5.06.2011

DIFERENÇAS ENTRE CARNE DE SOL E CHARQUE

INTRODUÇÃO

No país, carnes salgadas típicas podem ser resumidas em carne-de-sol, charque e seus sucedâneos.
A carne-de-sol é um produto tradicionalmente consumido pela população nordestina, sendo considerado um alimento de grande teor calórico-protéico (Nóbrega e Schneider, 1983) e muito apreciado pelas suas características sensoriais pela maioria dos consumidores, integrando a confecção de prato regional nacionalmente apreciado e difundido: carne-de-sol com feijão verde.
Recentemente, um novo produto salgado surgiu no mercado consumidor. É o jerked beef, cujo processamento se assemelha ao do charque, porém adicionado de nitrito e sempre comercializado embalado a vácuo, e por essa razão ambos serão coletivamente denominados charques, representando um consumo aproximado de 2,0 / 2,5 Kg "per capita" (Shimokomaki et al., 1987).
A carne-de-sol tem sido freqüentemente confundida com charque. Com base nestas considerações, o presente trabalho tem como objetivo apresentar os parâmetros de qualidade destas carnes salgadas tipicamente brasileiras, a fim de esclarecer dúvidas no que tange a diferenças tecnológicas de processamento e na conseqüente composição química.

DIFERENÇAS NA COMPOSIÇÃO QUÍMICA E TECNOLÓGICA

Tradicionalmente, tem-se utilizado carnes da parte dianteira (ponta-de-agulha) do animal para processamento dos charques enquanto que, via de regra, peças de primeira são empregadas na confecção da carne-de-sol.
A nossa experiência tem demonstrado que a composição básica do charque varia de acordo com a idade, sexo e principalmente o tipo da carne. Essa composição torna-se relevante se atentarmos para o fato de que a definição do Ministério da Agricultura é que charque não deve conter mais do que 15% de resíduo mineral fixo e 45% de umidade na sua porção intra- muscular (BRASIL, 1976). Entretanto, o produto é comercializado integralmente, e o consumidor adquire e consome, normalmente, as peças de charque contendo as aparas, aí incluindo tendões e a gordura de cobertura. Conseqüentemente, as variações dessa composição são rotineiras.
Na carne-de-sol, Lira (1998), constatou que a amostra (patinho) apresentou umidade média de 67,88%, que variou de 66,33% a 70,10%. Os resultados obtidos para as cinzas, apresentaram um valor médio de 8,03% em base seca, oscilando entre 6,13% e 9,89%. Estas modificações estão relacionadas com a quantidade de cloreto de sódio utilizada no processo de salga, cujos teores variaram de 4,69% a 8,45%.
Resultados semelhantes para umidade foram observados em estudos anteriormente realizados com carne-de-sol, por Norman et al. (1983), que observaram valores variando entre 65 e 70% e Nóbrega e Schneider (1983), 65,96%.
Silva (1991), encontrou oscilações entre 55,70% a 72,50% para umidade. Quanto aos cloretos, os valores encontrados são superiores aos relatados por Nóbrega e Schneider (1983), 4,90% e Norman et al. (1983), 5 a 6%. Silva (1991) detectou variarções entre 2,90% a 11,90% para cloreto de sódio.
A variação nos teores de umidade e de cloreto de sódio deve-se a quantidade de sal usada na salga e aos processos de salga empregados (salga úmida ou salga seca), lavagem e secagem. Além destes fatores, acrescente-se o tempo de salga, a qual pode ser realizada entre quatro e oito horas (no próprio local de abate) ou entre doze e dezesseis horas pós-morte (Norman et a1.,1983).
Biscontini (1995), encontrou no jerked beef, umidade média de 48,77’%i, oscilando entre 45,94% a 51,23% e as cinzas cujo valor médio foi de 18,43%, oscilaram entre 17,38% a 18,98%.
Pode-se perceber que há uma necessidade de definição de critérios de padrões físico-químicos para a elaboração da carne-de-sol e do jerked beef. Seria conveniente a implantação do sistema conhecido por HACCP (Hazard Analysis and Critical Control Points), empregado no controle de qualidade de alimentos, por ser de baixo custo, bastante viável e adequado para o monitoramento da qualidade destes produtos cárneos salgados (Senigalia et al., 1998).
Os resultados de atividade de água encontrados por Lira (1998) na carne-de-sol (0,92), evidenciam que trata-se de um produto cárneo levemente salgado, parcialmente desidratado e apenas semi-preservado pela salga. A carne-de-sol, ao contrário dos charques, cuja atividade de água está em torno de 0,75 (Shimokomaki et al., 1998), não se enquadra no conceito de Hurdle Technology, uma vez que não se trata de um produto cárneo de umidade intermediária, estável a temperatura ambiente pela ação de um ou mais obstáculos adicionais. A menor quantidade de sal, a maior umidade e a elevada atividade de água fazem com que a carne-de-sol tenha uma vida de prateleira muito curta, quando comparada ao jerked heef. Trata-se, pois de um produto propício a multiplicação de microrganismos (Shimokomaki et al., 1987).

CONCLUSÃO

Pelo exposto, através do estabelecimento de comparações, ficam evidentes as diferenças de composição química e tecnológica entre estes dois produtos cárneos salgados, tipicamente brasileiros.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BISCONTINI, T. M. B. Avaliação bioquímica e estrutural de um produto cárneo de atividade de água intermediária. Jerked beef. São Paulo, 1995. 106p. (Tese de Doutorado. Departamento de Alimentos e Nutrição Experimental. Faculdade de Ciências Farmacêuticas. Universidade de São Paulo).
BRASIL. Ministério da Agricultura. Departamento Nacional de Inspeção de Produtos de Origem Animal. Regulamento de inspeção industrial e sanitária de produtos de origem animal. Rio de Janeiro, 1976.
LIRA, G. M. Avaliação de parâmetros de qualidade da Carne-de-sol. São Paulo, 1998. 82p. (Tese de Doutorado. Depto de Alimentos e Nutrição e Experimental. Faculdade de Ciências Farmacêuticas. Universidade de São Paulo).
NÓBREGA, D. M., SCHNEIDER, I. S. A Carne-de-sol na alimentação. Rev. Nac. Carne, São Paulo, n. 11, p. 2S-29, 1983.
NORMAN, G. A. OLIVEIRA, E. F., LYRA NETO, M. V. C. Carne-de-sol. A necessidade da modernização das práticas de processamento de um produto tradicional. Rev. Nac. Carne, São Paulo, n. 7, p. 24-26, 1983.
SHIMOKOMAKI, M., FRANCO, B. D. G. de M., CARVALHO, Jr., B. C. Charque e produtos afins: Tecnologia e conservação – uma revisão. Bol. Soc. Bras. Ciência Tecnologia Aliment., Campinas, v. 21, n. 1, p. 25-35, 1987.
SILVA, M. C. D. Incidência de Staphylococcus aureus enterotoxigênicos e coliformes fecais em Carne-de-sol comercializada na cidade do Recife–PE. Recife, 1991. 77p. (Tese de Mestrado. Departamento de Nutrição. Centro de Ciências da Saúde. Universidade Federal de Pernambuco).
SENIGALIA, S.W.B,, OLIVEIRA, T. C. R., POPER, I. 0. P., SHIMOKOMAKI, M. Implementação do HACCP no processamento do charque visando Staphylococcus aureus. Rev. Nac. Carne, São Paulo, n. 251, p. 30-36, 199S.
SHIMOKOMAKI, M., FRANCO, B. D. G. M., BISCONTINI, T. M. B., PINTO, M. F., TERRA, N. N., ZORN, T. M. T. Charque meats are hurdle technology meat products. Food Res. Int. 1998.

Autoria de Giselda Macena Lira ( Centro da Saúde – Univ. Federal Alagoas-AL) e Massami Shimokomak (Depto Tecnologia de Alimentos e Medicamentos – Univ. Estadual de Londrina-PR) 
Publicado na ' Revista Higiene Alimentar' como 'Parâmetros de qualidade da carne-de-sol e dos charques'. Editado e adaptado por Leopoldo Costa para ser postado.

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