10.15.2011

INQUISIÇÃO NO BRASIL


No final do século XVI, a confissão de um pernambucano perante a Santa Inquisição mostra o rigor da igreja católica da época.

A primeira visitação oficial da Inquisição ao Brasil ocorreu no período de 1591 a 1593, na Bahia, e de 1593 a 1595, em Pernambuco. Entre os fatos considerados delituosos pelo Santo Ofício, os mais comuns eram as práticas sexuais desviantes, o judaísmo e a prática de feitiçaria ou de outros rituais estranhos à religião católica. A seguir, a confissão de um dos processados pela Inquisição, na qual declara ter levado vida "mais de gentio que de cristão".
Confissão de Domingos Fernandes Nobre, de alcunha Tomacauna, mestiço cristão-velho no tempo da graça do Recôncavo no último dia dela (11 de fevereiro de 1592).
Disse ser cristão-velho, natural de Pernambuco, costa deste Brasil, mamaluco, filho de Miguel Fernandes, homem branco, pedreiro, e de Joana, negra do gentio deste Brasil, defuntos, de idade de quarenta e seis anos, casado com Isabel Beliaga, mulher branca, cristã-velha, moradora nesta cidade e não tem ofício.
E confessando suas culpas, disse que da idade de dezoito anos até a idade de trinta e seis anos viveu como homem gentio, não rezando nem se encomendando a Deus, cuidando que não havia de morrer nem tendo conhecimento de Deus, como verdadeiro cristão e posto que se confessava pelas quaresmas era por cumprir com a obrigação, e sua vida no dito tempo foi mais de gentio que de cristão, porém nunca deixou a fé de Cristo e essa teve sempre em seu coração. (...)
O qual riscado costumam fazer os gentios entre si, quando querem mostrar que são valentes, e que tem já morto a homens, e por ele confessante se ver então em um aperto dos gentios que se levantavam contra ele se fez riscar por um negro, do dito modo, para se mostrar valente e assim escapou, porque vendo isso os gentios lhe fugiram e então se riscou então com ele pela dita maneira Francisco Afonso Capara, morador em Pirajoja, termo desta cidade. (...)
E ordenou a dita erronia arremedando e contrafazendo os usos da igreja cristã, fazendo os ditos batismos e fazendo igrejas com altares e pias de água benta e mesas de confrarias, e tocheiros e contas de rezar e sacristia e tinham no altar um ídolo, de uma figura de animal que nem demonstrava ser homem, nem pássaro, nem peixe, nem bicho, mas era como quimera no qual adoravam e a dita negra, chamada mãe de Deus, era mulher do dito chamado Papa ao seu uso gentílico. [...]

Publicado em 'A Fundação do Brasil: Testemunhos, 1500-1700' organização de Darcy Ribeiro & Carlos de Araujo Moreira Neto, Petrópolis, Editora Vozes, 1992, pp.244-5.Editado e adaptado para ser postado por Leopoldo Costa.


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