4.25.2011

VIDA EM LISBOA E AS VIAGENS DE DESCOBERTA

           
 A PESTE E O MEDO

Morria-se fácil na Lisboa quinhentista, seja de fome, seja de peste. No ano da tomada de Ceuta, 1415, a peste ataca Lisboa, fazendo entre suas vítimas a mulher de D. João I, rei de Portugal. Em 1438, 1458, 1464, 1481 e entre 1483 e 1496 Lisboa é novamente tomada pela peste. Durante a epidemia de 1506, a situação é tão crítica que o rei D. Manuel sugere que a capital seja esvaziada por alguns dias.
Nos períodos de mortandade, centenas de mortos são lançados todos os dias em valas comuns cavadas por criminosos, cuja pena era comutada pelo risco do contágio fatal. A expectativa de vida era de 30 anos. Então, para muitos, a aventura em uma nau que singrará o Mar Tenebroso representava a chance rara de melhorar de vida. Além do adiantamento de metade do salário à família do marujo, cada um poderia trazer uma “caixa forra” (livre de impostos) de especiarias.
Mas, para embarcar, era preciso coragem, e das grandes. As estatísticas não deixam dúvidas quanto à temeridade da aventura. Vasco da Gama viajou com 160 homens em 1498; apenas 55 voltaram. A expedição de volta ao mundo comandada por Fernão de Magalhães entre 1519 e 1522 saiu com 260 homens e retornou com apenas 18. Cabral regressou com metade de seus 1200 homens em sete dos 13 barcos. Ou seja: quem ficasse enfrentaria a peste e a fome. Quem partisse teria a fome e o medo pela frente.

ESTAMOS EM ALTO MAR

O piloto, maior autoridade a bordo, era responsável pela definição do rumo, tomada a partir da posição dos astros (aqui ele maneja uma balestilha). Sua opinião sobre a rota a ser tomada prevalecia até sobre a do comandante, que poderia dar queixa do piloto apenas no seu regresso à Corte.
             
Jogar cartas era das poucas distrações dos marujos, desde que longe das vistas dos padres, que consideravam o jogo “coisa do diabo” e lançavam as cartas ao mar. Para entreter os marujos, os jesuítas costumavam dirigir peças com temas religiosos.

Uma porção de biscoito salgado, uma jarra de vinho e outra de água era a refeição básica a bordo. Em alto-mar, o pescado tornava-se raro e a carne salgada embarcada durava poucos dias. Os mais ricos levavam carneiros e galinhas para complementar a dieta.     
Para cada marinheiro embarcado, havia, em média, dois soldados. O objetivo das expedições era comercial, mas as formas de negociação iam da troca de mercadorias ao saque de navios e cidades.

Para as necessidades fisiológicas, havia um balde pendurado no casco do navio. Como papel higiênico, uma corda com a ponta desfiada, usada por todos e lavada pela água do mar.
Com os porões carregados de mantimentos e armas, dormia-se por todos os cantos do convés. Os camarotes eram para o comandante, o piloto, os padres e um ou outro nobre. Adolescentes também embarcavam como grumetes e pajens.

No fim da viagem, o maior problema era a fome. Comia-se qualquer coisa, de pedaços de couro a ratos. Morria-se de sede a bordo, mas ninguém bebia a água do sereno acumulada nas velas. Quem a bebesse teria suas entranhas devoradas por um bichinho chamado gusano, acreditavam os marujos.
             
Os primeiros doentes de escorbuto surgiam após dois meses em alto-mar. Por falta de vitamina C, as gengivas inchavam, os doentes sangravam, muitas vezes até morrer. Em uma viagem às Índias ocorrida em 1565, dos 600 a bordo da nau Moçambique, 580 adoeceram de escorbuto. Em alguns casos, morriam de seis a nove pessoas por dia, que eram lançadas ao mar. 

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