Os animais nem sempre andam em manadas para aumentar as chances de sobrevivência. Às vezes, o bando forma-se por puro acaso. Alguns seguem estratégias impressionantes.
Os maiores mamíferos terrestres, os elefantes, são nômades. Em busca de folhas e cascas de árvore – um adulto consome 120 quilos por dia, somando café da manhã, almoço, jantar e lanchinhos –, eles chegam a percorrer 12 a 20 quilômetros diariamente. Sempre comendo. “Nas andanças, o grupo confia na experiência da líder, que é sempre a fêmea mais velha”, explicou à SUPER o zoólogo Sérgio Rangel Pinheiro, do Zoológico de Sorocaba, interior de São Paulo. A matriarca impõe a ordem que garante a fartura.
Como você vai ver nesta reportagem, os agrupamentos são decisivos para certos animais. Mas nem todos são disciplinados pela sabedoria socialmente responsável das fêmeas, como os elefantes. As manadas doidas dos gnus correm na base do cada um por si. Os jacarés não têm o menor senso de união. Movem-se atrás dos peixes que comem e pronto. Nem todos os bandos obedecem à mesma lógica. Mas aqueles organizados aumentam as chances de sobrevivência. As abelhas, acredite, sabem até votar.
Salve-se quem puder
Entre os gnus, pai, mãe e cria costumam pastar juntos. Mas a ordem doméstica se desfaz na hora da migração, que reúne mais de 1 milhão de animais em corrida desabalada
Primeiro as damas
As fêmeas dominantes, na frente, já na margem do rio, organiza a manada. À sua volta mantém outras fêmeas e seus filhotes. Os machos agressivos seguem uns 2 quilômetros atrás, em pequenos grupos isolados. É para não atrapalhar a ordem
Falsa armada
Os jacarés se amontoam por acaso. Para pegar peixes que viram presas fáceis ao tentar subir uma corredeira.
Namoro em massa
As morsas são parentas dentuças das focas. Pesam até mais de 600 quilos. Às sua festas de acasalamento, no inverno, comparecem mais de 500 indivíduos. É um superfestival do flerte,
Pernas demais
As estrelas-do-mar quase não andam em busca da comida. Não é por preguiça. Com cinco pernas para mexer e coordenas, a jornada demora. Aí, surge um outro bicho e leva o lanche.
Sem destino
As borboletas-monarcas fogem do frio do Ártico para a América Central. Suas migrações são as maiores conhecidas entre insetos. No México, onde chegam a cobrir uma árvore inteira, o desmatamento pôs a espécie em via de extinção.
Massa ambulante
Na águas geladas do norte do Oceano Pacífico, os salmões formam cardumes com até 3 milhões de indivíduos.
Rede no céu
Os morcego-sem-cauda voam em fileiras densas e executam um arrastão no ar. Os insetos são engolidos em massa, sem distinção de espécie. O que cai na rede é peixe.
Estratégia para caçar, namorar e até votar
À tardinha, os morcegos saem das cavernas onde moram e voam em conjunto para pegar insetos. “Seus movimentos coordenados criam fileiras cerradas de ataque”, explica o zoólogo Erich Fischer, da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul. A esquadrilha é capaz de devorar enxames inteiros de insetos. Também as morsas formam multidões, só que por outro motivo: machos e fêmeas juntam-se só na hora de acasalar. No inverno, fazem superfestivais de paquera.
As abelhas são impressionantes. A Zoologia conhece há quarenta anos seu alto grau de organização. Mas em janeiro passado o etólogo Thomas Seeley, da Universidade de Cornell, nos Estados Unidos, conseguiu filmar o ritual em que elas escolhem o endereço de um novo ninho. Em verdadeiras assembléias, os insetos deliberam usando a dança como meio de expressão. A mudança da colméia é feita de acordo com o interesse coletivo.
Companheiras nos banquetes e nas viagens
Muitos animais se aproximam só por oportunismo. As estrelas-do-mar se amontam onde há fartura de detritos orgânicos. No fim do banquete, se isolam. Algo parecido ocorre com as borboletas-monarcas. Elas não têm laços sociais entre si, mas usam uma mesma rota ao migrar do Ártico para o México. “Não sabemos como se orientam”, contou à SUPER o biólogo André Victor Freitas, da Universidade Estadual de Campinas. “É um mistério.” Seja como for, centenas de milhares de insetos tornam-se companheiros de viagem.
Os salmões também fazem migrações em massa. O cardume sincroniza as nadadeiras e faz todas as curvas em conjunto, como se fosse um único e grande bicho. Isso serve para intimidar os predadores. Não há um líder, como no caso do elefante. O bando, que pode ter 3 milhões de indivíduos, se une por puro instinto.
Casa provisória
Enquanto não escolhem onde fazer uma nova colméia, as abelhas acampam em galhos sem nunca perder a coesão.
Assembléia no ar
Os tipos de dança constituem um meio de expressão para as abelhas escolherem o local de um novo ninho.
A rainha e algumas operárias estudam a região. De volta ao enxame, revelam as direções dos lugares visitados por meio de danças. Os balés aéreos, sempre em forma de oito, traçam um eixo cujo ângulo em relação ao Sol indica os rumos dos novos endereços propostos. As outras abelhas apóiam as propostas aderindo ou não à dança.
Aos poucos, mais e mais abelhas agregam-se a um dos balés apresentados, mostrando que ele agrada à maior parte da colônia. É um ritual de votação. O novo endereço é decidido por consenso. As propostas minoritárias são gradualmente abandonadas e todos os insetos acabam voando da mesma maneira.
O cheiro do berço
Milhares de salmões retornam juntos aos locais em que nasceram lembrando-se dos aromas da infância.
Os peixes saem dos ovos nas nascentes dos rios e, ao deixarem a casca, gravam no cérebro o cheiro da composição química do ambiente diluído na água. Têm memória olfativa. Depois migram e vão crescer no mar.
Na época da reprodução, sempre voltam para o rio de onde saíram. No mar, guiam-se por meios ainda desconhecidos. Mas, ao chegar à costa, os cardumes entram nos rios orientando-se pelo perfume do berço. Nunca falham.
Por Flavia Natércia na revista 'Super Interessante', como 'A Lógica de Rebanho'. Editado e adaptado para ser portado por Leopoldo Costa.
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