3.21.2011

HISTÓRIA DA CRIAÇÃO E GADO NO AMAZONAS

  Leopoldo Costa

O rio Amazonas já era conhecido desde 1500, quando o espanhol Vicente Yañes Pinzon (1462-1514), navegou na sua foz e pensando se tratar de um mar interno deu-lhe nome de Mar Dulce.

Os espanhóis depois da conquista do Peru ficaram sabendo pelos nativos, da existência de uma rica região além dos Andes, que de imediato supuseram se tratar do lendário El Dorado.
Quem primeiro tentou desvendar o que havia além da cordilheira, foi Gonzalo Pizarro (1502-1548), irmão do conquistador do Peru, que partindo de Quito em 1541, numa grande expedição com 150 soldados, quatro mil índios e três mil animais de carga como cavalos, alpacas e lhamas, conseguiu ultrapassar a barreira dos Andes e chegar por terra ao rio Amazonas. Construiu alguns barcos e explorou o rio até a sua foz, aonde chegou em 1542, depois, de percorrer quase 6.000 km.

O nome do rio Amazonas (ou rio das Amazonas) foi dado por Francisco Orellana (1490-1546), que em uma expedição pelo rio, nos anos de 1539/1542, viu um grupo de índias da tribo Icamiabas[1] que rechaçou os invasores com arcos e flechas e relacionando-as com as lendárias guerreiras da mitologia, achou que eram as Amazonas, chamando-o então de rio das Amazonas.

Frei Gaspar de Carvajal (1504-1584), o cronista que acompanhava Orellana escreveu o seguinte sobre estas mulheres:

Eram guerreiras de alto porte, brancas, fortes, seminuas, com cabelos longos, manejando com habilidade arco e flecha e uma maça d’armas, semelhante a um tacape.’
Orellana relatou a descoberta da região ao rei da Espanha, pleiteou e conseguiu ser nomeado 'adelantado' das terras que havia descoberto. Organizou uma nova expedição para explorar a região, mas, morreu em novembro de 1546 no naufrágio de um bergantim no rio Amazonas, nas proximidades da atual cidade de Macapá.

Em 1561, Lopo de Aguirre (1510-1561) outro conquistador espanhol, explorou o rio, depois, de assassinar Pedro de Ursua (1526-1561), o chefe da expedição de que fazia parte.

Em 1612, o rei Jaime I (1566-1625) da Inglaterra para hostilizar a Espanha que dominava Portugal e colônias, concedeu ao explorador Robert Harcourt (1575-1631) uma carta patente dando-lhe o direito de conquistar o território do rio Amazonas.

Em 1639, o capitão-mor Pedro Teixeira (1570-1641), descendo o rio Tocantins, atingiu o Amazonas e seguiu viagem só terminando no rio Napo no Equador, seguindo depois, por terra para Quito.

O Amazonas continuava como terra de ninguém. Para as autoridades portuguesas não bastava apenas ocupar a região, era necessário povoá-la e torná-la economicamente viável. Uma tarefa quase impossível, dado a vastidão e a dificuldade de penetração, onde não eram presente os cursos fluviais navegáveis.
Para o povoamento contribuíram as ordens religiosas dos franciscanos, carmelitas, mercedários e jesuítas, que estabeleceram várias missões para catequizar os índios. Usavam o sistema de aldeamento dos índios que viviam dispersos. Junto com a religião, ensinavam como criar animais e deles obter parte do sustento. Essa atividade dos religiosos estava prevista no ‘Regimento das Missões’ de 1686, que obrigava a conversão dos gentios para a fé católica e a sua inclusão ao domínio político da coroa.

A economia da região além de ter como uma das atividades básicas a coleta de ovos de tartaruga, gravitava em torno da busca das drogas do sertão: cravo, canela, anil, castanha-do-pará, urucum, salsaparrilha, guaraná e cacau, que eram colhidos na floresta e vendidos a ‘mascates’, que os enviavam por via fluvial até o porto de Belém, que embarcava tudo em navios maiores para a Europa. Muitos desbravadores instalaram feitorias na região ribeirinha ao rio Amazonas e de seus principais afluentes, para armazenar os produtos antes do embarque.

Os franceses, que tinham fundado São Luis no golfo do Maranhão em 1612, usavam o forte desta feitoria, como base para explorar o estuário amazônico.
Em 1615, com o Brasil fazendo parte do Reino Unido de Portugal e Espanha, juntaram-se os soldados espanhóis e portugueses e expulsaram os franceses de São Luís.

Depois, em 16 de janeiro de 1616, o capitão-mor Francisco Caldeira Castelo Branco (1566-1619) partindo de São Luis, fundou na região que ele denominou de Lusitânia Feliz, o forte Presépio de Belém (hoje Belém, a capital do Pará), na baia de Guará, sendo um posto de defesa para a entrada do rio Amazonas e um ponto de apoio para a exploração de todo o interior.
Muitas desavenças houve na região, gerada pelo conflito de interesses comerciais de holandeses, ingleses e franceses de um lado e os portugueses de outro.

As fronteiras foram provisoriamente acertadas em 1697 e ratificadas pelo Tratado de Lisboa em 1701. Depois, do Tratado o território amazonense passou a pertencer totalmente da coroa portuguesa.

Em 1640, Portugal restabeleceu a sua autonomia e a Espanha voltou a ser uma concorrente. Com isto os portugueses tiveram que reforçar a segurança da imensa área, instalando fortes as margens do rio Solimões.

Em 1669, Francisco da Mota Falcão  fundou o forte de São José do Rio Negro, para melhor defender a posse do Amazonas. Em torno do forte desenvolveu-se o povoado da Barra que mais tarde tornou-se a vila de Manaus, transformada em capital em 1791.
Esta fase da história foi marcada pela exploração dos coletores e extrativistas em busca pelas drogas do sertão e pelos bandeirantes na preação de índios para escravizar.

Francisco de Melo Palheta (1670-?), em 1722/1723, com a missão oficial de explorar o rio Amazonas, chegou a alcançar Santa Cruz de Cajuava, próximo a Santa Cruz de la Sierra, na Bolívia.

Antes de 1690, os jesuítas espanhóis dirigidos por Samuel Fritz (1673-1725) de nacionalidade checa, estabeleceram missões na área do Solimões. Entre 1691 e 1697, tendo recebido ordens de Lisboa, Inacio Correia de Oliveira, Antonio de Miranda e José Antunes da Fonseca se apossaram das missões, expulsando os jesuítas e preando os índios.

Em 1722, um ato régio de Portugal dividiu o antigo estado do Grão Pará, existente desde 1618, entre o estado do Maranhão e Piauí e o estado do Grão Pará e do Rio Negro. Respondiam diretamente a Lisboa sem nenhum vinculo político-administrativo com o Rio de Janeiro.

Em 1755 foi instituída a capitania de São José do Rio Negro, separada do Pará. Somente em 1808, com a transmigração da corte portuguesa para o Brasil, é que foi restabelecida a integração da região com o restante do Brasil.

Desde 1853, a navegação do rio Amazonas era monopólio de apenas uma empresa pertencente ao barão de Mauá (1813-1889) e até 7 de setembro de 1867 o rio só podia ser navegado por barcos de bandeira brasileira. Por pressão internacional, principalmente dos ingleses, Pedro II (1825-1891) liberou a navegação a todos os países amigos.

Em 1850, o Amazonas foi separado do Grão Pará, sendo elevada a condição de província com duas comarcas (Manaus e Solimões) com capital na cidade de Manaus.
Henry Walter Bates[2] comentando sobre a sua visita a Tefé em 1850 escreveu:
'Embora haja grande quantidade de gado nos arredores da cidade, e o pasto seja abundante o ano todo, só se tem carne verde quando as rezes morrem por acidente. A causa mais comum da morte é o envenenamento por beberem tucupi cru, o suco da raiz da mandioca. (...) Os donos matam um animal que apresente sintomas de ter sido envenenamento e vendem a carne a retalho na cidade. Embora saibam todos não ser saudável (...) avidamente a compram, ao menos os moradores vindos de outras províncias nos quais a carne constitui o principal alimento.'

No ‘Relatório Anual da Província’ para o ano de 1868, está registrado, que além das fazendas públicas de São Marcos e São Bento, existiam empresas privadas que exploravam a criação de gado como em Viúva Brasil (sic) com 2.000 cabeças, Cunhapucu com 2.000 cabeças, Boa Vista com 300 cabeças e Água Boa com 1.500 cabeças. Fora do Rio Branco, só no Madeira há campos gerais próprios para a criação, mas em quase todos os pontos de pode ver campos  artificiais para a criação de gado miúdo.

Em Jaunarari, Purupuru, Codajaz, Alvelos, Tefé, Fonte Boa e São Paulo há gado bovino e ovino de boa qualidade. É pena que não se dediquem a criação em maior escala.
A pecuária no Amazonas, para uma grande parte dos analistas, sobrevive mais a custa de especulação da terra e de subsídios do governo do que por interesse econômico de auferir lucros com a atividade.

Em 1856 a população da província era de 41.000 pessoas, sendo 37.000 na comarca de Manaus e 4.000 na comarca de Solimões. Em 1872 a população total da província era de 50.000 pessoas. O auge do ciclo da borracha aconteceu no período de 1879 a 1912.

A população do Amazonas no final de cada década era a seguinte:

Ano
População
1900
250.000
1910
302.000
1920
363.000
1930
413.000
1940
401.000
1950
514.000
1960
721.000










No período de 1938 a 1964, como mostra o quadro abaixo, o rebanho reduziu-se:



1938
1950
1957
1964
1964/1938
Bovinos
325.000
130.000
128.000
242.000
-26%
Equinos
19.000
-
8.000
19.000
0
Suinos
88.000
95.000
202.000
26.000
-70%
Ovinos
19.000
15.000
19.000
11.000
-42%
Caprinos
12.000
-
17.000
73.000
508%
                    (suspeita-se que as estatísticas de bovinos para 1938 estejam exageradas).

O IBGE no último Censo Agropecuário constatou que no dia 31/12/2008 havia no estado do Amazonas 1.312.000 cabeças de bovinos. Os cinco maiores rebanhos, que representavam 76% do total estavam nos seguintes municípios:
·       Lábrea                         284.000 cabeças
·       Parintins                       141.000 cabeças
·       Apuí                             137.000 cabeças
·       Boca do Acre                84.000 cabeças
·       Autazes                          68.000 cabeças

Escreveram Mariza Alves de Macedo (SIPAM) e Wenceslau Teixeira (Embrapa)[3]:

(...) O estado do Amazonas é um dos estados com menores índices de área desmatada na Amazônia Legal. No entanto, sua porção sul vem se consolidando como nova área de expansão da fronteira agropecuária e concentrando a maior parte das novas frentes de desmatamento no estado. A exploração madeireira é muitas vezes apontada como a frente pioneira, pois ao criar meios para o escoamento da madeira, também estimula a ação de grileiros, e conseqüentemente a apropriação da terra para outros usos. A pecuária daria seqüência ao processo de conversão da área florestal, enquanto o plantio da soja se concentra nas áreas de pastagens, como forma de reduzir os custos de sua implantação. Neste aspecto, o impacto da cultura da soja nem sempre se daria de forma direta, mas sim de forma combinada com o processo de transferência de terras entre diferentes grupos. Neste caso, pecuaristas descapitalizados e pequenos agricultores que se desfazem de suas propriedades e buscam novas oportunidades, sobretudo na fronteira especulativa. Em tais áreas, a posse da terra depende da abertura de novas áreas, e o lucro é, muitas vezes, mais fundamentado na comercialização de terras do que nos retornos produtivos da pecuária. Esse efeito de deslocamento de atividades menos capitalizadas seria mais intenso onde já não há lugar para se expandir, como no Mato Grosso, enquanto o sul do Amazonas seria um dos prováveis locais para onde se dirigiria esta expansão. No município de Humaitá, as apreensões com relação a esse processo se pronunciam sob diferentes aspectos: de um lado, expectativas de uma produção de grãos em larga escala, cujas vantagens derivariam do baixo custo de escoamento da produção pelas hidrovias dos rios Madeira e Amazonas até o porto de Itacoatiara; por outro lado, preocupações quanto à sustentabilidade dos solos predominantes nas áreas de expansão inicial das culturas de grãos. (...)


[1]  A tribo Icamiaba, que na língua tupi significa ‘mulheres sem homem’ ou  ‘mulher sem lei’, habitava o Alto Amazonas e eram mulheres guerreiras.
[2] No livro 'Um Naturalista no Rio Amazonas', Belo Horizonte, Itatiaia, 1979 ‘
[3]  Em ‘Sul do Amazonas, nova fronteira agropecuária? O caso do município de Humaitá’ nos Anais do XIV Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto, Natal, Brasil, 25-30 abril 2009, INPE, p. 5933

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