A verdade por detrás das manchetes.
1. O chá verde evita o cancro?
Esta bebida de consumo comum é bem conhecida pelas suas potenciais propriedades anticancerígenas, mas os indícios são contraditórios e longe de estarem confirmados. As substâncias que se crê serem responsáveis são as catequinas – compostos da família dos polifenóis que se encontram também no cacau, ameixas, vinagre e cevada, entre outros alimentos. Em 2009, o grupo Cochrane reuniu 51 estudos que tentaram relacionar o chá verde com a prevenção do cancro, incluindo resultados de mais de 1,6 milhões de indivíduos, mas não conseguiu demonstrar a ligação.
2. Comer aipo resulta em calorias negativas?
O aipo é um alimento de dieta popular por causa do seu baixo conteúdo calórico, mas a ideia de que exige mais energia para digerir do que aquela que fornece ao corpo é um mito. O aipo é rígido, aquoso e repleto de fibras, e um pé inteiro tem apenas cerca de dez quilocalorias; mas de acordo com vários nutricionistas, a energia gasta a mastigar e digeri-lo é cerca de cinco vezes inferior. Na realidade, segundo um estudo sobre o gasto de energia ao mastigar pastilha elástica, seria precisa cerca de uma hora de mastigação para queimar as calorias contidas num pé de aipo.
3. Os brócolos revertem lesões da diabetes?
Os vegetais crucíferos (como os brócolos, a couve-lombardo, a couve-de-folhas e a couve-de-bruxelas) estão repletos de fibra, vitaminas e outros nutrientes, mas as alegações sobre os fitoquímicos com propriedades miraculosas para combater o cancro, a diabetes e outras doenças são exageradas. “Fitoquímico” significa “químico vegetal” e aquele que interessa particularmente às pessoas chama-se sulforafano. Em laboratório, parece reduzir os radicais livres produzidos por vasos sanguíneos lesados, mas isso não diz grande coisa sobre os benefícios reais de ingerir brócolos. O corpo humano é muito mais complexo do que um tubo de ensaio e comer os alimentos na íntegra é muito diferente de consumir extratos químicos purificados.
4. Os espinafres estão repletos de ferro?
A ideia comum de que os espinafres são uma ótima fonte de ferro é atribuída à personagem da ficção Popeye, que, na realidade, os ingeria pela vitamina A. Conta-se também que a quantidade de ferro nos espinafres foi mal calculada por um nutricionista que colocou a vírgula das casas decimais no local errado e multiplicou o valor por dez – mas este parece ser um mito urbano. As grandes vantagens dos espinafres são as vitaminas K, A e C. Grama por grama, contêm a mesma quantidade de ferro do que as carnes vermelhas, mas numa forma de absorção mais difícil para o corpo humano.
5. Um shot de sumo de erva de trigo tem mais nutrientes do que 1 kg de vegetais?
A erva de trigo é alegadamente altamente nutritiva e o shot standard de 30 mililitros de sumo vem acompanhado de várias pretensões saudáveis. Os rebentos frescos contêm de facto vitaminas e minerais, incluindo zinco, ferro e vitaminas A, C e E; mas a ideia de que estas pequenas folhas verdes oferecem mais nutrientes do que qualquer outro vegetal é falsa. A erva de trigo é tão nutritiva como outros vegetais verdes, como os brócolos, mas sob a forma de shot de sumo nem sequer conta como uma das cinco porções diárias que deve ingerir.
6. O vinho tinto faz bem ao coração?
O vinho tinto contém uma substância chamada resveratrol, que se demonstrou exercer alguns efeitos benéficos sobre os vasos sanguíneos e a circulação, em tubos de ensaio e animais de laboratório. Mas não se sabe se beber o vinho em si protege o ser humano. Em vários estudos, a quantidade de resveratrol usada seria o equivalente a beber várias garrafas de vinho tinto por dia – e o conteúdo alcoólico, embora possivelmente um protetor cardíaco a níveis baixos, pode aumentar a pressão arterial quando consumido em excesso. Muitos alimentos e bebidas contêm substâncias químicas benéficas mas, quando ingeridos na totalidade, os efeitos são muito mais complexos.
7. Os alimentos sem glúten são mais saudáveis?
Arroz, batata, tapioca, trigo-mourisco e outros grãos sem glúten fazem parte de um número cada vez maior de produtos que encontramos nas prateleiras do supermercado; mas são mesmo mais saudáveis do que os pães, bolos e bolachas standard? Estes produtos são uma alternativa segura para a pequena percentagem da população que experimenta uma resposta imunitária prejudicial quando ingere trigo. Todavia, se não sofre de doença celíaca nem alergia ao glúten, evitar o trigo é desnecessário e potencialmente pouco saudável. Os alimentos com trigo integral são ricos em vitaminas B e fibra, enquanto as alternativas sem glúten são muitas vezes mais ricas em gordura e açúcar, para compensar o sabor e textura invulgares.
8. A beterraba é o elixir da vida?
Em 2010, um estudo sobre os efeitos do sumo de beterraba no desempenho do exercício de nove homens jovens e saudáveis sugeriu a existência de benefícios no atraso da exaustão. Foi uma observação interessante, mas gerou um título de notícia muito exagerado; um jornal britânico noticiou que o sumo de beterraba poderia ser um “elixir da juventude”, potencialmente ajudando os mais velhos a tornarem-se mais ativos. O estudo não testara o sumo em pessoas de idade e a amostra era demasiado pequena para sabermos se os resultados se aplicariam à população geral. Títulos de artigos apelativos podem amiúde deturpar a ciência subjacente.
9. Os peixes gordos reforçam a mente?
A ingestão dos ácidos gordos ómega 3 e ómega 6 presentes nos peixes gordos é benéfica, mas as alegações de que reforça a capacidade mental não têm suporte em provas científicas. Um estudo de dois anos sobre a ação de suplementos ricos nestes ácidos em adultos com mais idade não encontrou diferenças na função cognitiva e uma análise dos indícios realizada em 2006 não encontrou razões para crermos que o ómega 3 possa combater a demência. Um dos estudos que defendia que o ómega 3 melhorava a memória não testava esta possibilidade, mas antes a capacidade de proteção contra a hipoxia cerebral.
10. Os alimentos picantes aumentam a longevidade?
Em 2015 foi publicado um estudo envolvendo mais de meio milhão de pessoas que mostrava que as que ingeriam comida picante várias vezes por semana eram menos suscetíveis de morrer do que as que não o faziam. Antes de encher a despensa de malaguetas, lembre-se de que correlação não é o mesmo que causalidade; não é por partilharem um padrão que duas situações estão diretamente ligadas. Tal como os autores do estudo explicam, muitos outros fatores podem ter influenciado os resultados, como a velocidade de ingestão, a quantidade de arroz consumida para aplacar o picante, ou qualquer outra coisa. É necessária mais pesquisa para esclarecer estas complexidades.
Artigo publicado na revista "Quero Saber" edição 70, julho de 2016, Lisboa, Portugal, excertos pp.46-47. Adaptado e ilustrado para ser postado por Leopoldo Costa.
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