Na estrutura militar portuguesa na Idade Média, “bandeira” era uma tropa de 36 homens armados e treinados para a guerra.
O nome foi usado no Brasil colonial, para designar uma expedição particular de homens brancos, mamelucos (mestiços) e índios escravizados para adentrar aos sertões na busca de riquezas. Inicialmente buscavam ouro, iludidos pelas lendas em voga desde antes do descobrimento do Brasil, sobre a existência do El Dorado.
Existiam bandeiras de preação e bandeiras de prospecção.
As bandeiras de preação tinham resquícios da configuração militar medieval portuguesa. Eram formadas por centenas ou milhares de índios chefiados por mamelucos e portugueses. Dividiam em ‘estados-maiores’, ‘flanqueadores’ e ‘vanguardas’. Como armamento usavam o arco e flecha e raramente armas de fogo.
As bandeiras de prospecção de metais preciosos eram menores com algumas dezenas de aventureiros que procuravam evitar embate com os índios e por isso procuravam não margear os rios. O armamento era armas de fogo de menor impacto, como bacamartes e arcabuzes.
Os dois tipos de bandeiras não usavam nenhum animal de carga. Tudo era transportado nas costas dos índios escravizados, mesmo por que, as picadas que faziam nas matas para entranhar nos sertões e as pinguelas para atravessar os rios, não dariam passagem para animais de carga.
Com o passar do tempo as bandeiras tornaram-se maiores e segundo João Ribeiro (1860-1934), no seu livro de 1901 ‘História do Brasil’, ‘uma cidade em movimento’. Eram organizadas por uma pessoa experiente e de prestígio, que seria o chefe e o senhor absoluto da expedição, nesta época composta de portugueses, escravos indígenas, padres, mulheres e até crianças. O chefe e alguns auxiliares diretos, vestiam sobre a camisa de algodão uma gibão acolchoado para defenderem das flechas e usavam perneiras de couro sobre as calças para proteger dos espinhos e das cobras. Todos usavam chapéus de abas largas contra o sol e a chuva. O objetivo das expedições era a busca de metais e pedras preciosas, acreditando em todas as lendas e boatos que ouviam. O rumo era estabelecido com a ajuda da bússola e do conhecimento das constelações do céu. Levavam vários tipos de ferramentas, como machados, foices, enxadas, enxadões, pás, enxós, facões, facas e martelos. Também armas como bacamartes, arcabuzes e mosquetes.
A alimentação da expedição baseava-se na pesca e na caça, combinada com os mantimentos que transportavam como, por exemplo, farinha de mandioca, canjica de milho, carne seca, toucinho, sal, pimenta, alho, aguardente e limões. Algumas vezes pilhavam os víveres das aldeias de índios que encontrassem pelo caminho, depois de matar ou expulsá-los. Quanto os mantimentos acabavam, sem outra opção, devoravam até carne de sapo, cobra e lagartos. Esporadicamente paravam para fazer roças de milho. Deixava um grupo para cuidar das roças, que seria reincorporado na volta. Estes locais pelas condições que ofereciam, geralmente se transformavam em parada costumeira de várias expedições, dando origem a povoações. Quando a situação chegasse ao ponto de não ter nada de alimentos para seguir a caminhada, toda a expedição acampava nestes locais, plantavam os legumes que podiam, caçavam, faziam armadilhas para capturar animais silvestres, colhiam palmitos e frutas e só continuavam a caminhada depois da colheita do milho.
]As ‘entradas’ eram expedições precursoras das ‘bandeiras’ e geralmente tinham o patrocínio da Coroa. A primeira ‘entrada’ que se tem registro foi realizada entre o final de 1503 e começo de 1504. Américo Vespúcio acompanhado de 30 homens partiu de Cabo Frio e penetrou cerca de 40 léguas para o interior.
Em 1531, Pêro Lobo com uma expedição de 80 homens, saiu de Cananéia e penetrou pelos sertões em busca de ouro. Ninguém retornou e certamente foram mortos pelos índios Carijós.
Em 1553, o espanhol Francisco Bruza de Espinosa partiu de Porto Seguro, acompanhado do jesuíta João de Azpicuelta Navarro e uma dezena de companheiros e penetrou 300 léguas pelo sertão adentro margeando o rio Jequitinhonha, atingindo o rio das Velhas e supostamente até a margem direita do rio São Francisco.
Gabriel Soares de Souza em 1592, também partindo de Porto Seguro subiu o rio Paraguaçu com o intuito de atingir o rio São Francisco, mas morreu antes de realizar a façanha.
Em 1595, Belchior Dias Moréia seguiu o mesmo roteiro percorrido por Gabriel Soares de Souza, buscando ouro e prata.
Em 1599, o governador geral do Brasil Francisco de Souza, foi a São Paulo e promoveu a organização de algumas ‘entradas’. Em 1601, a expedição de André de Leão desceu o rio Paraíba do Sul, ultrapassou a serra da Mantiqueira e alcançou às nascentes do rio São Francisco. Durante um período de nove meses ficou procurando a existência de minas de prata.
Em 1602, a expedição de Nicolau Barreto ficou percorrendo os sertões de São Paulo durante quase dois anos, chegando até Guairá. Não encontrou metais preciosos, mas preou mais de 3.000 índios para escravizar.
Depois de Nicolau Barreto, em 1606, a expedição de Diogo de Quadros saiu de São Paulo para prear índios para escravizar mas se envolveu numa renhida luta com os Carijós, sendo obrigado a retroceder.
Entre 1606 e 1607, a bandeira chefiada por Manuel Preto foi até Guairá, preou uma centena de índios que foram escravizados e trabalhavam na sua fazenda localizada onde é hoje o bairro da Freguesia do Ó na cidade de São Paulo.
As bandeiras de Belchior Dias Carneiro e de Martim Rodrigues entre 1607 e 1609 saíram para a preação na bacia dos rios Paraná e Paraguai e não tiveram sucesso. A expedição de Martim Rodrigues foi completamente dizimada..
Na segunda década do século XVII houve as expedições de Clemente Álvares, Cristóvão de Aguiar, Brás Gonçalves e a de Pêro Vaz de Barros. Todas com a missão de preação de índios. A expedição de Pêro Vaz de Barros foi patrocinada pelo filho do governador Francisco de Souza e tinha o objetivo de conseguir índios alfabetizados para trabalhar nas minas de Araçoiaba..
Na década seguinte, partiram entre outras as bandeiras de Henrique da Cunha Gago, Sebastião Preto, Manuel Preto e do tio de Fernão Dias Paes, também chamado Fernão. Devido a quantidade de expedições que saiam de São Paulo rumo aos sertões, a vila tinha poucos homens (apenas os velhos e doentes), só mulheres e crianças
Em 1624, o governo determinou que um quinto dos índios escravizados fosse propriedade da Coroa.
Num certo período (século XVII) houve expedições com dupla finalidade: busca de metais preciosos e preação de índios. Alguns bandeirantes dirigiram suas expedições para o sul, com o objetivo de conseguir índios treinados e alfabetizados para escravizar nas ‘reduções’ de Tapes e do rio Uruguai, assim como as de Guairá e do Itatim. Outros tomaram o rumo dos sertões de Minas Gerais e de Goiás na busca de ouro, esmeraldas e diamantes. Ambas as frentes, foram responsáveis pela dilatação do território brasileiro, aproveitando a situação da época, em que Espanha e Portugal estavam sob o mesmo rei. Faziam isto sem intenção, pois, nunca tinham espírito de colonização, apenas de exploração.
Dois milhares de índios, novecentos mamelucos e sete dezenas de paulistas formaram uma grande expedição para prear índios nas missões dos jesuítas no sul do Brasil. Era liderada por Manuel Preto (?-1630) e tinha como imediato Antonio Raposo Tavares (1598-1658). Partiram de São Paulo no dia 18 de setembro de 1628. Foram aprisionando e massacrando os que resistiram, tendo alguns fugido para o Paraguai. Trouxeram para São Paulo milhares de índios para escravizar.
Também no ano de 1628 a expedição de Ascenso Ribeiro e André Fernandes se dirigiu a ‘redução’ de Itatim, destruindo-a e depois dizimando também as ‘reduções’ recém formadas pelos jesuítas a oeste do rio Pardo.
Em 1635, outro tio de Fernão Dias Paes chamado Luís de Leme e no ano seguinte Antonio Raposo Tavares com uma expedição de 1.000 índios e 120 mamelucos e paulistas destruíram e ocuparam as ‘reduções’ de Jesus Maria, San Cristóbal e Santa Ana. Em 1637, o bandeirante Francisco Bueno completou a destruição de Tapes, atacando as missões de Yequi e Santa Tereza. As ’reduções’ do rio Uruguai foram destruídas pela expedição de Fernão Dias Paes em 1638.
Em 1693, Antonio Rodrigues de Arzão descobriu ouro em Minas Gerais, no mesmo local onde antes estivera em 1675, Lourenço Castanho Taques.
Em 1694, Duarte Lopes participante da expedição de Fernão Dias Paes encontrou ouro num riacho afluente do rio Guarapiranga, onde hoje é a cidade de Mariana em Minas Gerais. A notícia alvoroçou os bandeirantes paulistas que organizaram várias expedições para as proximidades do local. Acharam ouro em Itaverava e em Ouro Preto (Antonio Dias de Oliveira e padre João de Faria em 1698 e 1699). Salvador Furtado de Mendinça encontrou ouro no ribeirão do Carmo, sendo seguido por João Lopes de Lima.
Em 1700, Manuel Borba Gato, casado com uma filha de Fernão Dias Paes, descobriu as minas de Sabará. De novo, houve um grande fluxo de expedições para o local sendo fundada a vila de Pitangui.
Em 1718, a bandeira de Pascoal Moreira Cabral Leme descobriu as minas de Cuiabá.
Quando as 'bandeiras' começaram a definhar, a marcha para o oeste passou a ser assumida quase que exclusivamente pelo movimento das ‘monções’.
‘Monções’ eram expedições, que aproveitando a estação das águas do rio Tietê, desciam-no rumo ao rio Paraná. Tudo era transportado por canoas inteiriças feita de um só tronco de arvore, medindo cerca de doze ou treze metros de comprimento por um metro e meio de diâmetro. As maiores canoas chegavam a transportar até quatrocentas arrobas de carga, além de 25 a 30 pessoas. Muitas vezes, por falta de navegabilidade, era necessário caminhar muitos quilômetros por terra carregando nos ombros as pesadas canoas e todos os equipamentos.
(Texto de Leopoldo Costa)
Nunca tinha lido texto tão completo e grandioso sobre as "entradas" e "bandeiras"...A gente toma
ReplyDeleteconhecimento bastante superficial e sem motivação nos primeiros anos de escola...depois esquece, não se tem noção de como é importante conhecer esta interessante parcela de nossa história...Obrigada, por nos trazer, tão detalhadinha...
Um abraço