6.05.2017

A MAÇONARIA NO BRASIL NO INÍCIO DO SÉCULO XIX


Os partidos políticos, tal como são hoje, não existiam no Brasil do século XIX. É verdade que duas tendências, com os nomes de partido português e partido brasileiro, atuaram durante o período anterior à Independência, mas não constituíam propriamente partidos políticos; eram, antes, correntes de opinião aglutinadas em torno de jornais e de lideranças mais ou menos carismáticas. Atuando nos bastidores, porém, havia uma sociedade secreta que difundia ideias liberais e desempenhava funções de verdadeira agremiação política: a franco-maçonaria.

A sociedade maçônica

Não se conhecem com precisão as origens históricas da maçonaria; o que se sabeé que, no século XVIII, essa organização proliferava na Europa. Pregando a liberdade de pensamento e o racionalismo, lutando contra as monarquias absolutas, os maçons desempenharam importante papel na Revolução Francesa. Foram eles, por exemplo, que criaram a divisa “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”, e de suas fileiras saiu Napoleão Bonaparte.

Por volta de 1788, jovens filhos das elites que iam estudar na Europa trouxeram para o Brasil os princípios da organização. Intelectuais ligados a sociedades secretas de inspiração maçônica começaram, então, a aparecer em alguns dos movimentos peia emancipação do país — foi assim, por exemplo, na Conspiração dos Suaçunas, em Pernambuco.

Com a vinda da família real para o Brasil, o país abriu-se mais para as influências europeias e a maçonaria ganhou novo impulso. Duramente reprimida após o malogro da Insurreição Pernambucana de 1817, a organização, ao contrário de desaparecer, fortaleceu-se com as discussões sobre o futuro do país.

Na ausência de partidos políticos, eram as lojas maçónicas que canalizavam a inquietação nacional, pois sua posição favorável à Independência atraía todos os que se opunham à Coroa portuguesa. Dessas lojas, a mais importante era o 'Grande Oriente do Brasil', que funcionava no Rio de Janeiro e reunia, entre outros, José Bonifácio, Joaquim Gonçalves Ledo e Januário da Cunha Barbosa.

Cisão no Grande Oriente

Durante a regência de D. Pedro, o Grande Oriente cindiu-se em duas tendências irreconciliáveis. De um lado estava o grupo de José Bonifácio, representando as posições conservadoras do partido brasileiro; do outro lado alinhavam-se os liberais radicais, liderados por Gonçalves Ledo, favoráveis à Independência imediata do país.

Embora ligado aos altos escalões maçônicos, José Bonifácio preferia impor suas ideias a partir de manobras políticas dentro do governo, do qual era ministro. Talvez por isso, sua influência, no interior do Grande Oriente, cedeu terreno para o grupo de Gonçalves Ledo. Atribuíam-se a este inclinações republicanas, que. porém, não o impediram de ver no príncipe um instrumento para concretizar a Independência.

A 30 de março de 1822, dirigiu-se a D. Pedro pelas páginas do "Revérbero",conclamando: "Não desprezes a glória de ser o fundador de um novo Império" Ledo foi ainda o principal articulador da campanha que, em maio de 1822, deu ao príncipe o título de 'Defensor Perpétuo do Brasil'.

O poder do 'Apostolado'

Ao discordar da proposta de convocação de uma Assembleia Constituinte, José Bonifácio entrou em conflito com o Grande Oriente, acabando por se retirar. Fundou então a sociedade secreta da 'Nobre Ordem dos Cavaleiros da Santa Cruz', conhecida como 'Apostolado', e convidou o príncipe regente a integrá-la no posto de arconte-rei. Composto de figuras da elite social, o Apostolado seria classificado de reacionário pelo Grande Oriente: José Bonifácio e seus amigos esmeravam-se na defesa da ordem, pronunciando-se contra a "suja e caótica Democracia”.

Procurando neutralizar a influência do 'Apostolado', o grupo de Gonçalves Ledo tentou atrair o príncipe regente, ao qual conferiu o título honorífico de grão-mestre da maçonaria. Mas José Bonifácio já desfrutava de sólida posição dentro do governo, tanto que, com o advento da Independência, foi ele, e não Gonçalves Ledo, que colheu todas as glórias. Como primeiro-ministro do governo imperial, Bonifácio promoveu uma perseguição implacável aos liberais, que incluiu o fechamento do Grande Oriente. Ledo refugiou-se em Buenos Aires, de onde só retomaria em 1823.

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Os maçons pelo mundo

Para alguns historiadores, a origem da maçonaria remonta ao Egito Antigo. Outros, porém, acreditam que foi durante a Idade Média européia que surgiram as primeiras lojas maçônicas, congregando artesãos, principalmente pedreiros — o termo francês 'maçon' significa exatamente pedreiro, e alguns dos símbolos da maçonaria são o fio de prumo, o esquadro e o compasso, relacionados à técnica da construção civil. Tudo isso parece confirmar a origem medieval da organização. O grande crescimento da maçonaria, no entanto, ocorreu durante o século XVIII, na Europa, quando se tomou porta-voz da luta contra o absolutismo.

Ligados ao pensamento dos intelectuais da 'Ilustração', seus princípios ideológicos foram amplamente aceitos pela burguesia. Vários maçons participaram, nessa época, dos movimentos liberais; principalmente na França, onde alguns enciclopedistas, como Voltaire, Diderot e Helvétius, eram membros da organização.

Perseguida pelas monarquias absolutistas e pela Igreja Católica, a maçonaria desenvolveu-se sob os chamados regimes ilustrados, quando havia mais tolerância. Foi assim em Portugal, durante o governo de D. José I. Com D. Maria I, porém, as perseguições ressurgiram com renovado vigor.

A invasão francesa, em 1807, inaugurou um novo período na história da organização. Lojas maçônicas proliferaram, então, em Portugal, articulando movimentos como o de Gomes Freire, em 1817.

No continente americano, a maçonaria difundiu-se a partir de uma perspectiva de luta contra o colonialismo. Benjamin Franklin nos Estados Unidos, O’ Higgins no Chile, San Martin na Argentina e outros líderes da independência em vários países eram maçons, assim como D. Pedro I, que chegou ao posto de grão-mestre da Ordem.

Texto publicado em "Saga - A Grande História do Brasil", Abril Cultural, São Paulo, 1981, editor Victor Civita, vol.3, Império (1808-1870) p.80-81. Digitalizado, adaptado e ilustrado para ser postado por Leopoldo Costa.

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