5.10.2011

O PRIMEIRO LATICÍNIO DA AMÉRICA DO SUL

Quem não conhece a história de Santos Dumont, ex-Palmyra, cidade da Serra da Mantiqueira, na Zona da Mata mineira, se surpreende ao saber que ali, ainda no século XIX, na terra do “pai da aviação”, a indústria de laticínios era mais do que uma promessa. Era uma realidade econômica que transformou o pequeno município no maior polo brasileiro de produtos lácteos.

Em 1888, antes mesmo de Palmyra ser reconhecida como município, foi instalada ali a primeira fábrica de laticínios da América do Sul. O proprietário era o médico Carlos Pereira de Sá Fortes, neto de Carlos Sá Fortes, primeiro importador de gado Holandês na região. 
Nascido em Barbacena em 1850, seu sonho era produzir queijos com a mesma qualidade dos europeus. Para isso, foi à Europa visitar laticínios e comprou na Holanda o maquinário da Companhia de Laticínios da Mantiqueira, erguida às margens do Rio Pinho.

A família Sá Fortes fez história em Palmyra e deixou registros interessantes, além do envolvimento com a produção de leite e derivados. Um deles é sobre a amizade entre o coronel José Jorge Sá Fortes, também grande fazendeiro, e o inventor do avião. Santos Dumont (1873/1936) nasceu na Fazenda Cabangu, localizada a 16 quilômetros da então vila de João Gomes. Seu pai, o engenheiro Henrique Dumont, se instalou na propriedade em 1870, pois era o construtor responsável pelo ramal da Estrada de Ferro Dom Pedro II que passaria pela região. 

O coronel Sá Fortes foi uma referência para Santos Dumont quando se tratava de cuidar da fazenda. Ele aconselhava o amigo sobre a administração da propriedade, criadora de gado Holandês e fornecedora de leite para laticínios como o Alberto Boeke e Jong e Companhia.
Transformada em museu, a antiga casa da Fazenda Cabangu guarda rastros dessa história.


Outro amigo de Santos Dumont também foi importante personagem da história da então cidade pólo de laticínios. O holandês João Kingma era gerente do laticínio do também holandês Alberto Boeke, quando constatou que fabricar coalho seria uma grande oportunidade de negócio.

De certa forma, Kingma repetiu a história de seu patrão. Boeke era um mecânico que veio para o Brasil montar os equipamentos do laticínio de Carlos Pereira Sá Fortes. Anos depois, em 1907, se tornou fabricante do queijo da marca Borboleta. Sua empresa, fundada naquele ano com três sócios, chamava-se Alberto Boeke e Jong e Companhia, nome mudado em 1922 para Companhia de Lacticínios Alberto Boeke.

Pois não é que, em 1923, depois de trabalhar para Boeke, Kingma resolveu também montar sua própria indústria em sociedade com o maior pecuarista da Mantiqueira, João Geraldo Freiks. Por mais de 50 anos, a fábrica foi a única de coalho no Brasil.


A trajetória de Kingma é contada por seu neto, o escritor Victor Kingma. Filho de uma família tradicional de laticinistas da Frísia (região no noroeste da Europa), João Kingma, que se formara técnico em laticínios, leu num jornal holandês anúncio que procurava um profissional para montar o equipamento comprado na Europa pelo médico Hermenegildo Vilaça, que estava instalando um laticínio em Juiz de Fora, na longínqua Minas Gerais.
Ele enviou carta a Vilaça pedindo o emprego e, só depois de aceito, informou aos pais que ia viajar para o Brasil. Concluído o serviço, preparava-se para voltar à sua terra, mas foi convidado por Boeke, em 1909, a ser gerente de sua fábrica em Palmyra.




Durante anos, a maior empresa do setor em Santos Dumont, a Ribeiro Fonseca Laticínios S/A teve sua origem na fábrica Santa Martha, fundada em 1920 por Pedro José Ribeiro, produtora dos queijos das marcas Palmyra e Chantecler. Em 1935, a empresa muda de nome, com a entrada de outro sócio, Galileu Fonseca.

A Ribeiro Fonseca chegou a empregar mais de 500 pessoas em 60 laticínios espalhados pela região. Em 1960, morreu Albert Boeke, e, cinco anos depois, o laticínio fundado por ele foi comprado pela Ribeiro Fonseca. Esta, por sua vez, foi adquirida, em 1975, pelo paulista Jorge Chammas Neto, dono do grupo Moinho São Jorge, do qual fazia parte a Leite União. Em 1996, a Ribeiro Fonseca foi fechada.

Autoria de José de Souza Castro no livro 'O leite em Minas Gerais' - Belo Horizonte, Medialuna Editora, 2010. p. 31 a 35 Digitalizado. adaptado e editado para ser postado  por Leopoldo Costa

3 comments:

  1. Maravilhosa história. Hoje trabalho numa fábrica que produzem máquinas para laticínios.

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  2. Meu avô, Sr Joaquim Paulino foi gerente de fábricas da Ribeiro Fonseca. Dedicou sua vida toda á empresa. Trabalhou principalmente em Ibertioga, na Vargem Grande, em Rio Espera e encerrou sua carreira e também sua vida em Lamim, todas em Minas Gerais. Sempre ouvia muitas histórias da sua amizade com o Sr Ribeiro e o Sr Galileu. Ele tinha muito orgulho do seu trabalho.
    Gratidão por compartilharem um pouco dessa história que também é a história da minha família.

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  3. Minha avó Dora Müller era irmã de Elza Müller Boeke casada com Pedro Boeke

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