitasse de volta em Viena. Diante da demora na resposta, cogitou abandonar o palácio, recolher-se ao convento da Ajuda no Rio de Janeiro e ali aguardar a decisão do pai.24

O auge das humilhações foi a viagem de dois meses que o imperador empreendeu à Bahia entre fevereiro e abril de 1826, bem diferente das precárias cavalgadas a Minas Gerais e São Paulo às vésperas do Grito do Ipiranga. A frota, composta por quatro navios, transportava mais de duzentas pessoas, que incluíam a amante Domitila, a imperatriz Leopoldina, a princesa Maria da Glória, diversos barões, viscondes, secretários particulares, membros do clero, funcionários públicos e militares de alta patente. Os suprimentos para a viagem, comprados no Rio de Janeiro, incluíam oitocentas galinhas, trezentos frangos, duzentos marrecos, vinte perus, cinquenta pombos, 260 dúzias de ovos, trinta porcos adultos e 15 leitões, trinta carneiros, seis cabras, dez caixas de vinho francês, sendo quatro de Chateau Margaux e seis de Lerose Médoc, além de uma grande quantidade de frutas, verduras, legumes, biscoitos, café, chá, geleia, chocolate e queijos.25

Na travessia entre o Rio de Janeiro e Salvador, D. Pedro costumava passear pelo convés acompanhado de Domitila e da princesa Maria da Glória. Também jantavam juntos, enquanto Leopoldina fazia as refeições sozinha em seus aposentos. Na capital baiana, o imperador e a amante ficaram hospedados no mesmo prédio. Leopoldina, em outro, vizinho ao deles.26 “A viagem da corte à Bahia provocou um grande escândalo, pois o imperador, ao se fazer acompanhar pela imperatriz, sua filha mais velha e sua amante titular, chocou logicamente todo mundo”, assinalou Wenzel de Mareschal.27

Uma derradeira humilhação estava reservada a Leopoldina já no seu leito de morte. Em dezembro de 1826, enquanto a imperatriz agonizava no Palácio da Quinta da Boa Vista, a marquesa de Santos tentou usar a prerrogativa de dama da corte para entrar no quarto. Foi barrada na porta pela marquesa de Aguiar e pelo ministro Francisco Vilela Barbosa, marquês de Paranaguá. “Por favor, minha senhora, aqui não”, teria lhe dito o marquês. Ofendida, Domitila se retirou, mas queixou-se a D. Pedro, que, em represália, demitiu Vilela Barbosa do ministério e puniu todos os funcionários envolvidos no episódio. A morte de Leopoldina, porém, foi um golpe fatal no romance do imperador com a marquesa.

Viúvo, D. Pedro sabia que, para manter o prestígio do trono brasileiro junto às potências estrangeiras, precisava se casar novamente com uma princesa europeia. Domitila, obviamente, era um empecilho nas negociações e tinha de ser afastada da corte o mais rapidamente possível. “Brilhante casamento, no estado atual das coisas, não se consegue sem tempo, paciência”, avisou de Londres o marquês de Barbacena, encarregado de procurar uma candidata na Europa.28 Assustadas com a má reputação do imperador, apontado como um mulherengo incorrigível cuja conduta teria sido responsável pela morte de Leopoldina, nada menos que dez princesas recusaram a proposta de casar-se com ele em segundas núpcias.

Já na quarta recusa, D. Pedro mostrava-se profundamente constrangido. “Quatro repulsas recebidas em silêncio são suficientes para comprovarem ao mundo inteiro que eu busquei fazer o meu dever procurando casar-me”, escreveu ao ex-sogro, Francisco I. “Receber uma quinta repulsa envolve desonra não só à minha pessoa, mas ao império; portanto, estou firmemente decidido a desistir da empresa.”29 Em agosto de 1828 enviou novas instruções ao marquês de Barbacena indicando que, para não correr riscos de novas recusas, poderia ser mais flexível nas negociações: “O meu desejo, e grande fim, é obter uma princesa que por seu nascimento, formosura, virtude, instrução venha a fazer a minha felicidade e a do Império. Quando não seja possível reunir as quatro condições, podereis admitir alguma diminuição na primeira e na quarta, contanto que a segunda e a terceira sejam constantes.”30 Em resumo, a noiva poderia não ser muito nobre e até um pouco ignorante, desde que fosse bonita e virtuosa. E foi, de fato, o que aconteceu.

Com ajuda de seus diplomatas na Europa, o sortudo D. Pedro encontrou não apenas uma princesa virtuosa, mas uma mulher lindíssima na flor dos seus 17 anos. Sua nobreza, porém, era de segunda linha.

Nascida em Milão em 31 de julho de 1812, Amélia Augusta Eugênia Napoleona de Beauharnais era neta da imperatriz Josefina, primeira mulher de Napoleão Bonaparte. O pai, Eugênio de Beauharnais, fora um dos grandes generais do imbatível exército francês e ganhara de Napoleão, como recompensa pelas vitórias, o título de vice-rei da Itália. Sua linhagem estava, portanto, contaminada pelos laços familiares do “ogro usurpador”, o imperador francês que durante um quarto de século humilhara os tronos europeus.

Como estirpe, os Beauharnais nem se comparavam aos Habsburgo austríacos da primeira imperatriz, Leopoldina — estes, sim, nobres de primeira linha, admirados, respeitados e reconhecidos por todas as monarquias europeias. Nada disso, porém, parecia incomodar D. Pedro. Afinal, ele admirava Napoleão, de quem já tinha sido parente uma vez, no primeiro casamento, como se viu alguns capítulos atrás. E, acima de tudo, Amélia era uma mulher estonteante. “O original é muito superior ao retrato”, avisou Barbacena ao anunciar o desfecho da negociação finalmente bem-sucedida, em maio de 1829, em carta acompanhada do retrato da princesa.31 “Meu entusiasmo é tão grande que só me falta estar doido”, reagiu o imperador brasileiro.32

Amélia chegou ao Rio de Janeiro em outubro de 1829, quase três anos após a morte de Leopoldina. Ao desembarcar, usava um vestido cor-de-rosa adornado de rendas. D. Pedro ficou tão encantado que desmaiou no convés do navio. Em seguida, criou em sua homenagem uma das condecorações mais bonitas e desejadas do Império brasileiro, a “Ordem da Rosa”, cujo lema seria, sugestivamente, “Amor e Fidelidade”.33 Apesar de jovem e bonita, no entanto, Amélia não era ingênua. A primeira providência da nova imperatriz foi botar ordem na casa. Trocou os criados e camareiros e impôs nova etiqueta nos maus modos da corte do Rio de Janeiro. Mudou até o idioma. A partir de sua chegada, falava-se francês.

Também afastou do palácio todos os amigos desqualificados do imperador e expulsou a até então paparicada filha de Domitila, a duquesa de Goiás, despachada para o internato em Paris.

O imperador aceitou tudo com resignação. E foi recompensado por isso. A segunda imperatriz deu a D. Pedro mais uma filha, Maria Amélia Augusta, nascida em 1831 e falecida em 1853, antes de completar 22 anos. Foi, principalmente, uma companheira fiel e dedicada até o fim da vida. Depois de sua chegada, há vagas referências a romances passageiros de D. Pedro, como o filho que teria tido com a freira do convento da Esperança na ilha Terceira, nos Açores. Mas nada que se comparasse ao fogo dos anos vividos com Domitila. Pode-se dizer que, na medida do possível, D. Pedro foi um homem surpreendentemente fiel a Amélia.

Antes de cair nos braços da adorável Amélia, porém, D. Pedro teve de se livrar de uma obstinada Domitila, que teimava em não deixar a corte. No começo das negociações na Europa, diante das recusas das outras princesas, ainda houve uma recaída no romance. Domitila saiu do Rio de Janeiro para São Paulo em junho de 1828, retornou em abril de 1829 e partiu definitivamente em agosto, mais uma vez grávida do imperador. D. Pedro jamais chegou a ver a derradeira filha do casal, Maria Isabel, nascida em São Paulo. Os deveres de Estado falavam mais alto. No final, o tom das cartas é frio e distante. As assinaturas do começo do romance — “O Demonão” e “Fogo Foguinho” — dão lugar ao seco e protocolar “O Imperador”.

“Sinto muito perder a tua companhia, mas não há remédio”, avisou D. Pedro a Domitila em 10 de julho de 1829, quando Amélia já estava a caminho do Brasil. A marquesa ignorou. No dia 17 de agosto mandou notificá-la que tinha sete dias para deixar o Rio de Janeiro sob pena de arrancar-lhe todos os benefícios concedidos até então. Também mandou murar a saída secreta da Quinta da Boa Vista que levava ao palacete da amante e ameaçou reabrir o processo do misterioso atentado sofrido por Maria Benedita, a baronesa de Sorocaba, no qual Domitila era apontada como suspeita. Desta vez, a marquesa cedeu.

A última carta de Domitila a D. Pedro é triste e melancólica, como todas as grandes histórias de amor que se acabam, mas cheia de dignidade. O texto, gramaticalmente correto, indica que foi escrito por outra pessoa sob orientação da marquesa: Senhor. Eu parto esta madrugada e seja-me permitido, ainda esta vez, beijar as mãos de V. M. [Vossa Majestade] por meio desta, já que os meus infortúnios e minha má estrela me roubam o prazer de o fazer pessoalmente. Pedirei constantemente ao céu que prospere e faça venturoso o meu imperador. E quanto à marquesa de Santos, senhor, pede por último a V. M. que, esquecendo como ela teve tantos desgostos, se lembre só mesmo, a despeito das intrigas, que ela em qualquer parte que esteja saberá conservar dignamente o lugar a que V. M. a elevou, assim como ela só se lembrava do muito que devo a V. M., que Deus vigie e proteja como todos precisamos. De V. M. súdita, muito obrigada, Marquesa de Santos. 34

Ao retornar a São Paulo, Domitila deixou para trás a vida de escândalos. No dia 14 de junho de 1842, oito anos após a morte de D. Pedro em Portugal, casou-se em Sorocaba com o brigadeiro Rafael Tobias de Aguiar, um dos grandes chefes liberais da província. Com ele teve mais cinco filhos. Terminou a vida como uma grande dama da sociedade paulista. No seu solar, situado a poucos metros do Pátio do Colégio, eram realizados saraus literários e reuniões beneficentes. O poeta baiano Castro Alves apresentou-se lá. Domitila também se dedicou a obras de caridade. Entre outras, sustentava uma associação de prostitutas e mães solteiras. Isabel Burton, viúva do escritor, tradutor e cônsul britânico Richard Burton, que a encontrou já na velhice, registrou: Conhecemos em São Paulo uma personagem fascinante. Era a marquesa de Santos. (.. ) Era positivamente uma grande dama, muito simpática, absolutamente encantadora, sabedora de uma infinidade de casos do Rio de Janeiro, da corte e da família imperial e das coisas daquele tempo. (.. ) Tinha belos olhos negros, cheios de simpatia, inteligência e conhecimento do mundo.

Numa das visitas, Isabel foi recebida na cozinha por Domitila, “sentada no chão, a fumar, não um cigarro, mas cachimbo”.35 O hábito de fumar cachimbo era comum entre as mulheres da época.

A marquesa de Santos faleceu de enterocolite no dia 13 de novembro de 1867 e foi sepultada no cemitério da Consolação, cujas terras tinham sido por ela doadas à cidade de São Paulo. No seu testamento, mandou perdoar dívidas e distribuir dinheiro aos pobres, deu a liberdade a quatro escravos e encomendou setenta missas: vinte pelos escravos mortos e cinquenta pela sua própria alma.36

Notas 

1 Tobias Monteiro, História do Império: o Primeiro Reinado, p. 84.
2 Octávio Tarquínio de Sousa, A vida de D. Pedro I, vol. 2, p. 262.
3 Isabel Lustosa, D. Pedro I, p. 186.
4 Alberto Rangel, Cartas de D. Pedro I à marquesa de Santos, p. 25.
5 Tobias Monteiro, História do Império: o Primeiro Reinado, p. 83.
6 Isabel Lustosa, D. Pedro I, p. 187.
7 Octávio Tarquínio de Sousa, A vida de D. Pedro I, vol. 2, p. 221.
8 Octávio Tarquínio de Sousa, A vida de D. Pedro I, vol. 2, p. 35.
9 Octávio Tarquínio de Sousa, A vida de D. Pedro I, vol. 2, p. 169.
10 Isabel Lustosa, D. Pedro I, p. 189.
11 Octávio Tarquínio de Sousa, Fatos e personagens em torno de um regime, p. 179.
12 Alberto Rangel, Cartas de D. Pedro I à marquesa de Santos, p. 53.
13 Alberto Rangel, Cartas de D. Pedro I à marquesa de Santos, p. 132.
14 Tobias Monteiro, História do Império: o Primeiro Reinado, p. 86.
15 Octávio Tarquínio de Sousa, A vida de D. Pedro I, vol. 2, p. 185.
16 Tobias Monteiro, História do Império: o Primeiro Reinado, p. 92.
17 Alberto Rangel, Cartas de D. Pedro I à marquesa de Santos, p. 82 e 83.
18 Alberto Rangel, Cartas de D. Pedro I à marquesa de Santos, p. 321 e 322.
19 Alberto Rangel, Cartas de D. Pedro I à marquesa de Santos, p. 67.
20 Alberto Rangel, Cartas de D. Pedro I à marquesa de Santos, p. 37.
21 Luiz Lamego, D. Pedro I, herói e enfermo, p. 151.
22 Cartas de D. Pedro I à marquesa de Santos, p. 290 e 291.
23 Cartas de D. Pedro I à marquesa de Santos, p. 285 e 286.
24 Octávio Tarquínio de Sousa, A vida de D. Pedro I, vol. 2, p. 221.
25 Octávio Tarquínio de Sousa, A vida de D. Pedro I, vol. 2, p. 192-3.
26 Neil Macaulay, Dom Pedro, p. 190.
27 Alberto Rangel, Cartas de D. Pedro I à marquesa de Santos, p. 117.
28 Luiz Lamego, D. Pedro I, herói e enfermo, p. 129.
29 Octávio Tarquínio de Sousa, A vida de D. Pedro I, vol. 2, p. 265.
30 Luiz Lamego, D. Pedro I, herói e enfermo, p. 128.
31 Octávio Tarquínio de Sousa, A vida de D. Pedro I, vol. 3, p. 16.
32 Octávio Tarquínio de Sousa, A vida de D. Pedro I, vol. 3, p. 16.
33 Tobias Monteiro, História do Império: o Primeiro Reinado, p. 141.
34 Alberto Rangel, Cartas de D. Pedro I à marquesa de Santos, p. 633.
35 Alberto Rangel, Cartas de D. Pedro I à marquesa de Santos, p. 59.
36 Tobias Monteiro, História do Império: o Primeiro Reinado, p. 96.

Texto de Laurentino Gomes publicado em "1822",Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 2010. Digitalizado, adaptado e ilustrado para ser postado por Leopoldo Costa

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