10.01.2018

CAPITANIAS NO BRASIL


CAPITANIAS DA COROA

Também chamadas Capitanias Reais. (pertencentes ao próprio Governo Português), resultaram do desmembramento ou da junção de Capitanias Hereditárias, por necessidade administrativa ou por abandono dos primitivos donatários, incapazes de conter os reiterados ataques dos selvagens e de corsários franceses, quase sempre aliados dos naturais da terra. Foram estas as Capitanias da Coroa, criadas ainda no século XVI:

 1. Bahia de Todos os Santos, escolhida para sede do governo-geral. Em 1576 Manuel Coutinho, herdeiro do primeiro donatário, cedeu-a à Coroa por um padrão de juros de quatrocentos mil-réis.

2. São Sebastião do Rio de Janeiro, composta de terras  conquistadas aos franceses e tamoios, e antes pertencentes à Capitania Hereditária de São Vicente.

3. Paraíba, composta de terras pertencentes às Capitanias Hereditárias do Rio Grande e de Itamaracá, igualmente conquistadas aos selvagens, frequentemente auxiliados pelos franceses nas lutas contra os luso-brasileiros. Situada em zona abandonada pelo; primitivos donatários, sua conquista ultimou- se no governo de Manuel Barreto.

4. Rio Grande, formada de terras também conquistadas aos selvagens e franceses, e antes pertencentes às Capitanias  Hereditárias do Maranhão (lª e 2ª), do Ceará e do Rio Grande, abandonadas pelos primitivos donatários. Sua conquista ultimou-se no governo de D. Francisco de Sousa, o último do século XVI.

CAPITANIAS DA COROA NOS SÉCULOS XVII e XVIII

Durante o século XVI tinham-se criado no Brasil quatro Capitanias da Coroa: Bahia de Todos os Santos, São Sebastião do Rio de Janeiro, Paraíba e Rio Grande. Em princípios do século XVII fundaram-se mais três Capitanias Reais: Ceará, Maranhão, logo elevada a categoria de Estado do Maranhão e Grão-Pará. Em 1654 a Capitania de Pernambuco passou ao domínio da Coroa porque o seu quarto e último donatário, Duarte Albuquerque Coelho, tomara o partido da Espanha, contra Portugal, por ocasião da Restauração Portuguesa de 1640.

No Extremo-Sul do país, pretendendo a Metrópole levar os limites do Brasil ao Rio da Prata, fundou na sua margem esquerda, em 1680, a Nova Colônia do Santíssimo Sacramento. Contudo, não só a demarcação de fronteiras, mas também a exploração das minas deslocara o centro de interesse econômico mais para o Sul, o que deu causa, em 1709, à criação de nova Capitania da Coroa, São Paulo e Minas do Ouro, em 1720 dividida nas Capitanias de São Paulo e Minas Gerais. Seguiram-se-lhes, pela mesma razão, a do Rio Grande de São Pedro, em 1738; a de Goiás, em 1744; a de Mato Grosso, em 1748 e a de Santa Catarina, em 1760.

Em 1799, quando se iniciou o governo direto do Príncipe-Regente D. João, as antigas Capitanias Hereditárias, por abandono, compra ou confisco já se tinham incorporado aos domínios da Coroa, portanto, naquele fim de centúria, extinto também o Estado do Maranhão eram as seguintes as divisões territoriais do Brasil:

Capitanias Gerais

1) Grão-Pará; 2) Maranhão; 3) Pernambuco; 4) Bahia de Todos os Santos; 5) Minas Gerais; 6) Goiás; 7) Mato Grosso; 8) Rio de Janeiro; 9) São Paulo.

Capitanias Subalternas: 

1) São José do Rio Negro; 2) Piauí; 3) Ceará (autônoma a partir de 1799; 4) Rio Grande do Norte; 5) Paraíba (também autônoma a partir de 1799); 6) Espírito Santo; 7) Santa Catarina; 8) Rio Grande de São Pedro (elevada em 1807 a Capitania Geral com o nome de São Pedro do Rio Grande).

Após a chegada do Príncipe-Regente D. João ao Rio de Janeiro, ganharam autonomia as Capitanias do Espírito Santo, Piauí, Rio Grande do Norte e Santa Catarina. Mais tarde, elevado o Brasil a categoria de Reino Unido aos de Portugal e Algarve, fundaram-se mais duas Capitanias Hereditárias: Alagoas e Sergipe d"El Rei. A Capitania de São José do Rio Negro foi depois suprimida e restaurada como Província do Amazonas, criando-se também , por essa época, a Província do Paraná. A divisão administrativa do período colonial, pouco modificada no Império, acrescentar-se-iam, na República, os Territórios e Distrito Federal, bem assim os estados do Acre e da Guanabara.

CAPITANIAS HEREDITÁRIAS

Em setembro de 1532 D. João III mandou carta a Martim Afonso de Sousa, em que lhe comunicava decisão de dividir a nova terra em tema colonial que consistia dividir as extensas porções de terra em Capitania, sistema colonial que consisti na doação de terras a particulares,ilustres marinheiros e grandes soldados, fidalgos da Casa Real e altos funcionários do Reino, dispostos a correr riscos da empresa colonizadora.

"Quando se fala em doação, escreve Pombo, parece realmente que se tratam de propriedade territorial; e não é isso; o que se fazia. Não é a terra que o soberano doava, mas o benefício, uma parte do usufruto apenas. E tanto assim que, na própria carta de doação, concedia também o rei, mediante certas condições, um pequeno prazo de terras ao donatário; e estas, sim, como propriedade plena, imediata e pessoal" A adoção do novo regime decorria de motivos ponderáveis: Portugal, país pequeno e pobre, achava-se exaurido. Diz Pedro Calmon: “Era negra a situação financeira de D. João III, atenazado pela desvalorização das especiarias, pelos infortúnios da Índia, pelos gastos do Estado e incessante aumento de sua responsabilidade de além-mar, no trágico e longínquo Oriente" Por outro lado, continuava o contrabando aberto de pau-brasil, especialmente pelos franceses, que mostravam cada vez mais ousados a ponto de estabelecerem companhias para maior segurança de suas operações organizando-se inclusive, para resistência armada: basta lembrar que em março de 1532 a Feitoria portuguesa de Pernambuco fora atacada e tomada pelos tripulantes da nau Le Pèlerine, que a substituíram por um fortim bem guarnecido (este fortim fora depois,retomados pelos portugueses, quando um ataque de Pêro Lopes de Sousa, que teria condenado a morte vinte e um dos seus defensores e levando trinta prisioneiros. Tudo somado,mais o desejo que tinha D. João III de propagar a fé católica em terras habitadas por indígenas, a solução aparente eram as Donatarias, que assim também se chamavam as Capitanias Hereditárias. Não era novo o sistema: usara-o Portugal no povoamento das ilhas desertas do Oceano Atlântico, descobertas durante o século XV: Madeira, Porto Santo, Açores, Cabo Verde e São Tomé; e mesmo no Brasil já se ensaiara o regime, quando, em 1504,D. Manuel I doara a Ilha de São João, ou da Quaresma, ao armador Fernão de Noronha, ou Loronha, cujo nome, depois modernizado para Fernando de Noronha prevaleceu na designação do arquipélago situado a 50 léguas das costas do país. Em 1522 o próprio D. João III confirmara a doação, “a fim de que o donatário na ilha lançasse gado e a rompesse e aproveitasse, segundo lhe aprouvesse, obrigando-se ao tributo do quarto e dízimo”. Essa foi, na verdade, a primeira Capitania Hereditária no Brasil; tanto que em 1559 a Regente D. Catarina, governante de Portugal na menoridade de D. Sebastião, confirmou a doação em favor de outro Fernão de Noronha, neto do primeiro. Contudo, esclarece Varnhagen, seus donatários não mandaram colonos, nem inverteram na ilha cabedais, porquanto, anos depois estava deserta, somente no século XVII aparecendo notícias de seu povoamento”.

Destarte, por Capitanias Hereditárias verdadeiramente se entendem as que D. João III instituiu entre 1534 e 1536, em execução ao plano que anunciara a Martim Afonso de Sousa em 1532. Nos seus 'Capítulos de História Colonial' resume assim as disposições das cartas de doação pelas quais se instituíram as Capitanias Hereditárias no Brasil: “Os donatários seriam de juro e herdade senhores de suas terras, teriam jurisdição civil e criminal, com alçada até cem mil-réis na primeira, com alçada no crime até morte natural para escravos, índios, peões e homens livres, para pessoas de mor qualidade até dez anos de degredo ou cem cruzados de pena; na heresia (se o herege fosse entregue pelo eclesiástico), traição, sodomia, a alçada iria até morte natural, qualquer que fosse a qualidade do réu, dando-se apelação ou agravo somente se a pena não fosse capital. Os donatários podiam fundar vilas, com termo, jurisdição, insígnias, ao longo das costas e rios navegáveis; seriam senhores das ilhas adjacentes até distância de dez léguas da costa; os ouvidores, os tabeliães do público e judicial seriam nomeados pelos respectivos donatários, que poderiam livremente dar terras de sesmarias. exceto à própria mulher ou ao filho herdeiro. Para os donatários poderem sustentar seu estado e a lei de nobreza, eram-lhes concedidas dez léguas de terra ao longo da costa, de um a outro extremo da Capitania, livres ou isentas de qualquer direito ou tributo exceto o dizimo, distribuídas em quatro ou cinco lotes, de modo a intercalar-se entre um e outro pelo menos a distância de duas léguas: a redízima (1/10 da dízima) das rendas pertencentes à Coroa e ao Mestrado (da Ordem de Cristo); a vintena do pau-brasil (declarado monopólio real, como as especiarias), depois de forro de todas as despesas; a dizima do quinto pago à Coroa, por qualquer sorte de pedraria, pérolas, aljôfares, ouro, prata, coral, cobre, estanho, chumbo ou outra qualquer espécie de metal; todas as moendas d’água,marinhas de sal e quaisquer outros engenhos de qualquer qualidade que na Capitania e governança se viessem a fazer; as pensões pagas pelos tabeliães; o preço das passagens dos barcos nos rios que pedissem; certo número de escravos que poderiam ser vendidos no Reino, livres de todos os direitos; a redizima dos direitos pagos pelos gêneros exportados etc".

Quanto aos forais que acompanhavam as cartas de doação, diz ainda Capistrano de Abreu: “Os forais asseguravam aos solarengos: sesmarias com a imposição única do dízimo pago ao Mestrado de Cristo; permissão de explorar as minas, salvo o quinto real; aproveitamento do pau-brasil dentro do próprio pais; liberdade de exportação para o Reino, exceto de escravos, limitados a numero certo, e certas drogas defesas (pau-brasil, especiarias, etc.); direitos preferenciais que os protegeriam da concorrência estrangeira; entrada livre de mantimentos, armas, artilharia, pólvora, salitre, enxofre, chumbo e quaisquer coisas de munições de guerra; liberdade de comunicação entre umas e outras Capitanias do Brasil.”

Criaram-se no Brasil 14 Capitanias Hereditárias, divididas em 15 lotes que se distribuíram a 12 donatários. Ao longo do litoral, entre os atuais Estados do Maranhão e Santa Catarina, assim se repartiu o país:

1. Primeira do Maranhão, de 50 léguas de costa, entre a Abra de Diogo Leite e o Cabo de Todos os Santos, doada a Aires da Cunha, que se associou ao escritor João de Barros.

2. Segunda do Maranhão, de 75 léguas, entre o Cabo de Todos os Santos e o Rio da Cruz (hoje Camocim), concedida a Fernando Álvares de Andrade.

3. Ceará, de 40 léguas, entre o Rio da Cruz e a Angra dos Negros, doada a Antônio Cardoso de Barros.

4. Rio Grande, de 100 léguas, entre a Angra dos Negros e a Baía da Traição, também concedida a João de Barros.

5. Itamaracá, de 30 léguas, entre a Baía da Traição e o Rio Iguaçu, doada a Pêro Lopes de Sousa.

6. Pernambuco, também chamada Nova Lusitânia, de 60 léguas, entre os Rios Igaraçu e São Francisco, outorgada a Duarte Coelho.

7. Bahia de Todos os Santos, de 50 léguas, entre o Rio São Francisco e a Ponta do Padrão, doada a Francisco Pereira Coutinho.

8. Ilhéus, de 50 léguas, entre a Bahia de Todos os Santos e o Rio Santo Antonio, doada a Jorge de Figueiredo Correia.

9. Porto Seguro, de 50 léguas de costa, entre os Rios Santo Antonio e Mucuri, concedida a Pêro do Campo Tourinho.

10. Espírito Santo, de 50 léguas, entre os Rios Mucuri e Itapemirim, outorgada a Vasco Fernandes Coutinho.

11. São Tomé, do. 30 léguas entre os baixos dos Pargos (Itapemirim) e Rio Macaé, doada a Pêro de Góis.

12. São Vicente, de 100 léguas de costa em dois lotes: o primeiro, entre os Rios Macaé e Curupacé ou Juqueriquerê com 55 léguas; o segundo, do Rio de São Vicente à Ilha do Mel, à entrada da Baia de Paranaguá, com 45 léguas, doada á Martim Afonso de Sousa.

13. Santo Amaro, de 10 léguas, encravada na Capitania anterior, entre os Rios Curupacé e de São Vicente, concedida a Pêro Lopes de Sousa.

14. Santana, do 40 léguas, da Ilha do Mel até 28°20' da latitude sul, nas alturas de Laguna, também doada a Pêro Lopes de Sousa.

Além dessas quinze, mais três pequenas donatarias foram criadas no século XVI: Ilha da Trindade, ao largo da costa do Espírito Santo, doada, em 1539, a Belchior Camacho. Ilha de Itaparica, sesmaria na Capitania da Bahia de Todos os Santos, transformada, em 1556, em Donataria concedida a D. Antônio de Ataíde, l° Conde da Castanheira. Peroaçu, Paraguaçu ou Recôncavo da Bahia, antes sesmaria na Bahia de Todos os Santos, doada, em 1556, a D. Álvaro da Costa, como prêmio pelos seus esforços nas lutas contra os indígenas.

À exceção de São Vicente e Pernambuco, não alcançaram êxito as Capitanias em geral, sendo que em alguns lotes então distribuídos não houve sequer começo de povoamento. Não obstante, em várias delas se fundaram vilas e povoados que contribuíram, de modo mais ou menos eficaz, para o malogro das tentativas de invasão do território por piratas estrangeiros. Quase que invariavelmente atenazados pela falta de recursos materiais para um trabalho contínuo e demorado; carecendo dos meios indispensáveis para combater eficazmente a pirataria estrangeira, a hostilidade dos índios e a ação dos criminosos favorecidos pelo direito de homizio (quando alguém cometia um delito numa Capitania, não podia ser preso numa outra, para onde fugisse), ainda assim conseguiram os donatários proporcionar ao futuro país, além de um princípio de defesa do território, a base da sua população agropecuária pelo povoamento com sesmeiros, e a riqueza econômica da indústria açucareira. Escreve Rocha Pombo: “Decerto que nem todos puderam levar com igual fortuna a sua tarefa. Mas nenhum deles deixou por si mesmo ou por preposto) de tomar muito a sério a sua obra na América. Muitos, como Duarte Coelho, Pêro de Gois, Pêro de Campo e outros, entravam aqui de alma aberta, num vivo entusiasmo pela terra. Outros, como Francisco Pereira Coutinho, Vasco Fernandes Coutinho, Aires da Cunha, tiveram a pagar com o sacrifício da própria vida aquela temeridade de vir para aqui afrontando tão desabridamente o destino.

É justo, pois, que recordemos hoje aqueles heróis, que ficaram na obscuridade do seu papel, e quantas vêzes do infortúnio, sem uma lembrança que vale por eles na terra, que foram os primeiros a desbravar para as multidões que depois vieram.” Vigentes no Brasil durante dois séculos e meio, até sua total extinção, devida ao Ministro Marquês de Pombal, as Capitanias Hereditárias tiveram sua complementação no regime do governo-geral, criado por D.João III, em 1548.

Bahia de Todos os Santos.

Quando Francisco Pereira Coutinho chegou à sua Donataria ali encontrou uma verdadeira colônia de portugueses e espanhóis, que viviam em perfeitas relações com os indígenas, todos sob o ascendência de Diogo Álvares Correia, o Caramuru. Estabelecendo-se na povoação já fundada, erigiu-a Pereira Coutinho em vila e capital da Donataria, espalhando-se em colonos pelas vizinhanças. Durante seis anos tudo andou bem: aplicaram-se os moradores ao trabalho, fundaram-se engenhos, desenvolveu-se a cultura da cana-de-açúcar, a do algodão, a do tabaco e de outros gêneros; cresceu o numero de imigrantes e ampliou-se o povoamento, explorando-se aquela parte do litoral até quase o sertão. Mas, passados os primeiros tempos, dissenções entre os colonos e lutas contra os indígenas forçaram o capitão-mor com sua gente a fugir para as Capitanias de Ilhéus e Porto Seguro. Cerca de um ano depois, julgando pacificados os ânimos, lá foi buscá-los o Caramuru; de volta à Bahia, naufragou o navio em que viajava Coutinho e a sua comitiva; sobrevivendo ao naufrágio, recolheram-se à Ilha de Itaparica e ali foram mortos pelos selvagens (1547). No ano seguinte D. João III escolheu essa Capitania para sede do governo-geral, dada a sua posição quase central na costa brasileira; e em 1576 o herdeiro natural, Manuel Coutinho, cedeu-a definitivamente à Coroa por um padrão de juros de 400$000.

Ceará. 

No decurso do século XVI não houve ensaios de colonização nesta Capitania. Seu donatário, Antônio Cardoso de Barros, só veio ao Brasil em 1549, na companhia do primeiro governador, Tomé de Sousa. Viajando para a Metrópole em 1556, no mesmo navio em que ia D. Pêro Fernandes Sardinha, com este foi morto pelos caetés, quando do naufrágio que sofreram na costa alagoana.

Espírito Santo.

Vasco Fernandes Coutinho chegou a fundar duas vilas na sua Capitania: Espírito Santo (depois chamada Vila Velha) e Nossa Senhora da Vitória, nas quais montou engenhos de açúcar e deu outras providências para a continuidade da colonização. Contudo, logo entrou em sérias dissensões com o principal dos sesmeiros, Duarte de Lemos, agravadas por ferozes ataques de índios. Desanimado, transferiu o senhorio a um seu filho e homônimo, que por sua vez o deixou à sua mãe, viúva do primeiro donatário, Luísa Grinalda ou Grimaldi; também esta se retirou logo para a Metrópole, ficando na Donataria o Capitão Miguel de Azeredo. De Vasco Fernandes Coutinho diz o historiador Frei Vicente do Salvador que morreu pobremente em Lisboa, sem “um lençol seu em que o amortalhassem”.

Ilhéus. 

Jorge de Figueiredo Correia não cuidou pessoalmente de sua Capitania, nem o fez um seu filho homônimo; outro filho e herdeiro, Jerônimo Figueiredo de Alarcão, vendeu-a ao antigo sesmeiro Lucas Giraldes, comerciante italiano de Lisboa, cujo filho, Francisco, quinto donatário por ordem de sucessão foi nomeado governador-geral e até chegou a embarcar rumo ao Brasil em 1588, mas aqui não chegou a desembarcar. Sempre administrada por prepostos dos titulares, não obstante progrediu relativamente bem: fornecia farinha de mandioca e gado à capital, sendo também boa produtora de açúcar. Sua principal povoação era São Jorge dos Ilhéus.

Itamaracá.

Embora donatário de três Capitanias, Itamaracá, Santo Amaro e Santana, não cuidou Pêro Lopes de Sousa de nenhuma delas, pois faleceu em naufrágio nas costas africanas. Cabendo à sua viúva Isabel de Gamboa, providenciar a respeito. Nomeou ela para Itamaracá um lugar-tenente, João Gonçalves, que logo entrou em dissensões com Duarte Coelho, donatário de Pernambuco. Progrediu com alguns engenhos de açúcar e teve povoação um tanto florescente, a Vila da Conceição (hoje desaparecida), ao sul da Ilha de Itamaracá, que deu nome à Capitania.

Maranhão (1ª) e (2ª). 

Liga-se a sorte desta Capitania à do Maranhão (2ª) e à do Rio Grande. Associando-se os seus donatários, Aires da Cunha e João de Barros (que recebera também a do Rio Grande) ao donatário da segunda do Maranhão, Fernando Álvares de Andrade, organizaram eles uma expedição de 10 navios e 900 homens, que, sob o comando de Aires da Cunha veio ao Brasil em 1535. Tocou em Pernambuco, onde recebeu auxílio de Duarte Coelho, velejando depois para o Norte; atingindo Aires da Cunha as costas do Rio Grande do Norte, que constituía o seu lote juntamente com João de Barros, encontrou forte oposição dos potiguares, que ali se tinham aliado a franceses contrabandistas de pau-brasil. Resolveu então tentar melhor sorte, dirigindo-se a terras do terceiro sócio, Fernando Álvares de Andrade, mas naufragou e pereceu com toda a tripulação. Em 1554 Luís de Melo da Silva de novo tentou o povoamento do Maranhão, mas fracassou. Abandonada pelos portugueses, nela como na do Rio Grande andaram os franceses a pilhar com desenvoltura, fato que determinou a conquista oficial de ambas as donatarias no século seguinte.

Pernambuco ou Nova Lusitânia.

Duarte Coelho chegou à sua Capitania em março de 1535, ali encontrando uns começos de povoação no Porto dos Marcos e em Igaraçu. Instalou-se primeiramente neste segundo núcleo; depois, procurando local mais aprazível e seguro para se estabelecer definitivamente, atingiu, perto da entrada ou barra do Pernambuco, uma colina a que os índios davam o nome de Marim, ou Mair-i, que significa, segundo Varnhagen, água ou rio dos franceses, e isto indica que foram eles que ali primeiramente se estabeleceram. Desalojando os índios aldeados naquelas terras, no que teria sido auxiliado por um certo Vasco Lucena, português que, como o Caramuru, desde muito vivia entre os selvagens, mandou edificar uma praça forte, capela e outros edifícios, bem assim casario para os colonos. Diz Rocha Pombo: “Com muita solicitude empenhou-se Duarte Coelho em organizar a colônia, instituindo uma ordem perfeita nas duas povoações (a de Marim e a de Igaraçu, onde deixara uma guarnição), e regulando principalmente a vida econômica da Capitania. Todo o seu cuidado consistiu em formar a propriedade agrária, e em prescrever certas regras especiais para as relações entre os moradores. Criou o tombamento das terras, e o registro civil das famílias e dos indivíduos que entrassem na Capitania com ânimo de nela estabelecer-se, e para isso instalando um edifício especial, a cargo do próprio almoxarifado régio, a fim de que as notas e certificados valessem no Reino. Organizou as justiças; proveu à administração local, criando almotacerias, e dando regimentos para todos os serviços, e superintendendo ele próprio, com prudência e discernimento, a tudo quanto interessasse à vitalidade das suas povoações.” Em 1537 a povoação de Marim foi constituída oficialmente em vila, com o nome de Olinda, proveniente, segundo Frei Vicente do Salvador, da exclamação de “um galego, criado de Duarte Coelho, porque, andando com outros por entre o mato, buscando o sítio onde se edificasse, achando este, que é um monte alto, disse com exclamação e alegria: “Ó linda!” . O filólogo Leite de Vasconcelos diz que Olinda provém do árabe 'Al-hind', que apenas significa a espada. Em princípios do século XVI já  havia em Portugal um lugar chamado Olinda, donde certamente se originou o nome da antiga capital pernambucana. Fundada Olinda, progrediu rapidamente a colônia, tomando largo incremento a lavoura e a criação de gado; em poucos anos se desenvolveu a cultura do fumo, do algodão e a indústria do açúcar, artigos desde logo exportados para o Reino e para as outras capitanias. Tendo ampliado o povoamento e praticamente explorado todas as riquezas da Capitania, retornou Duarte Coelho à Europa (morreu em Lisboa, em 1554), deixando aqui como lugar-tenente um seu cunhado, Jerônimo de Albuquerque, e levando todos os filhos, Duarte e Jorge, nascidos já no Brasil. Da Capitania de Pernambuco ou Nova Lusitânia diz Helio Vianna: “Favorecida pela maior proximidade da Europa; possuindo muito pau-brasil nas matas litorâneas e excelentes terras adaptáveis ao cultivo da cana-de-açúcar; beneficiada, acima de tudo, por donatários e povoadores à alma de sua missão de pioneiros, foi a capitania de Pernambuco a mais importante do Brasil, durante o século XVI.” Com efeito, ao findar o século XVI, Pernambuco contava com mais de 60 engenhos e vivia intensamente a importante fase da História do Brasil conhecida por Ciclo do Açúcar.

Porto Seguro. 

O Donatário Pêro do Campo Tourinho era um rico proprietário em Viana e quando veio para o Brasil trouxe todos os seus haveres, a família e muitos colonos. Plantou cana, (construiu engenhos e cortou pau-brasil, contudo, logo entrou em atrito com os colonos, que o prenderam e remeteram a Portugal, sob a acusação de heresia, seu herdeiro, de nome Fernão, passou a Capitania à irmã, Leonor, que a vendeu a D.João de Lencastre, l° Duque de Aveiro. Continuamente atacada pelos aimorés, ali só se pode manter a Vila de Porto Seguro, sede da Donataria e ponto de partida das primeiras entradas que se dirigiram ao sertão brasileiro. Seu último donatário foi D. Pedro Dinis de Lencastre.

Santana.

Pertencente o benefício desta Capitania aos donatários da de Itamaracá, permaneceram suas terras abandonadas até fins do século XVI.

Santo Amaro.

Por estar encravada na de São Vicente, prosperou um pouco esta Capitania, cujos donatários foram os mesmos da de Itamaracá e Santana.

São Tomé.

O Donatário Pêro de Góis, antigo companheiro de Martim Afonso de Sousa e morador de São Vicente, fundou a Vila da Rainha junto ao Rio Managé (atualmente Itabapoana), posteriormente atacada e completamente destruída pelos goitacases. Em 12-5-1548 Luís de Góis, irmão do donatário, escrevia ao Rei D. João III: “Senhor, se com tempo e brevidade V.A. não socorre a estas Capitanias e costas do Brasil, ainda que nós percamos as vidas e fazendas, V.A. perderá a terra... Socorra V. A., e com braço forte, que tudo há mister, e se não mover a terra e os inconvenientes acima ditos, haja V.A. piedade de muitas almas cristãs.” O segundo donatário desta Capitania, Gil de Góis, filho do primeiro, despendeu inúteis esforços para estabelecer nova povoação, em Pargo.

São Vicente.

Embora sem a presença do seu donatário, Martim Afonso de Sousa, e governada por prepostos tomados por sua mulher e procuradora, Ana Pimentel, progrediu consideravelmente, no início, esta Capitania. A partir do engenho de açúcar construído por Martim Afonso quando da expedição colonizadora de 1530-1532 (engenho denominado do Senhor Governador, depois dos Armadores e afinal de São Jorge dos Erasmos, por ter passado à posse de um rico alemão de nome Erasmo Schetz), cresceu a povoação com a montagem de outros engenhos por novos colonos, que iam fundando núcleos de povoamento em vários pontos do litoral e do planalto, entre os quais Todos os Santos, ou simplesmente Santos, fundado por Brás Cubas, antigo companheiro de Martim Afonso e fundador da primeira Casa de Misericórdia do Brasil e talvez da América. Assim descreve Frei Gaspar da Madre de Deus a fundação de Santos: “ ...com esmolas e adjutórios dos confrades, edificou uma igreja com o título de Nossa Senhora da Misericórdia, e junto a ela um hospital com o apelido de Santos, à imitação de outro que, em Lisboa, tinha o mesmo nome. Este título, que somente era próprio do hospital, depressa se comunicou à povoação e, daí por diante, entraram a chamar-lhe Porto de Santos” , e, depois, simplesmente Santos. Seguiram-se-lhe Santo André da Borda do Campo, São Paulo do Campo de Piratininga, Nossa Senhora da Conceição de Itanhaém e Iguape, Ilha Grande de Angra dos Reis, não obstante os continuados ataques dos índios instigados pelos franceses, e os quais ocorreram até cerca de 1570; os guaianases perturbaram diversas vezes a vida de São Paulo, que incorporou os moradores de Santo André; e ante a séria ameaça dos tamoios, Nóbrega e Anchieta tiveram de pacificá-los em Iperoig, hoje Ubatuba. Nos seus primórdios, sofrerá a Capitania um ataque dos espanhóis de Iguape, que chegaram a saquear São Vicente, mas foram afinal repelidos por forças do comando de Pêro de Góis e Francisco Pinto. Posteriormente, também corsários ingleses atacaram os portos vicentinos: Eduardo Fenton, em 1583; Cavendish, entre 1591 e 1592. A Capitania de São Vicente, segundo observa Almeida Prado, “ divergiu desde os seus primórdios das demais do Brasil, pelo fato de dirigir os seus filhos para o interior da colônia, ao invés de medrar na orla costeira dependente do oceano”. Realmente, a descoberta de ouro de lavagem na Capitania, e a crescente importância das bandeiras de caça ao índio fariam, de São Vicente, a entrada principal do Sul, do Oeste e do Centro da Colônia, ainda desconhecidos. Falecendo Martim Afonso de Sousa em 1571, herdou a Capitania seu filho Pêro Lopes de Sousa, que morreu em lutas contra os mouros na Península. O terceiro donatário foi Lopo de Sousa, também herdeiro de Itamaracá, Santo Amaro e Santana.

CAPITANIAS HEREDITÁRIAS NOS SÉCULOS XVII e XVIII

Ao terminar o século XVI existiam no Brasil apenas onze Capitanias Hereditárias: Fernando de Noronha, Itamaracá, Pernambuco ou Nova Lusitânia, Paraguaçu ou Recôncavo da Bahia, Itaparica, Ilhéus, Porto Seguro, Espirito Santo, São Tomé, São Vicente e Santo Amaro, incluindo as terras de Santana,ainda despovoadas. No século XVII dividiu-se o país em dois Estados: o Estado do Brasil propriamente dito, e o Estado do Maranhão, com governo separado. Em ambos esses Estados criaram-se então mais doze Capitanias Hereditárias, assim distribuídas:

No Estado do Brasil

1. Rio Grande (atual Rio Grande do Norte), que até fins do século XVI fora Capitania da Coroa; concedida a Francisco Barreto, que a destinara à sua filha com o título de condado; não se conhece nenhuma providência administrativa tomada pelo donatário.

2. Campos dos Goitacases. Composta de terras antes pertencentes à Capitania de São Tomé, então extinta; dividida em dois lotes, foi concedida a descendentes de Salvador Correia de Sá.

3. Nossa Senhora da Conceição de Itanhaém. Situada ao sul de São Vicente, resultou de uma questão judicial entre os herdeiros de Martim Afonso de Sousa. Primeiramente, teve o seu beneficio a Condessa de Vimieiro, D. Mariana de Sousa da Guerra.

4. Nossa Senhora do Rosário de Paranaguá, resultante da mesma questão judicial, levantada pelo l° Marquês de Cascais, herdeiro das Capitanias de Santana, São Vicente e Itamaracá.

5. Ilha de Santa Catarina, concedida por D. Afonso VI, em 1664, a Agostinho Barbalho Bezerra e da qual também não se conhecem providências administrativas.

6. Rio da Prata, lote na foz do Rio da Prata, para o norte, concedido também a descendentes de Salvador Correia de Sá, sem nenhum resultado prático.

No Estado do Maranhão

1. Cumá ou Cumã, também chamada Tapuitapera e situada nos limites de São Luís; tinha sede na Vila de Alcântara e foi doada a Antônio Coelho de Carvalho.

2. Caeté ou Gurupi, entre os Rios Turiaçu e Caeté, em terras dos atuais estados do Maranhão e Pará, concedida a Álvaro de Sousa.

3. Cametá ou Camutá, situada à margens do Rio Tocantins e doada a Feliciano Coelho de Carvalho.

4. Cabo do Norte, em terras pertencentes ao atual Território Federal do Amapá, concedida, em 1637, a Bento Maciel Parente.

5. Ilha Grande de Joanes ou Marajó, doada a Antônio de Sousa de Macedo.

6. Xingu, à margem direita do rio deste nome, doada por D.Pedro II, em 1685, a Gaspar de Abreu de Freitas, que a destinou ao seu filho Luís; porém, sem nenhum resultado prático.

No século XVIII, por determinação de D. João V e do Marquês de Pombal não mais se concederam Capitanias Hereditárias; e por compra, abandono ou confisco, extinguiram-se as ainda existentes. São Vicente, Santo Amaro e Nossa Senhora do Rosário de Paranaguá, anexas também as terras de Santana, foram adquiridas pela Coroa ao 2º Marquês de Cascais: a transferência, iniciada em 1701) (quando D. João V ali criou a nova Capitania Real de São Paulo e Minas do Ouro), ultimou-se em 1711, mediante o pagamento de 44.000 cruzados ao donatário.

Pernambuco passou ao domínio da Coroa em 1654, por ter o seu quarto e último donatário, Duarte de Albuquerque Coelho, tomado o partido da Espanha, contra Portugal, quando da restauração portuguesa de 1640.

A Capitania do do Espírito Santo passou ao domínio da Coroa em 1718, mediante o pagamento de 40.000 cruzados ao seu ultimo titular, Cosme Rolim de Moura.

Fernando de Noronha reverteu à Coroa no reinado de D. João V, e a Capitania de Porto Seguro foi confiscada ao último Duque de Aveiro, acusado de tentativa de regicídio.

As demais foram adquiridas pela Coroa aos seus respectivos titulares e posteriormente incorporadas a territórios de Capitanias Reais já existentes: Ilha de Joanes, ou Marajó, comprada a Luís de Sousa Macedo, 3º Barão da Ilha Grande de Joanes; Cametá e Cumã ou Tapuitapera, adquiridas ao Donatário Francisco de Albuquerque Coelho de Carvalho; Caeté ou Gurupi, vendida à Coroa pelo Porteiro-Mor Manuel Antônio de Sousa e Melo; Itamaracá e Itaparica, obtidas ao 2º Marquês de Louriçal, descendente dos Marqueses de Cascais; Paraguaçu ou Recôncavo da Bahia, adquirida ao Armeiro-Mor D. José da Costa e Sousa; Ilhéus, obtida de D. Antônio José de Castro; Campos dos Goitacases, adquirida ao 4° Visconde de Asseca; Nossa Senhora da Conceição de Itanhaém, vendida pelo 5° Conde da Ilha do Príncipe.

Texto organizado pelo Departamento Editorial das Edições Melhoramentos com redação de Brasil Bandecchi, Leonardo Arroyo e Ubiratan Rosa em "Novo Dicionário de História do Brasil", Editora Melhoramentos, São Paulo, 1970, excertos pp.135-143. Digitalizado, adaptado e ilustrado por Leopoldo Costa.

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