4.08.2011

HISTÓRIA DA CRIAÇÃO DE GADO NA BAHIA


Leopoldo Costa 













O Recôncavo Baiano foi explorado inicialmente em 1501, pelo navegador florentino Américo Vespúcio (1454-1512). Durante bastante tempo foi apenas onde existia um porto para o embarque de pau brasil.
O território ocupado pela Bahia correspondia as capitanias da Bahia, de Porto Seguro e de Ilhéus.

A capitania da Bahia foi doada a Francisco Pereira Coutinho (m.1549), Porto Seguro foi doado a Vasco Fernandes Coutinho (1490-1561) e a de Ilhéus doado a Jorge Figueiredo Corrêa.
Em 1549 a capitania da Bahia foi retomada pela coroa, comprada do donatário.
Escreveu frei Vicente do Salvador (1564-1635) no livro ‘História do Brasil’ de 1627 sobre a capitania de Porto Seguro: ‘ (...) Esta capitania foi a primeira terra do Brasil que se descobriu por Pedro Álvares Cabral indo para a Índia, como está dito no primeiro capítulo do primeiro livro, e dela fez el-rei mercê, e doação de 50 léguas de terra na forma das mais a Pedro do Campo Tourinho, natural de Viana, muito visto na arte de marear, o qual armando uma frota de muitos navios à sua custa, com sua mulher e filhos, e alguns parentes, e muitos amigos, partiu de Viana, e desembarcou no rio de Porto Seguro, que está em 16º, e dois terços, e se fortificou no mesmo lugar onde agora é a vila, cabeça desta capitania: edificou mais a vila de Santa Cruz, e outra de Santo Amaro, onde esta uma ermida de Nossa Senhora da Ajuda em um monte mui alto, e no meio dele, no caminho pelo qual se sobe, uma fonte de água milagrosa, assim nos efeitos, que Deus obra por meio dela, dando saúde aos enfermos, que a bebem, como na origem, que subitamente a deu o Senhor ali pela oração de um religioso da companhia, segundo me disse como testemunha de vista, e bem qualificada, um neto do dito Pedro do Campo Tourinho, e do seu próprio nome, meu condiscípulo no estudo das Artes e Teologia, e depois Deão da Sé desta Bahia, o qual depois da morte de seu avô, se veio a viver com sua avó e mãe, por sua mãe Leonor do Campo, com licença de Sua Majestade, vender a capitania a d. João de Lencastre, primeiro duque de Aveiro, por 100 mil-réis de juro, o qual mandou logo capitão que a governasse em seu nome, e fizesse um Engenho à sua custa, e desse ordem a se fazerem outros, como se fizeram, posto que depois se foram desfazendo todos, assim por falta de bois, que não cria esta terra gado vaccum, por causa de certa erva do pasto, que o mata, como por os muitos assaltos do gentio Aimoré, em que lhe matavam os escravos, pelo que também despovoaram muitos moradores, e se passaram para outras capitanias (...).’
TOMÉ DE SOUZA E A FUNDAÇÃO DE SALVADOR


A colonização da Bahia começou em 1548, quando foi criado o governo geral do Brasil e nomeado o primeiro governador Tomé de Souza (1503-1579). A comitiva de Tomé de Souza saiu de Portugal em 1º de fevereiro de 1549 e chegou à Bahia em 29 de março de 1549. Ele fundou a cidade de Salvador. Quando chegou à Bahia, um dos primeiros atos foi à expulsão dos índios do litoral, a plantação de cana de açúcar e a construção de engenhos. A dificuldade maior era conseguir mão de obra para as tarefas de trabalhar a terra e tocar os engenhos. A alternativa foi autorizar a preação dos índios. Existem registros, que o tesoureiro Gonçalo Ferreira, recebeu ordem do governador para adquirir bois a serem usados nas obras de edificação da cidade de Salvador. Reportam que os primeiros exemplares adquiridos pelo tesoureiro teriam vindo do Pernambuco. Tomé de Souza mais tarde, solicitou ao rei de Portugal João III (1502-1557) e recebeu a caravela ‘Galga’, apenas para o transporte de gado bovino para a Colônia. A 'Galga' foi autorizada a fazer várias viagens a Cabo Verde e ao arquipélago de Açores, trazendo muitas cabeças de gado, que desembarcaram em Salvador.  Vieram de Portugal também alguns carpinteiros especialistas na confecção de carros de bois e carreiros práticos, para ensinar aos colonos, como usar os carros de bois. Em meados da década e 1550, segundo os cronistas da época, já se podia ouvir o ranger de carros de bois nas ruas da nascente cidade de Salvador. Os carros de bois foram daí até o advento das estradas de ferro, o meio de transporte mais importante do interior do Brasil. A cidade prosperou,em 1600, o jesuíta Fernão Cardim (1549-1625) relatava que a população de Salvador era composta de 3.000 brancos de origem portuguesa, 4.000 escravos africanos negros e 8.000 indígenas.

GARCIA D’ÁVILA E A CASA DA TORRE

Acompanhando a comitiva composta de mais de 1.000 pessoas, na maioria degredados, seis jesuítas e quatro padres seculares, trouxe Tomé de Souza o filho Garcia d’Ávila que foi gratificado com o cargo de feitor e almoxarife-mor. Era um cargo sem provento fixo e o primeiro pagamento que recebeu foram quatro vacas. No dia 6 de dezembro de 1551, vindas de Cabo Verde chegaram algumas dezenas de bois e vacas que foram distribuídas entre a população local. Garcia d’Ávila oficialmente recebeu mais duas vacas e um touro e não se sabe como, um ano depois já dispunha de um rebanho de 200 cabeças de gado. Garcia amancebou-se com uma índia Tupinambá que ganhou o nome de Francisca Rodrigues, com quem teve muitos filhos. Deixou o cargo no governo e Tomé de Souza concedeu-lhe sua primeira sesmaria que media duas léguas de frente para o mar, que ia do rio Vermelho até Itapuã. Nessa sesmaria ele construiu um castelo como moradia e por isto as suas propriedades ficaram conhecidas como as da ‘Casa da Torre. ’ Em 1555 os Tupinambás atacaram as fazendas, matando alguns empregados. Quando tinha 40 anos, era um dos homens mais ricos do Brasil. Só a beira mar, era proprietário de uma faixa litorânea, praticamente sem limite para o interior, que ia do rio Vermelho (em Salvador), até o rio Real (em Sergipe). Chegou a possuir uma área de 800.000 quilômetros quadrados de fazendas, uma área maior do que a soma das superfícies da França e do Reino Unido. Com a ajuda da família e de alguns companheiros, como Domingos Afonso Sertão, penetrou o sertão até atingir às margens do rio São Francisco. Principalmente por ser filho do governador foi conseguindo outras sesmarias que chegaram a medir 250 léguas (1.650 km) de costado no rio São Francisco e outras, como a de 70 léguas (462 km) ás margens do rio Parnaíba. Em cada ponto que julgasse interessante pelas aguadas e pastagens, quase sempre às margens de um curso d’água, ele deixava um casal de índios civilizados, algumas vacas, um touro e um casal de equinos. Construía uma choupana de pau a pique e já estava instalado um novo curral de criação. Como não tinha gado suficiente para povoar todas as propriedades, arrendava parte delas a outros criadores que pagavam 10 mil réis por ano por cada légua.

A EXPLORAÇÃO DO INTERIOR

Martim Carvalho realizou uma expedição em 1567 ou 1568, com cerca de 60 homens brancos e vários índios escravizados e durante oito meses percorreu 220 léguas, vindo a atingir a região ribeirinha do rio Jequitinhonha. A sua aventura foi importante para o conhecimento do interior e muitos seguiram o seu trajeto estabelecendo fazendas de criação. Durante seu regresso levou muitos índios para escravizar.

Em 1561, Vasco Rodrigues Caldas, que tinha sido vereador em Salvador, oferece-se ao então governador Mém de Sá (1500-1572) para penetrar nos sertões baianos em busca de metais preciosos em troca de uma comissão sobre o que fosse encontrado. Formou uma bandeira com 100 companheiros e depois de distanciar entre 70 ou 100 léguas do litoral, atingiu o vale do rio Paraguaçu. Neste local foi atacado pelos índios Tupinaés que obrigou o retorno da expedição. Até atingir o vale foi demarcando algumas áreas onde mais tarde construíram vários currais de criação.

A criação de gado levou a colonização para o interior e mostrou outro importante fato da historia baiana. E a existência de sal um detalhe importante.

Do sul da Bahia rumo ao vale do rio Jequitinhonha e de Salvador rumo ao rio São Francisco, partiram várias expedições de conquista e de exploração.
Uma foi a de Gabriel Soares de Souza (1540-1591), outra a de Belchior Dias Moréia, neto de Caramuru. Gabriel Soares de Souza, como bom cronista que era, informava ao governador sobre a pujança da criação de gado nos locais onde tinha trilhado e o numero de currais. Foi o autor do ‘Tratado Descritivo do Brasil de 1587. ’
O rei João I em 1728, numa ordem enviada a Vasco Cesar Fernandes de Menezes mandou que ele providenciasse a conquista dos índios da região sul da Bahia: ‘ (...) se o vio o que escreveste em carta de 12 de agosto do anno passado que sendo vós informado por pessoas práticas e zelosas de meu serviço de que a grande porção de terra que há no certão dessa capitania, desde as Minas do Rio de Contas athe o rio Pardo, rio Verde e cabeceiras do S. Matheus erão as melhores que tinhão todo o Brasil assim para a creação de gado como para a cultura de qualquer lavoura, achando-se vários roteyros e paulistas que affirmavão haverem aly minas riquíssimas de ouro e pedras preciosas (…)’
Na região de rio das Contas a criação de gado pôde prosperar porque estava a margem da estrada que ligava Salvador às Minas Gerais. Havia um comércio grande não só de gado, como também de outros gêneros alimentícios. Alguns negociantes da região ficavam a espera de ofertas de gado barato, pertencentes a aqueles que por falta de água e de alimentos, sabiam que não conseguiriam fazer chegar o gado até a área da mineração e ali os vendiam a qualquer preço.
Caio de Prado Jr.[1] escreveu ‘A amplitude do comércio da carne pode ser avaliada por este desfilar ininterrupto de boiadas que perambulam pela colônia e que os viajantes de princípio do século passado assinalam a cada passo em seus diários. Mais de 20.000 bois, chegados de um sertão remoto, eram consumidos anualmente só na cidade da Bahia. (...)
MANUEL NUNES VIANA

Manuel Nunes Viana, filho de Antonio Nunes Viana, chegou à Bahia no final do século XVII. Muito jovem dedicou-se ao comércio e muito velhaco, foi hostilizado por alguns vizinhos e para não ser morto decidiu abandonar tudo e sair pelos sertões. Depois, de viver aprisionando índios, obteve uma sesmaria a margem do rio São Francisco, onde se dedicou a criar gado. Mais tarde conseguiu outras sesmarias, que transformou em grandes fazendas de criação, chegando a monopolizar o abastecimento de gado para a região das Minas. Graças a amizade com o secretário particular do governador Artur de Sá, foi nomeado superintendente das Minas do Ribeirão do Carmo. Transformou-se também em minerador, explorando lavras no Caeté e nas Catas Altas, em sociedade com o seu primo Manuel Rodrigues Soares. Adquiriu vasta fortuna, mais fazendas e poder no território mineiro. Nestas fazendas passou a criar bastante gado. Mais tarde, entre 1715 e 1718, dedicou-se a conquistas no Rio Grande do Sul, sendo obrigado a viajar a Portugal entre 1725 a 1728, convocado pela corte, em razão das muitas acusações sobre o seu procedimento, entre as quais a de liderar os residentes na região mineira contra o fisco português, o que veio a dar origem a Guerra dos Emboabas. Em Lisboa conseguiu provar sua inocência e voltando ao Brasil, prestigiado, chegou a exercer o oficio de escrivão da ouvidoria do Rio das Velhas. Faleceu na Bahia em 1738, deixando longa descendência e uma grande fortuna.

BENTO MACIEL PARENTE

Bento Maciel Parente (1567-1642), explorador português, que antes tinha participado das conquistas da Paraíba e do Rio Grande do Norte, nos princípios do século XVII, fez uma expedição que penetrou 80 léguas pelo sertão da Bahia em busca das minas de sal e de salitre para oferecer ao gado. Encontrou-as em grande quantidade na região entre o rio São Francisco e o rio Salitre. Em 1615, participou de outra expedição formada para expulsar os franceses do Maranhão e em 1623/1626 ajudou a expulsar os holandeses. Providenciou o povoamento da capitania com homens e gado. Como recompensa pelos serviços prestados, recebeu da coroa em 1637, a capitania do Cabo Norte. Mais tarde, na invasão dos holandeses ao Maranhão foi preso como refém e enviado para o Recife. Faleceu durante a viagem.

DOMINGOS AFONSO SERTÃO

O sertanista Domingos Afonso Sertão ou Domingos Afonso Mafrense veio para o Brasil em 1670, e em 1674 já tinha obtido diversas sesmarias do sul da Bahia. Como arrendador da Casa da Torre, desbravou grandes áreas ao oeste do rio São Francisco. Em 1691 foi designado tesoureiro-geral do Estado, por provisão do governador-geral. Destacou-se também com a preação de índios, o que fazia com muita violência, e por isto foi acusado sendo instaurado por ordem regia em 1699, um inquérito no qual conseguiu ser inocentado. As propriedades de Domingos Afonso Sertão, tinham o sistema de trabalho diferente. Os arrendadores e vaqueiros iam instalando as fazendas, e à medida que o gado necessitava de novas pastagens, podiam ir avançando e devassando outras áreas. Estabeleceu-se numa propriedade que denominou Sobradinho, ao sul de Juazeiro e daí saiu para conquistar os índios Gurguéias. Quando comandava sua expedição em direção a serra dos Dois Irmãos, encontrou com Domingos Jorge Velho (1614-1703), e juntos iniciaram o desbravamento do Piauí.

DOMINGOS JORGE VELHO

Domingos Jorge Velho, inicialmente dedicava a preação de índios no Nordeste. Após o desbravamento do Piauí, alcançou também o Ceará e Paraíba. Nessas jornadas continuou submetendo os indígenas. Entre 1680 e 1684, fixou-se na região do rio Piranhas, na Paraíba, organizando ali uma grande expedição destinada a combater a Casa da Torre e exterminar o Quilombo dos Palmares. Em 1699 foi nomeado chefe de uma expedição que tinha como objetivo também subjugar indígenas no Maranhão, Ceará e Pernambuco e pelos bons serviços prestados, recebeu a patente de mestre de campo. Faleceu em Piancó, na Paraíba por volta de 1703.

ANTONIO GUEDES DE BRITO

Antônio Guedes de Brito, nascido na Bahia em 1627 e falecido em Minas Gerais em 1694, foi um pioneiro. Em 1650, organizou uma bandeira que percorreu a região de Jacobina, explorando os sertões do Morro do Chapéu. Foi dono de um grande latifúndio, que se estendia até o rio das Velhas, que ficou conhecido como Casa da Ponte. Suas propriedades tinham 150 léguas (833 km) de frente. Teve até cargo público. Com o falecimento do governador Afonso Furtado de Mendonça (1610-1675), integrou como juiz ordinário, uma junta que governou interinamente o Brasil de 1675 a 1678. A expansão dos currais de criação de gado foi facilitada pela abertura do caminho, feito por João Velho do Vale em fins do século XVII, que ligava pelo interior, a cidade de Salvador com o Ceará, o Maranhão e o Grão-Pará.

MATIAS CARDOSO

Matias Cardoso, antes tinha sido capitão-mor adjunto do governador das esmeraldas Fernão Dias Pais (1608-1681). Acompanhou-o a Minas Gerais, onde ficou até 1680. Em 1684, foi nomeado governador e administrador de todas as aldeias indígenas desde a capitania de Porto Seguro até a foz do rio São Francisco, onde estabeleceu vários currais. Matias Cardoso fundou o arraial de Morrinhos, centro de grandes fazendas de gado, algumas exploradas pelo seu filho, Januário Cardoso.

ANTONIO GONÇALVES FIGUEIRA

Antônio Gonçalves Figueira, que também fez parte da bandeira de Fernão Dias Pais (1608-1681) a Sabarabuçu em 1689, acompanhou Matias Cardoso de Almeida à Bahia. Retirou-se em 1694 para a região do rio São Francisco, erguendo o primeiro engenho de açúcar da região, no lugar denominado Brejo Grande. Em 1715, abriu caminho até a vila de Pitangui, nas Minas Gerais, para comercializar o gado que criava nas fazendas da Bahia. Próximos de Antônio Gonçalves Figueira fixaram-se seu pai, seus irmãos e cunhados. Todos tiveram grandes propriedades às margens do rio Verde Grande.

A CONJURAÇÃO BAIANA


Em 1798, ocorreu na região a ‘Conjuração Baiana’ também conhecida como ‘Revolta dos Alfaiates’ que propunha a independência da República Baianense, a igualdade racial, o fim da escravidão e o livre comércio. Teve a participação de escravos, negros alforriados, alfaiates e outros artesãos da Bahia, que divulgaram um manifesto conclamando o povo para um levante. O movimento foi delatado e reprimido, os líderes foram condenados à morte e outros ao exílio.

FEIRA DE SANTANA

O transporte das boiadas que abasteciam Salvador era feito através dos caminhos que margeavam o rio São Francisco, proveniente das fazendas de criação do interior da Bahia, de Goiás, de Pernambuco, do Piauí e de Sergipe e chegavam ao mercado de Feira de Santana.

A rota dos bois que entravam na Bahia, vindo de Goiás após atravessarem o São Francisco, tinha como primeiro destino a feira de gado da vila da Barra do São Francisco, que depois encaminhava os animais ao mercado de Salvador, após o Registro em Feira de Santana. A importância da vila da Barra do São Francisco como mercado de gado, e do Morro do Chapéu como local de descanso e pastagem, durante a viagem dos rebanhos até Feira de Santana, levou o governo provincial em 1858, a construção de uma nova estrada que ligava as duas feiras. O gado passava pelas feiras de Cachoeira, de Santo Amaro da Purificação, de Capoame e de São João da Mata. A feira de Capoame durante o século XVIII foi a mais importante feira de gado da Bahia e de todo o Nordeste.

A Feira de Santana, em meados do século XIX, era o destino mais importante para todo o gado que vinha da região do rio São Francisco para Salvador, qualquer que fosse a origem; substituindo a famosa feira do Capoame.
Os Registros de gado baianos, no século XIX, eram organizados e administrados pelo governo da província. Visavam à cobrança do imposto e o controle da quantidade de gado bovino, que atravessava o sertão em direção à Salvador. No início do século XIX, o imposto por cabeça de gado registrado no livro de receitas e despesas foi estabelecido em $100, que deveriam ser recolhidos no Registro e encaminhados à Câmara Municipal de Salvador e, posteriormente, destinados aos reparos dos currais e recuperação das estradas.

Das boiadas que saíam da vila da Barra do São Francisco, muitas cabeças ficavam pelo caminho, morrendo de cansaço, de sede, ou era destinado à própria alimentação dos condutores, o que era chamado de “matalotagem”.
Os bois só tinham o preço estabelecido na chegada ao Registro de Feira de Santana.

Ao longo do percurso até Salvador, os negociantes de gado mantinham propriedades e iam até Feira de Santana comprar os animais antes de serem registrados. Essas propriedades chamadas “invernadas”, geralmente possuíam grandes áreas de pastagem. Esses donos de invernadas, também eram chamados de “marchantes”,

Descansavam os bois durante algumas semanas, deixando-os pastar nas invernadas, para ganharem peso e serem registrados, alcançando um lucro muito maior para os que os que os compraram no sertão. Alguns condutores preferiam vender o gado magro e cansado, antes de ser pesado e registrado, quando deveriam aceitar o preço fixo que o governo estabelecia.
Os marchantes que partiam com seu gado de Feira de Santana seguiam em direção à Salvador passando antes por Cachoeira e Santo Amaro da Purificação, margeando a baía de Todos os Santos, até entrar em Salvador pelas planícies do Cabrito e Pirajá, em direção ao Tanque do Engenho da Conceição, hoje conhecido como Largo do Tanque, e daí em direção à Fortaleza do Barbalho, até findar nas Hortas de São Bento, onde se localizava o mais antigo matadouro de Salvador.

A Estrada das Boiadas só recebeu atenção especial do governo em meados do século XIX, quando foram iniciados os melhoramentos com a finalidade de facilitar o trânsito para as boiadas que vinha do sertão. Era por este caminho, que as grandes boiadas chegadas de Feira de Santana e entravam na capital baiana.

Eram nos Currais do Conselho, onde os animais eram recebidos e recontados e esperavam o descanso mínimo de oito dias, para então seguir para o Matadouro Público, onde eram abatidos, e as carnes comercializadas. Os pastos e currais do Conselho localizavam nas localidades do Cabrito e Pirajá e no entorno da baía de Todos os Santos.

Existiram outros Registros de gado entre Feira de Santana e Salvador. Na década de 1830, a antiga feira do Capoame também foi transformada em Registro.
Escreveu Rollie E. Poppino[2]:'Durante algum tempo a mais importante [das feiras] foi a de Nazaré, ao sul da baia de Todos os Santos. Por essa época, só na Cidade do Salvador consumia-se uma média de mais de vinte mil cabeças de gado, anualmente. Uma grande parte provinha da feira de Nazaré. Os animais vendidos em Nazaré para consumo na Capital teriam que fazer o percurso em pequenas embarcações, ou dar a volta em toda a baia. Isso acarretava despesas e inconvenientes e os fazendeiros do interior passaram a enviar o gado, cada vez em maior número, para o mercado de Feira de Santana. (...) Feira de Santana foi escolhida para feira do gado por três razões importantes. Primeiro, porque estava situada rio caminho mais direto entre o Recôncavo e as imensas pastagens do Mundo Novo, Jacobina e do médio São Francisco. Em segundo lugar, porque o povoado estava rodeado de excelentes pastagens naturais. A terceira razão, de vital importância para uma zona sujeita à secas periódicas, é que a região era atravessada por dois rios e por numerosos riachos. Salvo nos períodos de seca prolongada, o suprimento de água dessa área bastava para milhares de cabeças de gado'.

REVOLTA DA CARNE SEM OSSO, FARINHA SEM CAROÇO.

Em 1858, a carestia da carne verde e da farinha causou em Salvador uma revolta popular que ficou conhecida como ‘Revolta da Carne sem Osso, Farinha sem Caroço’. Tudo começou quando a Câmara estabeleceu uma ‘postura’ em que determinava que a farinha de mandioca só pudesse ser vendida nas ‘tulhas’ principalmente as instaladas no Celeiro Público. Inicialmente o presidente João Lins Vieira Cansação de Sinimbu (1810-1906) concordou e a lei entrou em vigor no começo de 1857. Por pressão dos comerciantes em abril do mesmo ano suspendeu a lei exigindo que para vigorar ela tivesse que ser examinada e aprovada pela Assembleia Provincial. Foi enviada para a Assembleia que não tomou decisão e em janeiro de 1858 a medida foi reeditada pelos vereadores, que acusaram o presidente Sinimbu de estar mancomunado com os comerciantes que tinham o monopólio da venda dos gêneros alimentícios. No dia 28 de fevereiro explodiu uma manifestação de rua que foi iniciada pelos gritos das jovens recolhidas da Santa Casa que protestavam contra algumas medidas tomadas pelas superioras. Alguns homens acudiram aos gritos e para proteger as moças invadiram a Santa Casa e brigaram por elas. As superioras se refugiaram no Palácio de Governo. Convocada pelo toque dos sinos, uma multidão se reuniu na praça e a manifestação fugiu do principal objetivo e se transformou numa reação contra a carestia. Depois que saíram da Santa Casa,  os manifestantes invadiram também a Câmara Municipal. A polícia e o Exército foram chamados e reprimiram a multidão. O Palácio foi apedrejado e um oficial foi ferido. No final da noite a revolta foi controlada.

O MATADOURO PÚBLICO DE SALVADOR

Remontam-se ao século XVIII as primeiras referências sobre o matadouro público de Salvador que era localizado na área contígua ao mosteiro de São Bento, denominada de Hortas de São Bento. No ano de 1757 os currais do matadouro localizavam-se na praça da Piedade. Em vários espaços próximos às Hortas de São Bento, existiram outros currais menores onde o gado esperava o abate. Existem referências a currais na praça da Piedade, nos Barris, nos campos do Barbalho e no largo do Campo Grande.

Durante o século XVIII, e até o início do século XIX, foi ali que funcionou o matadouro público que recebia gado proveniente da Feira do Capoame e de Feira de Santana. 

O matadouro com seus problemas começaram a incomodar a população. Os dejetos, as vísceras e as carcaças impróprias para o consumo eram descartados no córrego chamado de rio das Tripas, produzindo mau cheiro e presença de urubus e ratos.

Foi proposta a construção de um novo matadouro. O terreno ideal para as instalações seria o Engenho Retiro, nas imediações da Fazenda da Campina, porém, dificuldades de ordem judicial, envolvendo disputas por herança daquelas terras, impediram a efetiva compra das terras do Engenho Retiro. Diante deste impasse a solução foi transferir o matadouro público para os campos do Barbalho, na freguesia de Santo Antônio Além do Carmo.  O Barbalho tinha conexão direta com a Estrada das Boiadas. Uma grande área ocupada pelo curral do matadouro era conhecida como Currais de São José onde as reses aguardavam o abate. As instalações dos currais eram amplas, pois semanalmente abatia-se uma média entre 400 e 500 animais. No prédio principal, o piso da sala de abates era coberto por ladrilhos o que facilitava a higienização. Na época em que o Matadouro Público funcionou no Barbalho, foi criada a Superintendência do Matadouro Público da Bahia, em 1866, aumentando o alcance da administração pública do abastecimento de carne verde, aos consumidores. Em 1866, alguns criadores de gado fizeram chegar ao  conhecimento do presidente da província, um abaixo assinado, onde reclamavam da demora com que seus animais ficavam nos pastos do Conselho e argumentavam ser essa, a causa de prejuízos à qualidade das carnes, uma vez que a permanência naqueles pastos, por um período superior ao estabelecido fazia com que se acumulassem animais de várias origens, de diferentes procedências que poderiam ser contaminados por doenças. A mudança do matadouro para Barbalho dinamizou o crescimento de Salvador em direção àquela área, em um movimento muito parecido com o que tinha acontecido no centro de Salvador, enquanto o matadouro estava instalado nas Hortas de São Bento. Nas ruas próximas instalaram-se muitos açougues e casas de negócios que se dedicavam a ao comércio de produtos derivados do abate. Em 1849 foi efetuado o alargamento, limpeza e cobertura do rio das Tripas, que foi concluído em 1862. A via pública construída sobre o rio foi denominada rua da Vala. Existiram outros matadouros em Salvador, embora a superintendência do matadouro público da Bahia, a partir de 1866, fosse o órgão central na distribuição do gado para o abate em outros matadouros da cidade. O poder público permitia a existência de matadouros em freguesias rurais, como na povoação do Rio Vermelho, em Brotas e Itapagipe. Na verdade, a existência desses matadouros espalhados pelas freguesias periféricas datava do século XVII, situados no final de outros caminhos de gado, abertos por latifundiários da Casa da Torre de Garcia d’Ávila, que chegavam com seu gado pela direção de Itapuã, depois para o Cabula até as Hortas de São Bento.

Em 23 de abril de 1869 o governo provincial acabou com a superintendência do Matadouro Público do Barbalho, porém, o matadouro manteve as suas atividades diárias de matança de bois até o ano de 1873 e um novo Matadouro Público foi instalado no Engenho Retiro, onde permaneceu até meados do século XX.

Escreveu Rodrigo Freitas Lopes, na sua dissertação para Mestrado em História pela Universidade Federal da Bahia publicado em 2009 ‘Nos Currais do Matadouro Público: O Abastecimento de Carne Verde em Salvador no Século XIX(1830-1873)’: ‘A partir de 1867, um ano após a criação da Superintendência do Matadouro Público da Bahia, problemas administrativos e de salubridade, tornaram a administração do Superintendente João Luís Soares Martins cada vez mais difícil. As queixas frequentes dos criadores tornaram o relacionamento da Superintendência com os poderes públicos, delicado. Por conta disso, a Presidência da Província, responsável direta pela escolha do Superintendente do Matadouro, recebeu críticas de membros da Câmara Municipal, devido á falta de medidas enérgicas contra os ditames do Superintendente. Em 22 de julho de 1868, o Presidente da Província, José Nascentes de Azambuja, baixara um Regulamento complementar ao de 1866, estabelecendo que os talhos da capital ficassem única e exclusivamente sob responsabilidade dos agentes de gado, o que na prática, significava facilitar a ação dos monopolistas, visto que tirava dos cidadãos comuns, a possibilidade de venderem carne e estimular a concorrência pelo menor preço. Essa atitude do Presidente da Província foi ratificada pelo Superintendente do Matadouro público, e não se pode esquecer que este cargo era designado diretamente pelo Presidente da Província, sendo de sua inteira confiança, haja vista a quantidade de correspondências trocadas diretamente entre as duas repartições’.
NO SÉCULO XIX

No Relatório Anual da Presidência da Província de 1823 está registrado o seguinte: '(...) Proteger a Agricultura seria ainda em tempos de ventura e de paz um sagrado dever do Conselho. No estado de bloqueio, em que se achou a Bahia, depois que se ligou á grande causa brasílica, cumpria favorecer a criação, e cultura dos víveres tanto mais, quanto progressivamente se aumentava no Recôncavo o número de consumidores e se depauperava a útil classe dos produtores: aqueles pela vinda de expedições do Rio de Janeiro, Pernambuco e Paraíba: e pelo uso geral da carne verde, e farinha do interior, atenta a falta de carne seca para a sustentação dos escravos, e farinha importada pela barra da cidade, que nos era vedada (...).
No ano civil de 1847/1848[3] a Bahia exportou 91.218 couros.
45.040 deles foram para Genova, 19.485 para Portugal, 7.015 para a França, 6.069 para Hamburgo/Altona e o restante para 10 outros destinos.

No ano civil de 1848/1849 a Bahia exportou 82.866 couros.
26.409 deles foram para Genova, 12.526 para Portugal, 10.273 para a França, 12.046 para os Estados Unidos, 5.829 para Liverpool e o restante para nove outros destinos.

Antonil estima que em 1700, existisse na Bahia um rebanho bovino de mais de 500.000 cabeças. Considerando as exportações de couros no período 1852/1854[4], concluímos que os abates foram de 59.000 cabeças, com um rebanho estimado em 650.000 cabeças. Em 150 anos um crescimento de 30%.

No Relatório Anual da Presidência da Província de 1854 o presidente da província pediu verbas para a construção de um novo matadouro público. (...) Está reconhecido que a carestia da carne verde quase sempre provem dos açougues por que o matadouro pouco vezes sai ela por preço superior a 3$200 rs.

Escreveu o presidente da província no seu Relatório Anual da Presidência para o ano de 1856:
(...) Em falta de melhores dados para demonstrar a quantidade de gado consumida na província, já vos fiz ver, que durante os três últimos anos financeiros a exportação de couros foi sempre em diminuição: não se tendo criado indústria interna, que desse aplicação a essa matéria, devemos tomar tal diminuição, como decrescimento real na criação do gado, que a vista do progresso natural da população e do consumo, que se aumentou com a abastança dos homens, que se passaram para o trabalho das lavras diamantinas, produziu o fato, de que nos ocupamos, fato, que infelizmente tende a agravar-se ainda mais pelo que observamos em outras províncias. Assim, por exemplo, a do Pará, que dantes se supria com as suas numerosas fazendas de Marajó, cuida de penetrar no interior do Piauí e até na de Goiás, afim de procurar carnes para seu consumo; a província do Rio de Janeiro, não podendo mais ser abastecida pelos charques do Rio Grande do Sul e dos estados do Rio da Prata, vai já até o interior do Mato Grosso procurar esse suprimento. Ora, dessa concorrência geral não é possível que os efeitos deixem de pesar sobre nós, visto como também das províncias de Piauí e Mato Grosso tiramos parte do nosso suprimento de carnes verdes (...)'.
E num outro trecho também registrou:
'(...) Uma das dificuldades que muito nos ameaçaram durante a epidemia colérica foi a falta de carne verde e farinha, gêneros de que a nossa população faz o seu ordinário alimento, aumentando-se o receio de uma fome, por se dar também nessa época falta de carne seca, e ser o peixe e o bacalhau geralmente repelidos como nocivos a saúde, além de ser o pior o suprimento do último, que em sua maior parte achava-se deteriorado. Sofrendo esta capital os rigores da epidemia todos fugiam de aproximar-lhe e, pois os lavradores, criadores, e negociantes principiavam a encurtar suas relações, começando logo a sentir-se a falta da farinha, com o seu encarecimento e a do gado pelas escassas remesas, que não chegavam para o abastecimento do mercado. (...)
Em 1858[5], baseando na arrecadação do imposto de 2$500 rs. sobre cada rês abatida para consumo (foi arrecadado 75:590$000) foram abatidos 30.236 animais. 81% foram na capital, 6% em Cachoeira, 4% em Nazaré e também em São Felix e o restante 5% nos demais municípios.

No Relatório da Presidência da Província de 1862, temos os seguintes dados:

Ano Civil
Exportação
Importação
1854/1855
11.722:000
13.400:000
1855/1856
12.860:000
14.264:000
1856/1857
17.863:000
14.264:000
1857/1858
13.419:000
20.780:000
1858/1859
15.465:000
20.484:000
1859/1860
10.822:000
17.140:000
1860/1861
8.423:000
14.347:000

 (...) Os principais produtos que figuram na exportação são: o açúcar, fumo e diamantes; mas não deixam de ter tomado algum desenvolvimento o café, cacau e outros (...). '

Em 1865[6], pelo mesmo critério foram arrecadados 97:053$000 o abate foi de 38.821 cabeças.

No mesmo Relatório está registrado que a exportação de Couros no período de 1857 a 1860 foi a seguinte:
1857/1858        25.036 arrobas
1858/1859        73.916 arrobas
1859/1860        79.279 arrobas

Em 1866[7], o presidente da província Manuel Pinto de Souza Dantas (1831-1894), também conhecido como Senador Dantas, preocupado com ‘o clamor que de todas as partes se levanta contra o mercado de carnes verdes nesta capital, sendo notável que os queixumes dos consumidores não seja menor que o dos produtores. Está na intuição pública à existência de uma causa, que determina tais efeitos em assunto de interesse para todos, e que, entretanto não se há removido’, resolveu criar uma comissão que desse um parecer sobre o assunto.
A comissão de alto nível era composta pelo conselheiro João José de Oliveira Junqueira Junior (1832-1886), Dr. Demétrio Ciríaco Tourinho[8] (1826-1888), Antonio Telles da Silva Lobo, José Pereira da Silva Reis e João Gabriel de Gouveia. Depois de um período de pesquisa e estudo a comissão chegou a seguinte conclusão:
  • As regiões que remetem gado para a capital eram o vale do rio São Francisco, e as comarcas de Feira de Santana, Geremoabo e Monte Santo na própria província, que não preenchiam a demanda. Tinha que ser complementado com importações do Piauí e Goiás e até de Minas Gerais e Pernambuco. O gado importado de Minas Gerais e de Goiás ficava certo tempo em pastagens no Morro do Chapéu, Jacobina e Vila Nova da Rainha para recuperação.
  • A distância percorrida por estas boiadas variava entre 85 léguas[9] (561 km) e 220 léguas (1.452 km). Muitos animais morriam ou eram abandonados por não terem condições de continuar viagem.
  • A municipalidade da capital tinha uma área, a Fazenda Campina de Pirajá, onde o gado era recolhido antes do abate. O local não tinha condições de oferecer pastagem e nem água para todos os animais. Os animais também eram maltratados pelos funcionários. ‘(...) A comissão pelo conhecimento que tem da Fazenda Campina, onde é o gado atualmente recebido, crê que ela está nas piores condições, sendo antes um hospital e cemitério dos animais, do que um depósito regular para receber o gado. Nos dias em que ali se demora, além de não achar pastagem, e de lhe darem água, é ele barbaramente seviciado (...). Bem se está vendo que a carne do gado, que trás uma longa viagem; do gado que não encontra um lugar para descansar, para refazer-se, e que é pelo contrário maltratado á míngua de alimento e água, maltratado com pancadas e feridas, não pode ser de boa qualidade, pois que os líquidos de que deve ser infiltrada, e que lhe comunicam seu verdadeiro sabor, estão profundamente alterados ou decompostos, tornando destarte a carne insalubre, e causando graves perturbações na digestão. (...) Considera também a comissão que uma das causas da pronta danificação da carne consiste na falta de arejamento e asseio dos açougues em que ela é exporta á venda. Num clima, como o nosso, e não tendo essas casas as condições de higiene recomendadas, a carne em poucas horas começa a perder as suas qualidades de salubridade pela decomposição de seus princípios. Acresce á esse mal que a fiscalização feita do modo atual, e por empregados talvez pouco escrupulosos no cumprimento de seus deveres, e a mais nociva á saúde pública. (...).
  • Respondendo sobre a causa do preço elevado da carne verde a comissão entendeu que a responsabilidade era o monopólio exercido por uma empresa de Feira de Santana com tentáculos no próprio matadouro.
  • Para a remediação do problema a comissão sugeriu a nomeação de um funcionário responsável por todas as operações de recebimento de animais, abate e carregamento das carnes. ‘ (...) Que o agente público não consinta que dentro do matadouro se faça comércio ou revendagem de carne devendo, portanto passar esta diretamente do poder do dono ou condutor para os donos dos talhos’ ‘(...) Que possa qualquer pessoa abrir talhos em qualquer parte que não seja em os lugares excetuados, contanto que os ditos talhos fiquem debaixo da autoridade do agente público. Que o criador ou condutor que der o gado mais barato tenha preferência na matança.
  • Que o preço da carne seja anunciado diariamente.

As exportações do ano civil de 1867/1868[10] foram de 48.463 peças de couros salgados e 30.371 arrobas de couros secos e no mesmo período as importações de carnes totalizaram 1.436:718$257, representando 8% do total geral das importações da província.·.

Os preços de animais para abate (bovinos) e de carne verde em Salvador no período de 1845 a 1869 foram os seguintes:

Ano
Preço de uma rês
Preço de 1 lb. De carne
1845
3$201
$97
1846
3$067
$92
1847
3$368
$102
1856
4$480
$135
1857
4$950
$150
1866
3$330
$101
1867
3$870
$111
1868
3$360
$101
1869
3$870
$111
Fontes: Mattoso e Superintendencia do Matadouro Publico, citado por Rodrigo Freitas Neto (2009)


Enquanto monopólio real, o comércio de carne e os tributos resultantes desta atividade eram destinados à Câmara Municipal de Salvador. A Câmara autorizou o estabelecimento de um Registro em Alagoinhas, pois as vias que se situavam ao longo da Estrada das Boiadas, só foram beneficiadas com linhas férreas no final da década de 1870, o transporte dos bois via Alagoinhas, nos trens da Bahia and San Francisco Railway Company Limited, era bem vantajoso. Além do mais, o transporte do gado registrado em Alagoinhas e embarcado nos trens rumo a Salvador, não pagava tarifas extras. Ao mesmo tempo em que a estrada de ferro oferecia vantagens, para os outros criadores e para a Câmara de Salvador, ela também facilitou a entrada de gado sem registro.

Em 29 de novembro de 1867 o Matadouro Público fez publicar uma nota estabelecendo que a partir daquela data, não entrariam mais no estabelecimento bovinos transportados por via férrea a partir de Alagoinhas, se não fossem expressamente solicitados pelo Matadouro. Isso se deveu a reclamações de criadores por concorrência desleal devido ao gado que entrava sem registro para o abate.

Havia um grande desperdício de carne em Salvador. Quando o açougue recebia a carne com osso e a desossava para ser comercializada, tudo tinha que ser vendido no mesmo dia. No final do dia o que sobrava era ofertada gratuitamente a Santa Casa de Misericórdia e aos asilos. Se estas entidades não pudessem receber as sobras eram simplesmente jogadas no mar.
O Regulamento do Matadouro Público de 1866 reiterou essa prática. O desperdício de carne verde certamente era muito frequente em uma época onde não havia técnicas maiores que a salga para a conservação da carne fresca.

O gado pagava um imposto de 3$000 por cabeça de direitos provinciais e mais 1$500 de direitos municipais (em Salvador).

No período 1872/1877[11] a produção anual exportada foi equivalente ao abate de 68.800 cabeças, representando um rebanho de 750.000 cabeças.

A GUERRA DOS CANUDOS
A Guerra de Canudos em 1897 foi outro acontecimento marcante na história da Bahia. Os grandes fazendeiros da região, unindo-se à Igreja, iniciaram um forte grupo de pressão junto à república recém-instaurada, pedindo que fossem tomadas providências contra Antonio Vicente Mendes Maciel (1830-1897), o Conselheiro, um líder espiritual messiânico e seus seguidores. Criaram-se rumores de que Canudos se armava para atacar cidades vizinhas e partir em direção à capital para depor o governo republicano, reinstalando a monarquia. Apesar de não haver nenhuma prova para estes rumores, o Exército foi mandado para Canudos. Três expedições militares contra Canudos saíram derrotadas, inclusive uma comandada pelo Coronel Antônio Moreira César (1850-1897), conhecido como "corta-cabeças" por ter mandado executar mais de cem pessoas a sangue frio na repressão à Revolução Federalista em Santa Catarina. No Rio de Janeiro, a repercussão da derrota foi enorme, principalmente porque se atribuía ao Conselheiro a intenção de restaurar a monarquia. Jornais monarquistas foram empastelados e Gentil José de Castro, gerente de dois deles, assassinado. A resolução do problema passou para a competência do governo federal. A derrota das tropas do Exército nestas primeiras expedições apavorou a opinião pública, que acabou exigindo a destruição do arraial. Além disso, estima-se que cinco mil militares tenham morrido. O ministro da Guerra, marechal Carlos Machado Bittencourt (1840-1897), em abril de 1897, preparou a quarta e última expedição, sob o comando do general Artur Oscar de Andrade Guimarães (1850-1903), composta de duas colunas ambas com mais de quatro mil soldados equipados com as mais modernas armas da época. Fortemente armados, os soldados cercaram por três meses o arraial de Canudos, que sofreu forte bombardeio e depois foi invadido. A guerra terminou com a destruição total de Canudos, a degola de muitos prisioneiros de guerra, e o incêndio de todas as 5.200 casas do arraial de Belo Monte que Antonio Conselheiro tinha fundado e que contava com 25 mil habitantes. O episódio da Guerra de Canudos foi o tema do livro ‘Os Sertões’ de Euclides da Cunha (1866-1909).

NO SÉCULO XX ATÉ A ATUALIDADE

Em 1911[12] as exportações de couros salgados totalizaram 211.045 peças que pesaram 2.922.704 kg. Os principais destinos das mercadorias foram os seguintes:
Hamburgo         119.398  peças 56% do total
Nova York           38.790  peças 18% do total
Nápoles              31.452   peças 15% do total       
Outros                21.405   peças 11% do total

Em 1926 o imigrante suíço Max Wirth instalou a fazenda Paredão no oeste baiano e em 1947 iniciou a seleção de gado Nelore.

A Sertaneja fundada em 1928 por Antônio Balbino de Carvalho e Geraldo Rocha foi também uma pioneira na agropecuária no oeste baiano. Ela formou várias fazendas de cria, recria e engorda de gado Nelore na região e também no noroeste de Minas Gerais. Na década de 1970, além do tradicional Nelore, foram incluídas as criações das raças Guzerá e Pardo-Suíço de Corte. Como também as raças de equinos Appallosa e Quarto de Milha e de ovinos Santa Inês.

Outras empresas que estabeleceram grandes fazendas no oeste baiano foram a Jacaranduba de Fernando Paranhos, a Jacarezinho de Alexandre Grendene Bartelle e a Agropecuária CFM do grupo Vestey.

Atualmente quase 30% do rebanho bovino do estado da Bahia estão localizados no oeste, que é uma área de transição entre o cerrado e o semiárido.

O IBGE no Censo Agropecuário constatou que no dia 31/12/2008 havia no estado da Bahia 11.100.000 cabeças de bovinos, sendo o 9° maior do Brasil. Os cinco maiores rebanhos, que representavam 6% do total estavam nos seguintes municípios:
·        Itamaraju                 157.000 cabeças
·        Guaratinga               144.000 cabeças
·        Itanhém                   143.000 cabeças
·        Itapetinga                143.000 cabeças
·        Vitória da Conquista  142.000 cabeças

Outros 7 municípios tinham rebanhos acima de 100.000 cabeças (Itarantim, Medeiros Neto, Itambé, Ibicuí, Ipirá, Macarani e Wanderley) e 52 tinham rebanho entre 50.000 e 100.000 cabeças. A Bahia possuía 412 municípios.


[1]  No livro 'Formação do Brasil Contemporâneo', São Paulo- Brasiliense- 1996.
[2]   No livro 'Feira de Santana'-Salvador-Itapoã-1968
 [3] Almanak Lamaert 1850
[4]  Relatório anual da Presidência da Província 1854
[5] Relatório Anual da Presidência da Província de 1858.
[6] Relatório Anual da Presidência da Província de 1865.
[7]  Relatório da Presidência da Província de 1866.
[8] Era professor de patologia da Universidade da Bahia e reconhecido nacionalmente pelos seus trabalhos.
[9]  A légua brasileira equivalia a 6,6 km, o mesmo adotado para a légua de Portugal.
[10]  Relatório da Presidência da Província 1875
[11]   Relatório anual da Presidência da Província 1878
[12]  Relatório anual da Presidência da Província 1911

2 comments:

  1. As referencias aos textos estão incorretas, grande parte do que se fala sobre o século XIX, foi ranscrito ipsi literis da minha dissertação, sem contudo que se tenha me dado o crédito. Isso configura plágio e é crime.

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    1. Sr. Anonimo. Sua reclamação não procede. Todo o texto foi resultado de minha pesquisa e as devidos créditos estão mencionados.

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