São Longuinho: O Santo dos Objetos Perdidos e a Tradição dos Três Pulinhos
São Longuinho é uma figura singular no imaginário popular, especialmente no Brasil e em países de tradição católica como Espanha e Portugal. Conhecido como o santo que ajuda a encontrar objetos perdidos, ele é invocado com a célebre frase: "São Longuinho, São Longuinho, se eu achar [o objeto], dou três pulinhos." Mas quem foi esse santo e como surgiu essa curiosa tradição dos pulinhos?
Quem foi São Longuinho?
São Longuinho, ou Longinus, em latim, é tradicionalmente identificado como o soldado romano que perfurou o lado de Jesus Cristo com uma lança durante a crucificação, um evento narrado no Evangelho de João (Jo 19:33-34): "Mas um dos soldados abriu-lhe o lado com uma lança, e imediatamente saiu sangue e água." Esse ato tinha como objetivo confirmar a morte de Jesus, já que os soldados não lhe quebraram as pernas, como era costume com outros crucificados. O nome "Longinus" deriva do termo latino para "lança", o que reforça sua associação com esse instrumento.
A história de Longuinho, embora envolta em lendas e poucos registros históricos concretos, ganhou contornos significativos na tradição cristã. Conta-se que ele sofria de problemas de visão, possivelmente uma cegueira parcial, e que, ao perfurar o corpo de Jesus, gotas de sangue e água respingaram em seus olhos, curando-o milagrosamente. Esse evento é interpretado tanto de forma literal quanto simbólica: fisicamente, ele teria recuperado a visão; espiritualmente, seus "olhos da alma" teriam se aberto para a fé cristã. Impressionado pelo milagre e pelos sinais que acompanharam a morte de Jesus — como o terremoto e a escuridão —, Longuinho teria exclamado, segundo os evangelhos de Mateus (27:54), Marcos (15:39) e Lucas (23:47): "Verdadeiramente, este homem era Filho de Deus." Esse momento marcou sua conversão ao cristianismo.
Após abandonar o exército romano, Longuinho teria fugido para a Capadócia (atual Turquia), onde se dedicou a evangelizar e viver como monge. Sua nova vida, porém, atraiu a atenção das autoridades romanas e dos líderes judaicos, que o consideraram uma ameaça. Preso e martirizado, ele foi torturado — com relatos de que teve os dentes arrancados e a língua cortada — antes de ser decapitado. Sua canonização oficial veio quase mil anos depois, em 999, pelo Papa Silvestre II, embora sua devoção remonte aos primeiros séculos do cristianismo.
A Origem da Fama de "Achador de Coisas Perdidas"
A associação de São Longuinho com a busca por objetos perdidos não tem origem clara nos textos bíblicos ou na doutrina oficial da Igreja Católica, mas emergiu do catolicismo popular. Uma das explicações mais aceitas está ligada à sua suposta baixa estatura. Antes de se converter, Longuinho teria servido na corte romana, onde, por ser pequeno, conseguia enxergar objetos caídos sob as mesas durante banquetes e festas, devolvendo-os aos seus donos. Essa habilidade prática evoluiu, na imaginação popular, para um dom sobrenatural de encontrar o que estava perdido.
Outra teoria remete ao processo de sua canonização. Conta-se que documentos essenciais para sua santificação haviam desaparecido, e o Papa Silvestre II pediu a intercessão do próprio Longuinho para localizá-los. Pouco depois, os papéis foram encontrados, o que reforçou sua fama como auxiliador nas buscas. Essa narrativa, embora lendária, consolidou sua imagem como um santo atento às pequenas necessidades humanas.
A Tradição dos Três Pulinhos
A prática de dar três pulinhos como forma de agradecimento a São Longuinho é um dos aspectos mais intrigantes e encantadores de sua devoção.
Uma das interpretações mais populares sugere que Longuinho tinha dificuldades de locomoção — talvez fosse manco ou tivesse uma perna mais curta. Assim, os três pulinhos seriam uma homenagem simbólica à sua superação física, uma forma de alegrá-lo ao ver os devotos saltarem em seu nome. Outra explicação relaciona o número três à Santíssima Trindade (Pai, Filho e Espírito Santo), um símbolo recorrente no cristianismo que confere um caráter sagrado ao gesto. Há ainda quem veja nos pulinhos uma simples rima fácil com "Longuinho", tornando a promessa cativante e memorável, especialmente entre crianças.
Embora não haja registros oficiais da Igreja que endossem essa prática, ela se enraizou no folclore brasileiro, herdada dos colonizadores portugueses e espanhóis. Em Guararema, no interior de São Paulo, está a única igreja do Brasil dedicada exclusivamente a São Longuinho, a Igreja Nossa Senhora da Escada, onde uma imagem do santo atrai devotos que pagam suas promessas com pulinhos e orações. A tradição é tão forte que, em alguns casos, fiéis relatam dar até mil pulos para agradecer favores maiores.
São Longuinho Hoje
Mais do que um santo histórico, São Longuinho é um símbolo de fé nas pequenas coisas do cotidiano. Sua história — que combina conversão, milagre e martírio — inspira, enquanto a tradição dos três pulinhos reflete a simplicidade e a criatividade da devoção popular. No Brasil, ele transcende o âmbito religioso, tornando-se parte da cultura e do humor, como nas brincadeiras sobre "dar pulinhos" em situações inusitadas.
Seja por sua lança, que tocou o coração de Cristo, seja por sua fama de encontrar o que foi perdido, São Longuinho permanece vivo na memória coletiva. Então, da próxima vez que você perder algo, experimente chamá-lo. E, se encontrar, não se esqueça: três pulinhos podem ser o pagamento perfeito para um santo que, mesmo mancando, nunca deixa de ajudar.
Postado no site Quora. Adaptado e ilustrado para ser publicado por Leopoldo Costa
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