11.13.2012

É LEGAL, MORAL E NÃO ENGORDA


Açúcar? Esqueça. Inspirados em livro de Ducasse, chefs criam sobremesas com caldas de frutas, adoçantes caseiros, chá floral...

Guerin

Imagine um livro com 85 sobremesas criadas por Alain Ducasse. Pensou em um mergulho de cabeça no mundo de merengues e açúcares em profusão? Pode esquecer. Em “Natural, simples, saudável e saboroso”, um dos mais aclamados chefs franceses, autor de doces mirabolantes, propõe uma mudança de hábito: a elaboração de doces menos doces, nos quais frutas, caldas naturais e adoçantes como agave substituem o açúcar branco. “Podemos satisfazer nossa gulodice tomando cuidados com a saúde, sem nos privarmos desses prazeres”, sugere Ducasse.

Pois, inspirados no livro, que acaba de ser editado no Brasil pelo Senac, pedimos a quatro mestres da pâtisserie — Dominique Guerin (Guerin Boulangerie), Ariel Lettieri (Le Pré Catelan), Frédéric Monnier (Brasserie Rosário) e Lomanto Oliveira (Quadrifoglio) — que criassem, com exclusividade, sobremesas feitas com ingredientes alternativos, coisas como caldas de frutas, mel, xaropes como o de bordo, árvore cuja seiva produz o que os americanos e ingleses chamam de maple syrup (aquele que usam em panquecas, lembra?).

O franco-argentino Ariel Lettiere, que, no começo do ano, assumiu a pâtisserie do Le Pré Catelan, nos brinda com um doce cuja base é formada por néctar/essência de framboesa (extraído diretamente da fruta, quando ela chega a 60° C) e pedaços de morangos frescos. Em seguida, um pequeno suporte apoia pedaços de genoise (uma massa de farinha, xarope de bordo e ovos) e uma musse de mascarpone, feita com favas de baunilha do Taiti. E pensa que acabou? Ainda rola um granité de maçã assada com mel e Calvados, coroado com folha de prata para decorar.

Frédéric Monnier, da Brasserie Rosário, lançou mão do próprio açúcar das frutas e criou a brunoise aux fruits, sobremesa sob medida para o verão. São pedacinhos de manga e morango, cortados à brunoise, com aroma de hortelã. O chantilly que coroa a sobremesa traz raspas de morango. E, por cima, castanhas de caju que se encarregam deixar a coisa crocante (R$ 11). — Com a fartura de frutas que temos no Brasil, dá para ser mais comedido no uso do açúcar comum. Basta extrair naturalmente o açúcar da jabuticaba, da laranja... — sugere Monnier.— As compotas são uma prova disso!


Lomanto Oliveira, que assina todas as sobremesas do Quadrifoglio do Jardim Botânico, optou por trocar o açúcar branco convencional pelo mel (”sabia que o mel tem poder adoçante maior que o do açúcar?”, ensina Ducasse). A pedido do RioShow, criou um canolli de limão-siciliano servido com um semifredo de mel e pistache (R$ 26), que hoje entra em cartaz na casa.

O francês Dominique Guerin nunca foi chegado a doces muito doces. Acha desagradáveis e enjoativos, além de encobrir os sabores reais. — Uso o mínimo de açúcar branco possível e não me canso de procurar outros recursos para adoçar minhas sobremesas — conta Guerin, à frente da Guerin Boulangerie, sucesso em Copacabana que, a partir de hoje, passa a exibir nas vitrines mais essa versão elaboradíssima de sobremesa. São três camadas ao todo. A primeira traz uma gelatina de flores de hibisco (que leva xarope de agave) com raspas de frutas cítricas (laranja e limão-siciliano) e frutas frescas da época (como manga ou frutas vermelhas, por exemplo). Acima, uma pannacotta de limão (adoçada com mel silvestre) e, no fim, um coulis de framboesa (R$ 9,10), que Guerin prepara a partir de frutas desidratadas. — O poder adoçante do néctar de agave é impressionante. Esse xarope de origem vegetal, que tem poucas calorias e baixo índice glicêmico, substitui o açúcar sem alterar o paladar dos ingredientes. Ah, e tem as flores de hibisco, que aceleram o metabolismo e têm poder antioxidante — exalta o chef pâtissier.

No livro, Ducasse conta que os astecas chamavam o xarope de agave (o mesmo tipo de cacto que os mexicanos usam para fazer a tequila) de “água de mel”. Adoça, de fato, mais do que o mel! E do que o açúcar, obviamente. O único natural que não passa pelo crivo do chef francês é a estévia. Segundo ele, tem cheiro forte de alcaçuz e não pode ser cozida. “Essa deixemos de lado”, sentencia. Com tantas outras opções disponíveis, quem há de descordar.

Texto de Luciana Fróes publicado em "O Globo" de 9 de novembro de 2012 no suplemento "Rio Show". Adaptado e ilustrado (fotos de Leo Martins) para ser postado por Leopoldo Costa.

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